Ipen na Mídia
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- 07/06/2023 - Pós-doutorado em materiais óxidos para energia no IPENBolsista participará de projeto que busca desenvolver uma rota sustentável para a conversão de metano com uso de tecnologias eletroquímicas avançadas
Bolsista participará de projeto que busca desenvolver uma rota sustentável para a conversão de metano com uso de tecnologias eletroquímicas avançadas
Fonte: Agência FAPESP
Uma Bolsa FAPESP de Pós-Doutorado está disponível pelo projeto "Rota sustentável para a conversão de metano com tecnologias eletroquímicas avançadas”, desenvolvido no Centro de Células a Combustível e Hidrogênio do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). O prazo de inscrição se encerra na sexta-feira (09/06).
Coordenado pelo pesquisador Fabio Coral Fonseca, o projeto está vinculado ao Centro de Inovação em Novas Energias (CINE), um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) apoiado por FAPESP e Shell.
O projeto se concentra nas áreas de eletroquímica de estado sólido e catálise, sendo necessária experiência em cerâmica, nanopartículas, deposição e caracterização de filmes finos, técnicas de síncrotron, cromatografia gasosa e materiais de alta temperatura.
O bolsista terá a oportunidade de fazer contribuições significativas para o avanço da pesquisa em eletroquímica de estado sólido e catálise.
Os candidatos devem enviar currículo e carta de interesse para o e-mail cecco@ipen.br.
Mais informações sobre a vaga em: www.fapesp.br/oportunidades/6057/.
A oportunidade de pós-doutorado está aberta a brasileiros e estrangeiros. O selecionado receberá Bolsa de Pós-Doutorado da FAPESP no valor de R$ 9.047,40 mensais e Reserva Técnica equivalente a 10% do valor anual da bolsa para atender a despesas imprevistas e diretamente relacionadas à atividade de pesquisa.
Caso o bolsista de PD resida em domicílio fora da cidade na qual se localiza a instituição-sede da pesquisa e precise se mudar, poderá ter direito a um auxílio-instalação. Mais informações sobre a Bolsa de Pós-Doutorado da FAPESP estão disponíveis em: www.fapesp.br/bolsas/pd.
Outras vagas de bolsas, em diversas áreas do conhecimento, estão no site FAPESP-Oportunidades, em: www.fapesp.br/oportunidades.
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- 02/06/2023 - Radiofarmácia pública é tema de reunião entre representantes da CNEN e do Ministério da SaúdeFonte: CNEN
O presidente da CNEN Francisco Rondinelli Júnior, o diretor de Pesquisa e Desenvolvimento da CNEN Wilson Parejo Calvo, representantes de unidades técnico-científicas da CNEN e da Diretoria de Radioproteção e Segurança Nuclear se reuniram com o coordenador-geral de Serviços, Informação e Conectividade do Ministério da Saúde, Rodrigo Souza Leite, para discutir sobre a importância da radiofarmácia pública no SUS. Para Rondinelli, há oportunidade de cooperação em diversas áreas, como insumos, regulação, controle, tecnologia, a partir das atividades de produção dos radiofármacos, elementos radioativos essenciais no diagnóstico e tratamento de diversas doenças, nas áreas de oncologia, neurologia, cardiologia, entre outras.
O coordenador-geral afirmou que vê uma possibilidade de parceria de trabalho muito profícua com a autarquia e destacou a importância de um complexo econômico-industrial em saúde 4.0, que se pretende alavancar e que integra muitas áreas. O conceito advindo da indústria 4.0 trata de conectividade, automação e sistemas inteligentes. Afirmou ainda que 80% da população brasileira tem no SUS o único recurso para cuidar da saúde, destacando ainda "a importância do projeto de governo de uma neoindustrialização, com visão de futuro”.
O diretor de P&D da CNEN apresentou os diversos produtos desenvolvidos pelas unidades de pesquisa e frisou o quanto os institutos e centros da CNEN podem contribuir com a saúde pública. Citou estudos clínicos em curso e produtos essenciais para diagnóstico e terapia. Ao mesmo tempo, o uso de tratamentos como radioterapia, braquiterapia, o trabalho em metrologia das radiações, o licenciamento e controle, a radioproteção de trabalhadores, do público e do meio ambiente foram destacados em sua importância em saúde. "Um dos grandes objetivos nossos é que os laboratórios façam parte do complexo industrial de saúde pública e já temos experiências bem-sucedidas, como o Ipen, no Estado de São Paulo”, enfatizou Calvo.
O diretor lembrou que nas quatro unidades produtoras de radiofármacos CNEN há infraestrutura essencial para propiciar produção e atendimento público e há necessidade de investimentos em recursos humanos, com recomposição de pessoal, e materiais, para que seja ampliada a escala de oferta desses insumos essenciais à saúde. O presidente da CNEN pontuou que já houve aporte do Fundo Nacional da Saúde em equipamentos e que com mais investimentos será possível ampliar a oferta para a população usuária da rede SUS.
Acesso aos radiofármacos
O Ipen foi pioneiro na oferta de vários produtos, os institutos têm expertise e desenvolvem pesquisas de grande importância e alcance. Alguns dos produtos são exclusivos, como é o caso do fluoroestradiol (¹⁸F) - ¹⁸FES, nome comercial Radiofes, radiofármaco desenvolvido pelo Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear para detectar câncer de mama.
Alguns dos temas apontados na reunião como de destaque foram a atuação CNEN em medicina nuclear; participação das discussões que possibilitem que os radiofármacos sejam mais disponíveis e acessíveis à sociedade, especialmente para a população mais carente; integração de informações que permitam sistema mais completo de informações para a segurança radiológica de trabalhadores e pacientes; modernização para ampliar o potencial de participação das diversas regiões brasileiras no uso dos radiofármacos. Para isso, o presidente da CNEN frisou a importância do Reator Multipropósito Brasileiro, projeto de arraste que trará autonomia no uso dos radiofármacos, estabilidade no fornecimento, já que o país se tornará autossuficiente com potencial inclusive para exportação de radioisótopos.
Todos os participantes entenderam que aproximação entre todos os agentes da cadeia produtiva e os Ministérios da Ciência e Tecnologia e da Saúde trarão ganhos para quem mais importa: o cidadão, que demanda por cuidados de saúde de qualidade. Nesse sentido, está sendo organizado um workshop pelo Ipen - e que contará com a participação de todas as unidades técnico-científicas - sobre a radiofarmácia pública, sua importância e como as tecnologias podem ser cada vez mais acessíveis. Foi frisada, ainda, pelo gerente do Centro de Radiofarmácia do Ipen, Emerson Bernardes, a desigualdade na oferta e distribuição dos radiofármacos nas diferentes regiões do país e como isso precisa e pode ser aperfeiçoado para o acesso cada vez mais universal.
Souza Leite parabenizou pelo trabalho CNEN, afirmou que o momento é muito desafiador, mas que a reconstrução e a revalorização das instituições implicam na ampliação e fortalecimento do complexo industrial da saúde, e que há potencial também deste setor na geração de emprego. Rondinelli destacou a importância de todas as unidades CNEN na formação de recursos humanos para a saúde e como o RMB, projeto estruturante, trará fornecimento regular dos radiofármacos para o mercado nacional. A instalação a ser construída em Iperó, no interior de São Paulo, em área de dois milhões de metros quadrados, envolve também um acelerador de alta energia, um Laboratório de Fusão e vai alavancar o país em diversas áreas de pesquisa, desenvolvimento e inovação, elevando-o a um outro patamar.
Lilian Bueno - IRD/CNEN
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- 01/06/2023 - CNEN restabelece parceria com o CENA/USPFonte: Site CNEN
No último dia 24 de maio, uma comitiva da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) liderada pelo presidente Francisco Rondinelli, e composta pelo diretor de Pesquisa e Desenvolvimento Wilson Calvo e Pedro Maffia, diretor de Gestão Institucional visitou o Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), localizado na Universidade de São Paulo (USP). A visita teve como objetivo principal discutir o estabelecimento de cooperação entre as instituições, nas áreas acadêmica e de pesquisa em tecnologia nuclear, agricultura e meio ambiente.
Além de visitas a laboratórios, houve breve apresentação do presidente da Comissão, que tratou de temas como a abertura de editais para fomento à pesquisa integrada entre as instituições CENA, CNEN e o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), unidade CNEN em São Paulo.
Na oportunidade CNEN e CENA firmaram o compromisso de desenvolverem parcerias para o fomento do setor nuclear em especial na promoção da excelência acadêmica e na inovação da tecnologia deste setor.
Comitiva da CNEN é recebida no CENA/USP (Foto: Divulgação/CENA/USP)
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- 24/05/2023 - Curso de Química da UEMS/Naviraí desenvolve ações do 1º Ciclo Acadêmico de QuímicaAs ações começaram a ser desenvolvidas em abril de 2023 e tem promovido experiências diferentes aos acadêmicos da graduação
As ações começaram a ser desenvolvidas em abril de 2023 e tem promovido experiências diferentes aos acadêmicos da graduação
Fonte: Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
O curso de licenciatura em Química da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), unidade de Naviraí, deu início em 2023 a uma série de atividades que fazem parte do1º Ciclo Acadêmico de Química. A coordenação do curso e do projeto explica que as atividades do 1º Ciclo Acadêmico de Química substituirão a tradicional semana acadêmica, que concentrava atividades em uma única semana. A ideia é que todos os meses, os alunos da graduação vivenciem uma ação diferente de aula.
O 1º Ciclo Acadêmico de Química prevê palestras presenciais e virtuais, oficinas, apresentações, visitas técnicas, confraternizações entre outras experiências de ensino, pesquisa, cultura e/ou extensão que enriquecem e complementam o conhecimento, além de promover o sentimento de pertencimento e integração à comunidade UEMS.
O projeto ainda espera que com as ações realizadas ao longo de 2023 sejam restaurados vínculos da comunidade acadêmica, que eventualmente, foram perdidos durante o período de afastamento social causado pela pandemia.
Conheça mais sobre o curso de Química da UEMS/Naviraí em www.uems.br/cursos/graduacao/quimica-licenciatura-navirai.
1º Ciclo Acadêmico de Química - ABRIL 2023
Um dia na UEMS
Como parte das ações do 1º Ciclo Acadêmico de Química foi realizada em abril de 2023 a atividade "Um dia na UEMS”, na qual o curso recebeu alunos da Educação de Jovens Adultos (EJA). Os acadêmicos foram responsáveis por apresentar o curso e as atribuições de um profissional de química. Alunos da Escola Municipal Marechal Cândido Rondon foram até a UEMS/Naviraí, visitaram as instalações, acompanharam experimentos e conheceram o curso de Química.
Os acadêmicos conduziram uma série de experimentos no laboratório e explicaram as atividades. A ação foi coordenada pelo prof. Dr. Wagner de Oliveira Valença e executada pelos acadêmicos do 2º. Ano de Química, dentro das atividades da disciplina de Química Geral Experimental.
Recepção e Integração Acadêmicos
Também no mês de abril, os acadêmicos do 3º ano da Graduação organizaram uma confraternização para a recepcionar os calouros do curso e integrá-los à comunidade acadêmica. O evento contou com a participação de alunos e professores do curso de Química. Além de confraternizar, os calouros também foram informados sobre as atividades do curso, projetos, bolsas e ações desenvolvidas pela UEMS.
1º Ciclo Acadêmico de Química - MAIO 2023
Competição de Foguetes de Garrafa PET
Na primeira ação do mês de maio, o 1º Ciclo Acadêmico de Química realizou uma competição com protótipos de foguetes de garrafas PET. A atividade envolveu acadêmicos de todos os anos e foi coordenada pelas professoras Dra. Daniela Cristina Manfroi Rodrigues e Dra. Tarsila Marília de Oliveira. A competição foi realizada em uma área aberta cedida pela Incorporadora São Bento.
A Competição de Foguetes de Garrafa PET foi cadastrada na Mostra Brasileira de Foguetes (MOBFOG). A atividade consta no plano de ensino das disciplinas de Física 1 e Físico Química 1, sendo caracterizada por uma "metodologia ativa de ensino”, transformando os alunos de meros espectadores em solucionadores de problemas reais, aplicando os conceitos teóricos aprendidos em sala.
O evento teve a participação de 13 equipes dos cursos de Química e Engenharia de Alimentos, e contou com a participação da comunidade local que assistiram os lançamentos dos foguetes de garrafa PET e questionaram os acadêmicos sobre curiosidades e os processos envolvidos na atividade. Confira a classificação final:
- 1º. Lugar Equipe Missão Orbital, com o foguete atingindo 200 metros, com os acadêmicos do terceiro ano de Química Paulo, Fernando e Andreir.
- 2º. Lugar Equipe Tekoha, com o foguete atingindo 130 metros, com as acadêmicas do primeiro ano de química Natiely, Angescleia e Meria.
- 3º. Lugar Equipe Icarus, com o foguete atingindo 100 metros, com os acadêmicos do primeiro ano de Química, Luis Henrique, Gabriel Fonseca e Gabriel Soares.
Ao final da competição, os acadêmicos e professores participaram de uma confraternização organizada pelos alunos do 4º. Ano de Química, visando principalmente a integração entre a comunidade (docentes, discentes e técnicos).
1º Ciclo Acadêmico de Química 2023 - MAIO 2023
Visita Técnica ao IPEN
A segunda atividade do mês de maio do 1º Ciclo Acadêmico de Química, foi uma visita técnica ao Instituto de Pesquisas Energéticas (IPEN), localizado na Universidade de São Paulo (USP). A ação foi organizada pela Profa. Dra. Daniela Cristina Manfroi Rodrigues. 27 acadêmicos dos cursos da graduação em Química, Engenharia de Alimentos e da Pós-graduação em Recursos Naturais (PGRN) foram acompanhados pelos professores Ademir do Anjos, Daniela Manfroi Rodrigues e Tarsila Marilia de Oliveira até São Paulo para conhecerem as instalações do Reator Nuclear (IER1) e do Acelerador de Elétrons do IPEN. A atividade foi viabilizada pelo apoio da prefeitura de Naviraí, em especial a Gerência de Educação, que possibilitou o deslocamento até São Paulo.
O reator nuclear do IPEN é amplamente utilizado na produção de radioisótopos para fins médicos, para pesquisas nucleares, para irradiação de vários tipos de amostras com fins científicos, está em operação desde 1959 sendo pioneiro nesta área. Nesta etapa da visita os acadêmicos puderam entrar no prédio do reator, tiveram uma aula sobre fissão nuclear e radiação, adentraram a sala de operações e a piscina do reator com sua coloração azulada. O brilho azulado das águas ao redor do reator nuclear é ocasionada por um fenômeno chamado radiação de Cherenkov. Este fenômeno pode ser observado quando partículas carregadas, como por exemplo elétrons, se movimentam com velocidade muito alta na água.
O acelerador de elétrons do IPEN é um aparato tecnológico utilizado para desenvolvimento de novos produtos, processos, esterilização de alimentos, pesquisas em nanotecnologia, entre outros. Nesta etapa da visita, os acadêmicos foram conduzidos à sala de controle, entraram no recinto no qual estavam os aceleradores de elétrons e na fonte de radiação gama. Os acadêmicos tiveram a oportunidade, bastante impactante, de visitar e acompanhar o funcionamento do acelerador de elétrons instalado em uma carreta, combinado a um laboratório de análise de água, os quais foram projetados para levar esta tecnologia até as plantas industriais para tratamento in loco de efluentes e rejeitos industriais.
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- 19/05/2023 - Educação de Naviraí viabiliza viagem de acadêmicos da UEMS para visita técnica ao IPEN em SPUm grupo formado por acadêmicos do Curso de Licenciatura em Química da UEMS – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, unidade de Naviraí, embarcou na terça-feira (16/05), para uma visita técnica ao IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, instalado no campus da USP – Universidade de São Paulo, na capital paulista.
Um grupo formado por acadêmicos do Curso de Licenciatura em Química da UEMS – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, unidade de Naviraí, embarcou na terça-feira (16/05), para uma visita técnica ao IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, instalado no campus da USP – Universidade de São Paulo, na capital paulista.
Fonte: Site da Prefeitura de Naviraí
Para a viagem os acadêmicos contaram com apoio da Prefeitura de Naviraí, por meio da GEMED – Gerência Municipal de Educação, que viabilizou o transporte de ida e volta até a cidade de São Paulo. A visita técnica é uma oportunidade notória de aperfeiçoamento pessoal e profissional para os acadêmicos da unidade da UEMS em Naviraí e futuros profissionais de nossa cidade.
SOBRE O IPEN
O Pesquisas Energéticas e Nucleares atua em vários setores da atividade nuclear entre elas, nas aplicações das radiações e radioisótopos, em reatores nucleares, em materiais e no ciclo do combustível, em radioproteção e dosimetria, cujos resultados vêm proporcionando avanços significativos no domínio de tecnologias, na produção de materiais e na prestação de serviços de valor econômico e estratégico para o país, possibilitando estender os benefícios da energia nuclear à segmentos maiores de nossa população.
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- 03/05/2023 - IPEN desenvolve projeto para separar isótopos lítio-6 e lítio-7 visando autossuficiência do BrasilPróxima etapa é desenvolver e projetar o ‘scale-up’ de produção do Lítio-7, o projeto a ser desenvolvido poderá dar autonomia às usinas Nucleares de Angra
Próxima etapa é desenvolver e projetar o ‘scale-up’ de produção do Lítio-7, o projeto a ser desenvolvido poderá dar autonomia às usinas Nucleares de Angra
Fonte: Jornal da Ciência
O lítio é um metal valorizado na área nuclear por ser utilizado nos reatores de potência. O IPEN/CNEN, em parceria com a Companhia Brasileira de Lítio (CBL) e a Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (FUNDEP), está desenvolvendo um projeto de separação isotópica do metal, assinado em 2020, no valor de aproximadamente R$2,5 milhões. O objetivo é que o Brasil tenha uma produção independente de lítio-7 (7Li). Caso seja bem-sucedido, o empreendimento pode dar sustentabilidade às usinas nucleares tipo PWR (Pressurized Water Reactor) de Angra I e Angra II, que dependem da importação do isótopo de7Li.
O projeto chamado "Separação Isotópica do Lítio via Troca Iônica” é desenvolvido por uma equipe de pesquisadores do IPEN/CNEN, coordenada por Oscar Vega, do Centro de Química e Meio Ambiente (CEQMA) do Instituto. Trata-se de uma forma pioneira, no Brasil, de separar os isótopos6Li e7Li para que, futuramente, seja produzido o7Li, muito importante para fins nucleares.
Método Inovador
O processo desenvolvido para separar os isótopos de 6Li e7Li tem como princípio a troca iônica. Vega garante que o método de separação isotópica do lítio sendo desenvolvido no IPEN/CNEN é "o caminho mais promissor”. Outra maneira é por meio da amálgama de mercúrio, mas Veja alerta para os "prejuízos terríveis por conta de o mercúrio, elemento de grande toxidade, ser descartado diretamente no meio ambiente”, explica.O pesquisador afirma que há outros meios para purificar o lítio, mas não compensam. Segundo ele, a técnica da troca iônica é o caminho mais inovador e promissor, sendo mais vantajosa na medida em que possibilita a separação isotópica somente com o uso de resinas que "vão retendo predominantemente o6Li e deixando o7Li passar”.Vega ressalta o caráter inovador do projeto, no Brasil, no que diz respeito ao desenvolvimento do produto desejado e da tecnologia utilizada para a separação dos isótopos – "Isso acontece apenas em países como China e Japão”, acrescenta.
O Lítio no Brasil
No Brasil, a principal aplicação do lítio para fins nucleares é nos reatores de fissão nuclear das usinas de Angra I e Angra II. Devido à baixa seção de choque com os nêutrons térmicos, o 7Li tem como função controlar o pH da água do circuito primário dos reatores PWR. O6Li tem maior seção de choque que o7Li, dificultando o fluxo dos nêutrons térmicos. "O 7Li é diretamente utilizado nos reatores de Angra, por esse motivo nós precisamos desse isótopo”, explica Vega.Atualmente, o maior fornecedor de 7Li para o Brasil é a Rússia*. "É necessário o Brasil desenvolver tecnologia nacional e não depender de outros países”, observa Vega. A CBL já realiza exportações de lítio para baterias e planeja, futuramente, iniciar as exportações de 7Li.
Na avaliação do pesquisador, o Brasil tem potencial para se tornar um dos grandes produtores e provedores do metal por ter "uma grande reserva de lítio” – cerca de 8% das reservas mundiais. A produção nacional de lítio provém do minério espodumênio, localizado no Vale de Jequitinhonha, entre Bahia e Minas Gerais.
A falta de lítio é a principal carência das usinas nucleares. O coordenador diz que o projeto desenvolvido tem o potencial de suprir essas necessidades e, consequentemente, estimularia a utilização de fontes de energia nucleares – "que produzem energia limpa” – em detrimento das fontes fósseis.
Mas, para que o Brasil inicie uma produção autônoma de lítio e possa exportar o metal, conforme os objetivos da CBL, ainda é necessário aumentar o enriquecimento do 7Li de 92% para 99%.
As fases do estudo
Dividido em três etapas, o projeto consiste na purificação, separação e produção do isótopo 7. A primeira delas foi destinada a separar o lítio de outras impurezas, tais como sódio (Na), cálcio (Ca) e potássio (K) e foi concluída em 2020, quando os pesquisadores atingiram um índice de purificação de 99,99% a partir do carbonato de lítio.A segunda etapa – estágio atual – visa a separação isotópica entre 6Li e7Li. Os isótopos encontram-se na proporção de 7,5% e 92,5%, respectivamente. O objetivo é conseguir aumentar a quantidade de 7Li de 92,5% para um valor acima de 99%. Os pesquisadores ainda buscam desenvolver todos os parâmetros de separação e otimizar o sistema.
Após serem finalizados os testes de otimização em escala de laboratório, a terceira etapa será a implantação de uma possível unidade de produção de7Li por parte da CBL. Nessa fase, segundo Vega, deverá ser firmado outro convênio entre a CBL e o IPEN para realizar a implantação da unidade de produção do7Li. Será necessário produzir 12 kg de hidróxido de 7Li mono-hidratado com 99% de pureza para suprir as necessidades das usinas de Angra I e II.
Atualmente, o maior fornecedor de7Li para o Brasil é a Rússia. "Especula-se que a Rússia não vai mais vender este produto para o Brasil. Diante desta situação, é necessário o Brasil desenvolver tecnologia nacional e não depender de outros países”, observa Vega. A CBL já realiza exportações de lítio para baterias e planeja, futuramente, iniciar as exportações de7Li.
Separando os isótopos
A separação de isótopos por troca iônica é um dos processos obtidos por cromatografia. A técnica consiste em duas fases: a primeira é chamada de "estacionária”, onde ficam as resinas de troca iônica. A segunda chama-se fase "móvel” e é constituída por uma solução líquida contendo os isótopos de interesse a serem separados.O experimento realizado pelos pesquisadores ocorreu a partir da utilização de três colunas empacotadas com resina de troca iônica em série: C1, C2 e C3. Uma amostra purificada de hidróxido de lítio (LiOH) foi carregada pelo líquido da fase móvel e circulada pelas três colunas.
A separação do lítio explora as diferenças entre os isótopos. Vega explica que "o 6Li tem um raio atômico maior, semelhante a uma bola de futebol americano, e o7Li, um raio menor, semelhante a uma bola normal”. Devido ao seu tamanho, a maior parte do6Li fica retida na resina e o7Li sai no efluente. "É como se eu conseguisse fazer com que as duas competissem uma com a outra e então eu faço com que uma delas caminhe mais rápido, se afaste uma da outra”, resume Vega.
Ao final do processo, nas amostras da coluna C1, a abundância do6Li foi maior que a natural. Na coluna C2, houve um aumento da abundância do7Li. O Resultado foi a separação dos isótopos do6Li e7Li, de modo que a abundância do7Li subiu de maneira significativa.
O projeto foi prorrogado por mais 10 meses e, de acordo com Vega, "Atingimos a separação isotópica, mas não chegamos a 99%. Ainda é preciso fazer vários experimentos nas colunas para otimizar o processo”.
Lítio-6 x lítio-7
Apesar de serem isótopos de um mesmo elemento, o líder do estudo explica que o 6Li e o7Li "se comportam de forma completamente distintas na área nuclear”, devido ao fato de os isótopos serem "nuclearmente diferentes”.Enquanto o 7Li tem uso nos reatores de fissão nuclear, o 6Li é utilizado na fusão nuclear. "Ambos possuem valor nuclear, mas a utilidade depende da finalidade”, diz Vega.
O pesquisador explica que, nas usinas de fissão nuclear, como é o caso de Angra I e Angra II, apenas o 7Li pode ser utilizado para refrigerar os reatores PWR (Pressurized Water Reactor), por serem capazes de controlar o pH da água sem absorver nêutrons, devido à baixa seção de choque do7Li.
"Não posso ter nem 1% de 6Li, porque ele vai começar a roubar nêutrons. A eficiência do aquecimento do reator vai decair”, ressalta Vega.
O mercado de lítio
Para além dos interesses nucleares, o lítio também possui amplo mercado. As principais aplicações são para baterias, cerâmicas e vidrarias, ar condicionado, medicamentos, polímeros, graxas lubrificantes e metalurgia.No mercado mundial, o lítio é vendido por toneladas e também sofre quedas e subidas no preço, assim como uma bolsa de valores. Vega destaca que, nos últimos cinco anos, houve uma valorização de 500% no preço do produto.
Um dos principais motivos do crescente é o aumento da demanda das baterias iônicas de lítio a partir do início do século XXI. De 2000 a 2020, a produção anual de lítio no mundo saltou de aproximadamente 200 mil toneladas por ano para 600 mil toneladas por ano. As baterias representavam cerca de 23% do consumo mundial de lítio até o ano de 2017.
A demanda causada pela aplicação de baterias de íon de lítio (Li-íon) aumentou significativamente o preço do lítio nas últimas décadas. Somente de 2000 a 2012, o preço do lítio foi de 2 mil dólares por tonelada para 6 mil dólares por tonelada.
Segundo estudos, o lítio apresenta uma variedade de propriedades economicamente benéficas e que oferecem diferentes aplicações químicas e técnicas. Dentre essas, o lítio é o metal que apresenta maior potencial eletroquímico.
"O Brasil não pode ser dependente”
Para Vinícius Alvarenga, superintendente da CBL, a tecnologia é estratégica porque trará autossuficiência ao Brasil, que além de dominar o ciclo da fissão nuclear, poderá também ser exportador do isótopo. Atualmente, Rússia e China são os principais fornecedores mundiais desse isótopo para as usinas nucleares de fissão, incluindo Angra I e Angra II."Hoje, deve haver mais de 450 usinas de fissão nuclear no mundo e apenas dois países dominando a tecnologia e o mercado de lítio. Isso dá a medida da importância estratégica e comercial para o Brasil também dominar esse ciclo e oferecer o isótopo 7 de lítio a países aliados. O país não pode continuar dependente”, diz Alvarenga.
É o mercado internacional o "grande vilão” para o Brasil competir em uma futura produção, considerando que o consumo das usinas de Angra, somente, é pequeno, não traria impacto econômico muito relevante, de acordo com Alvarenga. Segundo ele, o impacto econômico em nível mundial é o que faz dessa tecnologia estratégica para o país.
"Inclusive, poderíamos discutir as estratégias com a rede pública, com a União, para o nosso produto ser absorvido no mercado internacional. Aí sim, internacionalmente, teria um impacto mais relevante da tecnologia”, acrescentando que o projeto com o IPEN é algo "bastante distinto da produção da CBL” e, por isso, "muito relevante”.
"Começamos mais timidamente, com apenas uma pesquisadora, na purificação do composto químico de lítio, mas ao vislumbrarmos o avanço, nós intensificamos o investimento há dois anos, montando um laboratório nas instalações do IPEN e participando das despesas em desenvolvimento e tecnologia”, conta Alvarenga.
As expectativas da CBL é, no curto prazo, consolidar a separação isotópica. Já foi alcançado o índice de pureza da ordem de 99.35%, a meta é atingir 99.99%. Depois dessa fase, a produção. "Precisamos produzir uma certa quantidade que dê para iniciarmos testes de aplicação dos isótopos na Eletronuclear ou em outras usinas fora do Brasil. Temos a expectativa que isso se torne uma nova atividade comercial da CBL, no futuro”, concluiu.
Equipe multidisciplinar
O projeto está sendo desenvolvido por meio de cooperação entre áreas do IPEN-CNEN, com equipe liderada pelos Coordenadores Oscar Vega e Marycel Cotrim. Os outros integrantes são os pesquisadores Vanderlei Bergamaschi e João Coutinho Ferreira, do Centro de Célula a Combustível a Hidrogênio (CECCO), os técnicos João Batista de Andrade e Edson Takeshi, do Centro de Engenharia Química (CEQMA), além da pós-doc Juliana Otomo, as químicas Mariana Novais de Andrade, Maíse Pastore Gimenez, Letícia Nascimento e dos alunos de iniciação científica, Henrique Bataglia e Paulo Leão.
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- 27/04/2023 - Superintendente do IPEN, Wilson Calvo, fala sobre aplicações da energia nuclear no Talk Show da Rádio Costa Azul - 93,1FMAs aplicações da energia nuclear nas áreas da saúde e agronegócio, além de aspectos da segurança nuclear foram temas comentados no programa de rádio disponível também no YouTube
As aplicações da energia nuclear nas áreas da saúde e agronegócio, além de aspectos da segurança nuclear foram temas comentados no programa de rádio disponível também no YouTube
Wilson Calvo, superintendente do IPEN, foi entrevistado em 27 de abril de 2023 pelo programa Talk Show da Rádio Costa Azul - 93,1 FM. Os apresentadores Renato Aguiar, Alinne Campos e Manolo Jordão conduziram a conversa que destacou aspectos relevantes da energia nuclear no cotidiano. Aplicações da radiação ionizante na Saúde, na área alimentícia e indústria foram abordadas na entrevista disponível pelo canal do programa no YouTube.
O programa Talk Show vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 8h às 10h.
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- 11/04/2023 - Saiba o que é o hidrogênio verde citado por Lula em discursoProtagonizar a mudança para uma energia mais limpa pode trazer vantagens para a indústria nacional, segundo especialista
Protagonizar a mudança para uma energia mais limpa pode trazer vantagens para a indústria nacional, segundo especialista
Fonte: VejaDurante o discurso na cerimônia de comemoração dos 100 dias de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que, sob sua gestão, o Brasil se tornaria uma potência do hidrogênio verde. O termo se popularizou nos últimos anos para se referir a energias renováveis. Mas qual a relação entre esse elemento químico e a eletricidade?O hidrogênio é considerado um vetor de energia, como uma bateria. Ou seja, quando a eletricidade é gerada ela pode ser usada para produzir hidrogênio e esse elemento pode, posteriormente, ser convertido em energia de novo – de maneira muito eficiente, o que explica sua grande popularidade. Esse processo, no entanto, pode ocorrer de diversas maneiras, e cada uma delas é designada com uma cor.Quando a geração produz também uma grande quantidade de gases poluentes, ela é chamada de marrom ou cinza: é o caso da produção de hidrogênio a partir de gás natural. Por outro lado, quando ocorre sem a geração de subprodutos, ela é chamada de verde, como é o caso da energia proveniente do vento ou da luz do sol. Essa classificação não leva em consideração, contudo, a emissão de gases para a construção das usinas, por exemplo.O Brasil pode gerar grande quantidade de energia eólica e solar, o que torna plausível o papel do país como uma potência do hidrogênio verde. "Existe um potencial de energia eólica no Brasil que é do tamanho de uma Itaipu, só no que a gente chama de eólica offshore [quando as torres ficam em alto mar]”, afirma Fábio Coral Fonseca, pesquisador de novas energias do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).Apesar da tradição brasileira em gerar energia limpa, através da hidrelétricas, essa mudança no padrão energético poderia reposicionar o país no cenário internacional. Com a emergência das crises climáticas, a necessidade de processos industriais mais sustentáveis se torna cada dia mais patente e estar na dianteira dessa adaptação traz vantagens para o país."Nós estamos na beira de uma revolução energética”, diz Fonseca. "Isso vai fazer com que o Brasil deixe mais sustentável uma série de processos industriais, como, por exemplo, o aço. Se a gente usar o hidrogênio verde, a gente pode vender o aço verde, com um valor agregado muito maior.”Segundo ele, o país tem capacidade técnica para implementar essas tecnologias de maneira rápida. O que faltava, até agora, eram recursos e incentivos suficientes. -
- 31/03/2023 - Diretora da ABEN, física nuclear, acha que país falha por abandonar projetos e não estimular o ensino no setor. Conheça Olga MafraFonte: Blog Tania Malheiros
Diretora da Associação Brasileira de Energia Nuclear (ABEN), a física e engenheira nuclear Olga Mafra, tem na bagagem vivências nas mais diversas ações do governo brasileiro. Ela defende a divulgação da energia nuclear, critica a não continuidade de empreendimentos e a falta de estimulo ao ensino no setor. "Um dos problemas que o Brasil sempre enfrentou, inclusive na área nuclear, foi a falta de continuidade”, comenta. E enfatiza: "Mesmo numa área estratégica como a nuclear, onde os projetos são de longo prazo, ao contrário de outros países, a primeira atitude tomada no Brasil é abandonar o objetivo ou, pelo menos, paralisar as atividades resultando em gastos enormes, perda de capacitação, dificuldades com equipamentos já adquiridos ou com contratos assinados no País ou no exterior”. A paulista que foi aluna de personalidades históricas da energia nuclear, como Marcello Damy de Souza Santos, não foi atingida pelo machismo. "Os professores com os quais trabalhei nunca levaram em conta se éramos mulheres, ou homens, mas se estávamos dispostos a aprender e a trabalhar. De maneira que isso não foi relevante na minha vida profissional’, comenta. No mês em homenagem às mulheres, eis a nossa entrevistada:Conte um pouco sobre a sua atuação na direção da Associação Brasileira de Energia Nuclear (ABEN).
Tenho colaborado com a ABEN há várias diretorias. Atualmente coordeno o Projeto Embaixadores Nucleares e a edição da Revista Brasil Nuclear. O desafio da atual Diretoria é fazer com que a Associação evolua e cresça, trazendo mais benefícios para seus sócios individuais e institucionais. A ABEN está procurando ampliar o horizonte em que se insere, para que tanto os profissionais como empresas envolvidos na tecnologia nuclear participem ativamente da associação com seus conhecimentos.
Sobre o seu interesse e como ingressou na área nuclear.
Cursava o terceiro ano de Física no IFUSP quando o IPEN (então IEA – Instituto de Energia Atômica) divulgou um concurso para selecionar bolsistas de iniciação científica. Confesso que até então não sabia o que era Energia Nuclear. No IPEN, como bolsistas, éramos orientados pelos físicos, engenheiros, químicos, médicos, farmacêuticos, biólogos, por exemplo, e ajudávamos aos técnicos. Isso me fez conhecer as atividades do IPEN também de maneira prática e não apenas teórica, o que em minha opinião foi um forte componente na minha formação.
Influências? Como escolheu esta área até então com pouca participação feminina.
Fui bolsista por três anos no IPEN e passei pelas várias áreas de pesquisa, o que me fez perceber o quão amplas e diversificadas eram a Energia Nuclear e suas aplicações. Logo me interessei por pesquisas experimentais com reator e medidas não destrutivas com técnicas nucleares. Tiveram grande influência na minha formação, com certeza, os profs. Marcello Damy de Souza Santos, Silvio Herdade, Fausto Lima, José Goldemberg, Júlio Kieffer e claro o professor Rômulo Ribeiro Pieroni que foi durante anos diretor do IPEN.
E as mulheres?
Na maior parte das áreas técnicas os homens são maioria, mas ainda como bolsista conheci as pesquisadoras: Constanza Pagano, Laura Atalla, Ludmilla Federgrun, Wilma Hell, que já chefiavam setores no IPEN. Nessa época a Dra. Bartyra Arezzo já era uma pesquisadora de grande renome, no Rio de Janeiro. Os professores com os quais trabalhei nunca levaram em conta se éramos mulheres, ou homens, mas se estávamos dispostos a aprender e a trabalhar. De maneira que isso não foi relevante na minha vida profissional.
Como analisa o campo da Energia Nuclear hoje no Brasil?
Um dos problemas que o Brasil sempre enfrentou, inclusive na área nuclear, foi a falta de continuidade. Fui sempre favorável a dar andamento aos projetos que já existem e, aos poucos, ir acrescentando os novos que se fazem necessários, sem perder o objetivo. Mesmo numa área estratégica como a nuclear, onde os projetos são de longo prazo, ao contrário de outros países, a primeira atitude tomada no Brasil é abandonar o objetivo ou, pelo menos, paralisar as atividades resultando em gastos enormes, perda de capacitação, dificuldades com equipamentos já adquiridos ou com contratos assinados no País ou no exterior.
Quais as atividades que considera fundamentais para manter uma chama nuclear?
Acelerar as obras de conclusão da usina Angra 3, tendo em vista o alto investimento já feito, a necessidade de energia de base e o suprimento energético no País. Sem concluir Angra 3 é muito pouco provável que se invista em novas usinas nucleares. Continuar investindo para que o Brasil se torne autossuficiente no ciclo do combustível nuclear, com a conclusão da unidade de enriquecimento de urânio, a construção da unidade de conversão e mantendo a mineração de urânio. Definir o(s) local(is) e construir o repositório nacional de rejeitos de baixa e média atividade cujo projeto está pronto há anos. Iniciar a construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB). Esse projeto é fundamental para a produção de radiofármacos no país, cuja demanda cresce ano a ano. O projeto foi iniciado pelo IPEN/CNEN há mais de 12 anos, contou com a participação da Amazul e da empresa argentina Invap e conseguiu-se chegar ao projeto detalhado.
Poderia citar outros?
A conclusão do Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica (LABGENE), que será utilizado para validar as condições de projeto e ensaiar todas as condições de operação para o protótipo em terra do reator nuclear para propulsão naval. É de grande prioridade, não somente pela construção do submarino nuclear brasileiro, mas por todos os estudos dele decorrentes que servem para outros reatores de pequeno porte. Com base nas diretrizes do Plano Nacional de Energia 2050, há a previsão de instalação de cerca de 8 a 10 GWe de energia nuclear nos próximos 30 anos. Considerando os tempos de construção e custo de usinas nucleares é necessária a sinalização de uma série de usinas com a elaboração de um programa de expansão nuclear, que permita atingir a meta do PNE 2050. E ainda a escolha entre os sítios nucleares (já há anos estudados), quais seriam os mais apropriados para a construção de novas usinas nucleares e realizar os estudos adicionais necessários de modo a permitir o desenvolvimento desse programa de expansão de geração de energia nuclear definido pelo plano 2050.
Como vê o futuro no setor?
A energia nuclear nos anos recentes, mesmo não sendo renovável, vem sendo considerada por várias entidades e países como energia "verde”, devido a sua baixa emissão de CO2, adquirindo cada vez mais importância para a transição energética. A alta disponibilidade do combustível nuclear, seu grande poder energético, o baixo valor de O&M das usinas nucleares, suas reduzidas áreas de construção, a independência de condições climáticas para seu funcionamento e os problemas de dependência energética trazidos com a guerra Rússia e Ucrânia estão levando a energia nuclear a patamares muito maiores de uso e desenvolvimento no mundo do que no passado.
Como inserir o Brasil na questão?
O Brasil tem um sistema elétrico especial pela contribuição extremamente alta de fontes renováveis, graças ao uso intenso de um enorme potencial hidrelétrico. As hidrelétricas são responsáveis por 64% e as "novas renováveis” (eólica, solar, pequenas hidrelétricas e biomassa) por 22%. A termoeletricidade fornece os 14% restantes (incluindo 2% nuclear). Seguindo o que ocorre no resto do mundo, haverá certamente um aumento do uso da energia nuclear, mas que o Brasil não deverá ultrapassar a ordem dos 10% pela própria natureza da nossa matriz energética. Reatores do tipo Geração 3+ e SMRs estão em desenvolvimento na grande maioria dos países e certamente serão adotados aqui.
Os concursos são escassos na área. Quais seriam as alternativas para os novos físicos no Brasil? Na Engenharia Nuclear, como já publicamos, os alunos, uma vez formados, estão buscando oportunidades fora do Brasil...
As atividades nucleares mínimas listadas como prioridades não serão atingidas sem a formação e treinamento de novos profissionais na área nuclear. O andamento de nosso programa nuclear sempre foi extremamente lento. Com isso, muitos profissionais da tecnologia nuclear com formação de nível internacional já se foram, se aposentaram, ou perderam o incentivo mudando-se para outras áreas de conhecimento. A não realização de concursos para contratação de novos profissionais, muitos com mestrado e doutorado em energia nuclear, levou estudantes a procurarem trabalho no exterior ou, devido à excelente formação adquirida na área nuclear, a se dedicarem a outras atividades. Este fato levou a um lapso de conhecimento, pois os mais antigos não tinham a quem repassar seus conhecimentos ao se aposentarem e com isso houve muito conhecimento perdido.
O que fazer?
No Brasil há excelentes cursos de graduação e pós-graduação em Engenharia Nuclear no Rio, São Paulo, Belo Horizonte e Recife, que nada ficam a dever a cursos no exterior. Mas essa atividade deveria se expandir, inclusive dando mais suporte às Universidades. Além disso, grande parte das teses de Mestrado e Doutorado são realizadas nos institutos da CNEN (IEN, IRD, IPEN, CDTN, CRCN/NE) ou em universidades e estas instituições precisam recompor sua rede de pesquisadores que sofreu grande diminuição ao longo dos anos, para poder orientar os novos estudantes em formação.
A História mostra que o setor nuclear, no passado, era praticamente desconhecido da população. Qual a sua opinião sobre a divulgação da área nuclear junto à população? Sugestões?
Há muitos anos vem sendo propostos e realizados programas para divulgar a tecnologia nuclear, procurando levar mais conhecimento sobre suas vantagens a profissionais de outras áreas, estudantes, e ao público em geral. As próprias empresas nucleares e os Centros de Pesquisa, desde sua criação deram muita ênfase à comunicação na região onde estavam inseridos, até mesmo para ter aceitação local e também de modo mais amplo. Todas essas empresas e centros têm há vários anos um setor de comunicação extremamente ativo. Em vários ambientes como ABEN, ABDAN, LAS, SBPC e várias outras Sociedades, grupos e canais da internet, entre outras, o assunto sempre foi considerado de grande prioridade, sendo promovidos, continuamente, programas, cursos, publicações, treinamentos, competições, projetos para estudantes, visitas e pesquisas para se saber a aceitação da energia nuclear atualmente. Isso sem deixar de mencionar o próprio Comitê de Desenvolvimento do Programa Nuclear Brasileiro (CDPNB), que constituiu um de Grupo Técnico para promover o fortalecimento e a integração das atividades de comunicação social, voltadas para o desenvolvimento do setor nuclear brasileiro.
O que mais?
Embora o panorama tenha se modificado há ainda muito por ser feito. Um dos projetos que a ABEN coordena e que está em andamento é a Competição Embaixadores Nucleares. Essa competição a nível nacional procura, através de estudantes de graduação e pós-graduação, apresentar e implementar ideias para divulgar, ensinar, discutir e dar transparência sobre os benefícios, as aplicações e a segurança da Tecnologia Nuclear. As ações ou trabalhos propostos podem ser dos mais variados tipos (ciclo de palestras, workshops, eventos em escolas, curta metragem, edição de livro ou cartilha, vídeos, jogos, etc.) sempre visando informar ao público sobre os benefícios da Tecnologia Nuclear como também responder às dúvidas, anseios e preocupações desse público.
As energias alternativas, como a solar, estão em alta. São consideradas mais saudáveis ao meio ambiente. Pode ser o começo do fim da energia nuclear?
Um modelo energético que não dependa de combustíveis fósseis (gás, diesel) torna-se cada vez mais importante havendo duas opções disponíveis: nuclear e renovável. As energias renováveis como Solar, Eólica, Hidroelétrica e Biomassa já são parte do mix da matriz energética brasileira que, devido a isso, é extremamente limpa. Pode-se dizer que a transição energética já está em andamento há anos. A energia nuclear representa apenas 2,2% da matriz elétrica e, mesmo considerando-se o PDE para 2050, não atingirá mais do que 10%, pois dispomos de várias fontes de energia e devemos equilibrar seu uso. As energias renováveis solar e eólica têm sua capacidade de geração limitada, pois exigem grandes quantidades de espaço e materiais e dependem das condições climáticas para alimentar a rede. Sua duração é em torno de 20 anos e no seu descomissionamento materiais que são utilizados podem causar danos ao homem e ao meio ambiente.
E a nuclear?
A energia nuclear é altamente eficiente, ocupa pequenas áreas, independe de condições climáticas, com a extensão de vida as usinas chegam a mais de 60 anos de uso e seu combustível queimado ocupa pequeno volume e é armazenado de forma contida. O tempo de construção e o investimento inicial são as dificuldades que enfrenta. Desse modo as opções nucleares e renováveis no Brasil são complementares e não competitivas.
Sugestões para o Governo Lula?
Sendo a segurança energética uma questão estratégica para o País, a ABEN já tem apresentado suas sugestões em vários fóruns, incluindo suas publicações. Como já mencionei, pelas diretrizes do PNE 2050, há a previsão de instalação de cerca de 8 a 10 GWe de energia nuclear nos próximos 30 anos e, levando em conta que para construir rápido e a menor custo é necessária a sinalização de uma série de usinas, sugere-se a elaboração de um programa de expansão nuclear, que permita atingir a meta proposta e cujos marcos temporais sirvam de referência e orientação para as empresas envolvidas. Particularmente no PDE 2032 estão a finalização de Angra 3 e a definição dos sítios nucleares onde futuras usinas serão instaladas.
Nada fácil.
Para tanto é preciso aumentar a capacitação nuclear, visando não só ao projeto e construção de novas usinas, mas também a capacitação para realizar o licenciamento e a fiscalização da série de usinas nucleares a ser definida pelo programa. Investir para que o Brasil se torne autossuficiente na produção do combustível nuclear, com a conclusão da unidade de enriquecimento de urânio e a construção da unidade de conversão. Construir o repositório nacional de rejeitos de baixa e média atividade, garantir o aporte de recursos necessários à construção do Reator Multipropósito Brasileiro. Também a formação de pessoal e sua contratação pelas Empresas e Instituições, de forma a repor as enormes perdas dos últimos anos e restabelecer as verbas para pesquisa e laboratórios das instituições nucleares.
Conte um pouco a sua história: onde nasceu, seus pais são da área da ciência?
Nasci em São Paulo, capital, e meus pais não eram da área da ciência. Fui fortemente influenciada pelos professores que tive no curso cientifico como a professora Renate Watanabe, o professor Shigueo Watanabe e a professora Sueko Yassuda, que procuravam nos mostrar o quanto a ciência era interessante e importante e abrir nossos horizontes.
Machismo?
Nunca senti o problema do machismo, mas nunca procurei obter nada por ser mulher, mas sim, pelo esforço, pelo estudo, pela dedicação, competindo lealmente com os homens em pé de igualdade.
Mensagem para as mulheres?
Aliás, essa é a mensagem que deixaria para as mulheres da área nuclear: devemos nos esforçar para vencer dificuldades, desafios, preconceitos, porém isto não significa que devemos obter uma vaga de trabalho, uma promoção, uma chefia, um título acadêmico por sermos mulheres, mas por sermos tão capacitadas, dedicadas, focadas e inteligentes quanto o sexo oposto. Some-se a isso o fato de termos que compatibilizar as tarefas de ser mãe e profissional ao mesmo tempo. Ninguém disse que seria fácil!
PERFIL
OLGA YAJGUNOVITCH MAFRA GUIDICINI – Formada em Física Nuclear pelo Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), cursou Engenharia Nuclear no IPEN/SP, com mestrado e doutorado em técnicas e medidas nucleares pela Escola Politécnica da USP, assistente doutora concursada do Instituto de Física da USP, pesquisadora, professora e orientadora de teses no IPEN, participou das análises e salvaguardas de informação durante o programa nuclear Brasil-Alemanha e do programa autônimo da CNEN, coordenadora das emergências nucleares e radioativas da área de segurança nuclear da CNEN, oficial de operações e de apoio técnico da Agência Brasileiro-Argentina de Controle e Contabilidade de Materiais Nucleares (ABACC) durante 14 anos, sócia de Carlos Feu na ECEN Consultoria, que publica a Revista Economia e Energia.
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- 31/03/2023 - Jornalista do IPEN começou a carreira no Esporte, até chegar à cobertura da Ciência e Tecnologia. Conheça Ana Paula ArtaxoFonte: Blog Tania Malheiros
Natural de Manaus (AM), a jornalista Ana Paula Freire Artaxo Netto, 52 anos, assessora de imprensa do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), em São Paulo, conta com muito bom humor a sua trajetória profissional iniciada em editorias de Esporte. Se na área da ciência ela não conheceu preconceito, foi no Esporte, no passado, predominantemente reinado por homens, que ela precisou se impor e até cobriu copa do mundo. No IPEN, já com mestrado e doutorado, Ana Paula, casada com o reconhecido professor Paulo Artaxo, da USP, mãe de Sofia, de seis anos, Ana Paula acredita nas mudanças positivas da comunicação. "Vejo o momento atual muito oportuno para um avanço na comunicação em nossa área. Temos a retomada do Programa Nuclear Brasileiro, temos o projeto Reator Multipropósito Brasileiro, que vai gerar uma enormidade de benefícios científicos, acadêmicos e sociais, temos uma Rede de Comunicação do Setor Nuclear”, por exemplo. Para Ana Paula, a divulgação da ciência nuclear pode ser um grande "filão” da comunicação na área. "O Brasil tem pesquisas de excelência, mas o foco é sempre maior em serviços ou na geração de energia, sem que se privilegie o quanto de ciência está presente nesses dois campos. O desafio é enorme, mas eu sou otimista, viu?”, comentou a jornalista, em entrevista ao Blog, no mês em homenagem às mulheres.Como começou a sua participação na área nuclear?
Foi muito em função de uma necessidade pessoal. Eu vim para São Paulo, cursar o doutorado na Unicamp, casei e constituí família aqui, e então solicitei minha redistribuição ao MCTI. Comecei no IPEN em março de 2014. Deparei-me com um mundo totalmente novo, de certa forma, assustador, já que eu vim de um instituto cujo foco é biologia tropical – o INPA, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, em Manaus.
Onde trabalhava? Jornal ou assessoria?
Estou atuando profissionalmente desde 1994. Ingressei no serviço público, da carreira de C&T, em 1999. Nesse intervalo de cinco anos, trabalhei em redação de jornal e TV. O curioso é que eu comecei na editoria de esportes, cobri Fórmula 1, Copa América de Atletismo, fui editora na Copa do Mundo dos Estados Unidos, em 1994, acompanhei a preparação da seleção brasileira de atletismo para os Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996... esse era o meu mundo, no jornalismo. Final de 1998, prestei o concurso para o MCTI/INPA e passei em primeiro lugar, era apenas uma vaga. Mesmo alimentando o sonho de cursar mestrado e doutorado, eu já era editora e fiquei super em dúvida se deveria mesmo sair de redação e trabalhar no serviço público, afinal, os salários eram díspares. Decidi assumir a vaga no INPA, tomei posse no último dia, basicamente levando em conta a carreira acadêmica que poderia e gostaria de seguir, a estabilidade do serviço público e, principalmente, o fato de o INPA ser um lugar incrível para trabalhar, sob vários aspectos. O campus é espetacular, cheio de verde. Imagina você, na sua sala, e, de repente, passa uma preguiça, um mutum ou um sauim-de-coleira pela sua porta? (rs) Foi difícil deixar a redação, assim como foi MUITO difícil "desapegar” do INPA. Ainda hoje faço parte de grupos de amigos que fiz por lá.
O que acha que foi decisivo para cobrir/trabalhar na área nuclear? Conhecia, gostava?
Como disse, eu vim para o IPEN por uma necessidade pessoal. Meu marido é professor da USP, e então era a opção mais viável entre as unidades do MCTI em São Paulo. Como tudo em minha vida, dei muita sorte, fui super bem recebida, acolhida mesma, e já no ano seguinte ao meu ingresso fui indicada pelo ex-diretor de Pesquisa, Desenvolvimento e Ensino, Marcelo Linardi, ao prêmio "Servidora Destaque” daquele ano de 2014. Conhecia muito pouco do IPEN, especificamente. Conhecia a CNEN, pois participávamos (unidades do MCTI) da exposição de ciência e tecnologia promovida pela SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, evento paralelo às reuniões anuais. Era uma área sobre a qual eu sempre tive certa curiosidade, mas não esperava cair nela. Eu até brincava, quando morava no Rio e passava em frente à CNEN, na General Severiano, que iria um dia trabalhar ali. Mas porque eu AMO o Rio e sempre quis morar no Rio, e a CNEN era meu caminho para a UniRio e para a ECO-UFRJ, onde ministrei disciplina e estudei como aluna especial do mestrado, respectivamente. Ou seja, não era que eu quisesse trabalhar na CNEN, pelo menos conscientemente, eu queria morar no Rio (rs). Mas a palavra tem poder, e eu acabei trabalhando na CNEN, em São Paulo (rsrsrs).
Naquela época, sem as ferramentas digitais, quais os maiores desafios?
Tudo era muito novo, nessa questão digital, mas, sim, já havia a força da internet, embora não tivéssemos tantas ferramentas como hoje em dia. Essa "transição”, entre aspas, facilitou approach com a imprensa "nacional”, conseguimos emplacar várias pautas do INPA nos grandes jornais e na televisão, com destaque para a campanha "Dê o nome para o peixe-boi do INPA”, amplamente divulgada pelo suplemento Folhinha, da Folha de S. Paulo. A ideia era mobilizar crianças do Brasil inteiro para escolher o nome do primeiro filhote macho de peixe-boi da Amazônia nascido em cativeiro, no Laboratório de Mamífero Aquático do INPA. Foi um sucesso, a vencedora era de Roraima e ganhou viagem ao INPA e eletrônicos em alta, na época, como videocassete e outros. Isso só foi possível porque a internet encurtou caminhos, diminuiu as fronteiras. Também conseguimos um Globo Repórter sobre a expedição multidisciplinar do INPA para avaliar os impactos da seca de 2005. Esse Globo Repórter foi um marco para o Instituto, conseguimos remotamente planejar tudo com a equipe de pesquisadores, a produção da Globo, os nossos barcos de pesquisa, as estações experimentais... tudo. Foi um sucesso. Enfim, avalio como positiva a chegada de novas ferramentas. Não peguei a era totalmente "analógica” (rs), não saberia dizer sobre os desafios. Suponho que não eram poucos.
Sofreu algum preconceito ou vivenciou ação machista por ser mulher?
Por incrível que pareça, sofri mais preconceito cobrindo "esportes de homem”, futebol, principalmente, do que no serviço público. Nas coletivas, os homens me olhavam com desconfiança e desdém, mas eu soube me impor, inclusive, com menos de um ano de redação, tornei-me editora e comandei uma equipe composta por mais homens do que mulheres, no início. Depois, formei minha própria equipe e contratei apenas mulheres.
Quais as maiores dificuldades? E desafios em termos de relacionamento, de divulgar bem a informação?
No IPEN o caminho foi mais fácil. O fato de eu já ter entrado "doutora” fez com que pesquisadores me olhassem de forma diferente. Não que titulação signifique competência, não mesmo. Mas, pensa só: em uma instituição de pesquisa, fogueira de vaidades por default, se você tem "capital simbólico”, isso abre portas. No INPA, eu não tinha sequer especialização, fui construindo relação de confiança com os cientistas dia a dia, tijolo por tijolo, a fim de mostrar que jornalista não é sempre mal-intencionado ou incapaz de entender a linguagem – hermética – da ciência, como pensa grande parte da comunidade científica. Claro que no IPEN também houve essa construção, mas ela foi encurtada, digamos, pelo fato de eu ter titulação. Pode não parecer, mas isso "pega” em uma instituição de ensino e pesquisa, ninguém te olha de cima pra baixo, não há "vertigem da sobreloja”. E ainda tem o agravante de eu ser uma pessoa de personalidade muito forte, que não se deixa engolir ou abater facilmente, de não levar desaforo etc.. Não sou fácil, não.
Desafios e dificuldades?
Falei que não sou fácil, e não sou mesmo; mas, a bem da verdade, a questão que mais "pega”, para mim, é a qualidade do trabalho. Eu sou MUITO exigente – "chata” mesmo, dizem amigos que trabalharam comigo, mas tem o outro lado: adoro ensinar e aprender, nunca quis me firmar sobre quem estava começando (vi muito isso em redação), sempre fui muito colaborativa, principalmente com meus alunos e estagiários... só não pise no meu calo (rsrs). Mas, no IPEN, eu tive que aprender tudo do zero, não conhecia a área nuclear para além do senso comum. Logo que ingressei, me inscrevi no curso que os cientistas oferecem a alunos do ensino médio, a fim de atraí-los para a carreira na área. É o básico do básico, mas eu precisava, e fui lá, para ser "alfabetizada”. Hoje eu diria que aprendi a ler, mas ainda preciso melhor muito!
Além do IPEN, conte um pouco sobre outras experiências?
Lá atrás, além do INPA e de redações de jornal e TV, ministrei aula em faculdades de jornalismo e no curso de Memória Social, na UniRio, como colaboradora, durante o mestrado na UFF (Universidade Federal Fluminense). Também como mestranda lecionei a disciplina Assessoria de Imprensa na própria UFF. Fui chefe da Divulgação Científica do INPA, depois da própria Ascom, coordenei o Departamento de Difusão do Conhecimento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), fui contemplada com bolsas de Divulgação Científica do CNPq em 2007 e 2018... enfim, fiz muita coisa mesmo! Até comentarista esportiva de rádio eu fui, acredita? Mas se você me perguntar o que mais gosto de fazer, eu diria é que ministrar aulas em cursos de jornalismo. Adoro essa meninada jovem, cheia de gás, ideias e ideais! Eu me renovava em sala de aula, não apenas nas teorias, mas como pessoa mesmo. Infelizmente, com tanto trabalho e filha pequena, não consigo mais.
Conte um pouco sobre as conquistas, os desafios e as dificuldades.
Penso que as conquistas devem ser diárias, ou seja, temos que dar o melhor de nós o tempo todo, e os frutos virão. Na carreira, cito algumas situações que considero exitosas: a aprovação, em primeiro lugar, no concurso para o INPA/MCTI, para a única vaga em Analista em C&T - Jornalismo; a indicação para "Servidora Destaque” do IPEN após meu primeiro ano na casa; a aprovação, em primeiro lugar, para a única bolsa na categoria Jornalismo do Programa de Divulgação e Disseminação Científica (PDDC/CNPq); a avaliação que a Banca Examinadora fez da minha tese – imagine um jornalista da envergadura do prof. Carlos Eduardo Lins da Silva dizer que um dado capítulo da tese foi o melhor que ele leu sobre o assunto, ao longo da vida!! Isso não tem preço!!! Aliás, ele me honra ao citar a minha tese sempre que o assunto é jornalismo, meio ambiente e mudanças climáticas. Do ponto de vista pessoal, a minha maior conquista é a Sofia, minha filha de 6 anos. Foi "um parto” ser mãe. E é também um grande desafio diário. Dificuldades? Lidar com o perfeccionismo exacerbado, autocobrança – eu sempre cobrei muito de mim. Voltando no tempo, enfrentar uma editoria de esportes composta de homens e cobrir esportes "de homens” foi difícil, no começo da carreira; também me descontentou a razão pela qual eu não fui a escolhida como "Servidora Destaque” no meu primeiro ano no IPEN, na avaliação final: eu era "nova” na casa, servidores mais antigos poderiam ficar "melindrados”. Uai, o critério não era ter se destacado na função? – pensei, na época. Mas, hoje, pensando bem, até acho que faz sentido (rsrs).
Hoje é bem mais fácil porque há comunicação digital ou não?
Mais fácil em alguns aspectos, mais difícil em outros. Do ponto de vista da velocidade, da fluidez da informação, ok, a comunicação digital ajuda muito. Todavia, se paramos para pensar que qualquer pessoa, hoje em dia, de posse de um smartphone, pode gerar conteúdo de interesse público sem o devido compromisso com a veracidade e a completude da informação, aí passa a ser um problema. No jornalismo, por exemplo, grandes reportagens estão perdendo espaço para notícias em drops, e eu acho que uma modalidade não anula a outra, dá para fazer as duas, em meios e plataformas distintas, para públicos diversos... e sem falar na questão das mentiras que circulam como notícias (não gosto do termo fake news). Enfim, qualquer tecnologia tem vantagens e desvantagens, o desafio está na discriminação desses dois aspectos e no uso inteligente do que é vantajoso.
Como analisa o futuro da comunicação na área nuclear no Brasil?
Vejo o momento atual muito oportuno para um avanço na comunicação em nossa área. Temos a retomada do Programa Nuclear Brasileiro, temos o projeto Reator Multipropósito Brasileiro, que vai gerar uma enormidade de benefícios científicos, acadêmicos e sociais, temos uma Rede de Comunicação do Setor Nuclear já constituída e trabalhando com todos os atores do setor para a consecução de um Plano de Comunicação, no âmbito do GSI/PR – eu, pelo IPEN, e Cássia Helena, pela CNEN, somos membros permanentes. Enfim, temos uma série de iniciativas que trazem boas perspectivas. Mas de nada adiantará se não houver uma política de Estado bem delineada que conceba a comunicação como essencial e estratégica. Sem isso, não vamos avançar. Comunicar bem tem custo, e é preciso estar disposto a investir na área. E tem outro aspecto, que sempre enfatizo nas minhas apresentações: a divulgação da ciência nuclear pode ser um grande "filão” da comunicação na área. O Brasil tem pesquisas de excelência, mas o foco é sempre maior em serviços ou na geração de energia, sem que se privilegie o quanto de ciência está presente nesses dois campos. O desafio é enorme, mas eu sou otimista, viu?
No mais?
Tenho 52 anos, sou manauara, flamenguista, fã do futebol argentino, de Maradona e de Messi (nessa ordem). Adoro ler, leio mais de um livro por vez, aliás, uma curiosidade inusitada: escolho livro depois de ler a última página. Se eu gostar do desfecho (e do estilo), compro o livro. Parece contrassenso, mas, para uma jornalista, até que faz sentido, pensando em uma releitura da pirâmide invertida. Sou casada com o prof. Paulo Artaxo, da USP, grande parceiro na jornada com a nossa filha. Adoramos viajar pelo mundo, recentemente levamos Sofia a Jerusalém, e foi emocionante a nossa conexão. Se tem algo que traz luz e cor à minha vida é a Sofia. Seis anos, seis meses e 20 dias do dia em que conheci o maior amor do mundo.
PERFIL
Formada em Comunicação Social (Jornalismo) pela Universidade Federal do Amazonas (1994), mestrado em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense (2004) e doutorado em Linguística pela Universidade Estadual de Capinas (2013). É Analista em C&T Sênior no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN/MCTI). Tem especialização em Jornalismo Científico pelo Labjor-UNICAMP. Foi bolsista do Programa de Comunicação Científica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), onde desenvolveu pesquisas na área e coordenou o Departamento de Difusão do Conhecimento (DECON). Coordenou projeto de divulgação científica aprovado em edital do CNPq-PPG-7 e foi bolsista do Programa de Divulgação e Disseminação Científica (PDDC) do CNPq, nível 1.
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- 28/03/2023 - Alguns Aspectos do Programa Nuclear BrasileiroArtigo de Jose A. Perrotta, Francisco Rondinelli Jr e Ivan Salati
Artigo de Jose A. Perrotta, Francisco Rondinelli Jr e Ivan Salati
Fonte: Site do Instituto de Engenharia
O Brasil iniciou seu caminho na área da tecnologia nuclear em 1946, quando o então Capitão-de-Mar-e-Guerra e professor catedrático da Escola Naval, Álvaro Alberto da Motta e Silva, foi designado para chefiar a delegação brasileira na recém-criada Comissão de Energia Atômica das Nações Unidas (UNAEC), onde tiveram início as discussões mundiais tendo como tema a geopolítica nuclear. Álvaro Alberto presidiu o órgão no biênio 1946-1947 tendo percebido a importância do domínio da tecnologia nuclear para o Brasil, visto até então como um simples fornecedor em potencial de minério radioativo para os Estados Unidos.
Em 1948, ao regressar ao Brasil, já Almirante, assumiu a coordenação da comissão encarregada pelo Presidente Dutra de elaborar o anteprojeto para o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq). No período de 1949 a 1951 foi presidente da Academia Brasileira de Ciências, e na criação do CNPq por Getúlio Vargas em 1951, foi nomeado seu presidente, dando sempre grande importância ao tema da energia nuclear. Em 1956 foi instituída a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Durante esse período, foi criado o Instituto de Pesquisas Radioativas – IPR na UFMG em Belo Horizonte (1952), atual Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear – CDTN; o Instituto de Energia Atômica – IEA na USP em São Paulo (1957), atual Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares – IPEN; e, mais adiante, o Instituto de Engenharia Nuclear – IEN, no Rio de Janeiro, no campus da UFRJ (1962). Tudo isso concomitante com o movimento mundial do lançamento do Programa Átomos para a Paz (1953 – EUA) e à criação da Agência Internacional de Energia Atômica (1957-ONU). Um pouco mais tarde (1971) foi criado o Instituto de Radioproteção e Dosimetria – IRD, também no Rio de Janeiro, e o Centro Regional de Ciências Nucleares – CRCN-NE, em Recife (1996).
Em 1957, o IEA inaugurou o seu primeiro reator nuclear de pesquisa, primeiro do Brasil e primeiro do hemisfério sul, o IEA-R1, sob a coordenação do Prof. Marcelo Damy de Souza Santos. Um reator de pesquisa tipo piscina de 2 MW, bastante avançado para a época. Em 1960, teve início a operação do reator nuclear de pesquisa IPR-1, tipo TRIGA de 100 KW, no IPR em Belo Horizonte, e, em 1965, a do reator ARGONAUTA, de 500 W, no IEN, no Rio de Janeiro, a partir de um projeto desenvolvido e cedido pelo Laboratório de Argonne (USA) e montado por engenheiros brasileiros e utilizando equipamentos e componentes nacionais.
Esses reatores deram início aos centros de pesquisa de tecnologia nuclear do país, dedicados ao desenvolvimento das competências nacionais nas diversas aplicações multidisciplinares, além do desenvolvimento dos recursos humanos especializados necessários.
Os reatores de pesquisa dos institutos da CNEN encontram-se em operação até hoje, tendo passado por diversos processos de modernização, contribuindo para o desenvolvimento das atividades de P,D&I conduzidas por esses institutos da CNEN em temas de extrema relevância para o País, com resultados reconhecidos mundialmente e publicados em renomadas revistas internacionais.
As aplicações nucleares cobrem diversos segmentos, como o de energia, o de indústria, o de saúde, o ambiental, o de agricultura, o de preservação de bens culturais, entre outros.
Dentre essas aplicações destaca-se o uso de radioisótopos para produção de radiofármacos, utilizados na medicina nuclear para exames de diagnóstico em oncologia, cardiologia, neurologia etc., e para diversos tratamentos de câncer. O IPEN foi o pioneiro na produção de I-131 na América Latina (1960) e em sua aplicação no diagnóstico e tratamento de câncer de tireoide. Ao longo desses 62 anos de atuação nessa área, o IPEN construiu um importante Centro de Radiofarmácia, onde não apenas produz radiofármacos, mas também desenvolve pesquisa e cria inovação para o setor. É o principal fornecedor de radiofármacos do país. Hoje são realizados da ordem de 2 milhões de procedimentos por ano com os diversos radiofármacos fornecidos pelo IPEN, atendendo a mais de 450 clínicas de medicina nuclear, instaladas em todo o território nacional; Cabe ressaltar, também, que a CNEN, foi visionária ao trazer para o Brasil a tecnologia dos aceleradores cíclotrons utilizados para a produção de radiofármacos de meia vida curta, essenciais para os exames de radiodiagnósticos por intermédio dos tomógrafos PET/CT. A partir de 1974, foram construídos no IEN, no IPEN e posteriormente no CDTN e no CRCN os primeiros cíclotrons de energia variável do País, voltados para pesquisas e produção de radioisótopos de meia-vida curta, de larga aplicação na área médica. A CNEN também foi a grande divulgadora e incentivadora dessas aplicações, com apoio da Agência Internacional de Energia Atômica, trazendo os principais especialistas mundiais na área para dar cursos no Sudeste e no Nordeste. Graças a isso foi difundida a técnica do PET/CT, fundamental no diagnóstico e acompanhamento do tratamento do câncer.
Além das aplicações sociais da energia nuclear é importante ressaltar também sua utilização para a geração de energia elétrica por meio de reatores nucleares de potência. Apesar das fontes renováveis aumentarem cada vez mais sua contribuição para a geração elétrica em âmbito mundial, a energia nuclear ainda tem papel predominante como energia de base e que não contribui para o efeito estufa, atendendo a cerca de 10% da matriz elétrica mundial.
Os reatores de potência demandam a disponibilidade de uma cadeia produtiva para sua operação. São volumes significativos de combustível nuclear (urânio), grande quantidade e diversidade de equipamentos de grandes dimensões e, engenharia multidisciplinar de grande porte (civil mecânica, elétrica, instrumentação etc.).
Essa indústria nuclear prosperou em países onde se investiu massivamente na construção de centrais nucleares e da correspondente infraestrutura necessária para sua utilização, sendo atualmente os principais, os EUA (com 92 reatores de potência), a França (56), a China (54), a Rússia (37), a Coreia do Sul (24), o Canadá (19) e o Reino Unido (11).
No Brasil, no final da década de 60, por não haver uma indústria formada, optou-se pela compra por "turnkey” de uma central nuclear (Angra I), por meio de uma empresa estabelecida mundialmente à época (Westinghouse). Já na década de 70, pensando-se num maior número de centrais nucleares no Brasil, o governo da época optou por um acordo nuclear (Brasil-Alemanha) para uma transferência progressiva da tecnologia e parque industrial nuclear para um programa inicial de oito centrais nucleares. Esse investimento teve início com a formação de recursos humanos (Pronuclear) e com a NUCLEBRÁS, que mais tarde deu origem à atual Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB), à Nuclebrás Equipamentos Pesados S. A. (NUCLEP), e à ELETRONUCLEAR. Das oito usinas planejadas, uma está em operação (Angra II), e outra em construção (Angra III).
O Brasil, no final da década de 70, demonstrou o desejo de desenvolver e ter capacidade autônoma da tecnologia nuclear, contemplando a propulsão nuclear para submarinos. Essa propulsão é realizada por um reator nuclear de potência como se fosse uma pequena central nuclear embarcada. Foi criado então o PATN, Programa Autônomo de Tecnologia Nuclear. A coordenação principal ficou a cargo da CNEN. A Marinha do Brasil, principal interessada, coordenou as ações para obtenção da propulsão nuclear naval. Foram os institutos de tecnologia nuclear da CNEN, principalmente o IPEN, que formaram a base técnica para esse desenvolvimento autônomo. Essa autonomia não é empresarial, mas sim de caráter tecnológico, estratégico e a nível piloto. O sucesso desse programa foi alcançado com o desenvolvimento nacional de todas as etapas da tecnologia do ciclo do combustível nuclear, entre elas o enriquecimento de urânio por ultracentrifugação, o processo de fabricação de combustíveis nucleares, bem como o projeto e construção de protótipos experimentais de sistemas do reator de propulsão naval (atual LABGENE). Também foi construído o primeiro reator de pesquisa totalmente brasileiro, o reator IPEN/MB-01, instalado no IPEN em 1988, para testes de física do núcleo de reatores.
Hoje, as centrífugas desenvolvidas no projeto da Marinha do Brasil pelo Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo – CTMSP são utilizadas pela INB (Indústrias Nucleares do Brasil) para produzir os combustíveis das centrais nucleares de Angra dos Reis. O enriquecimento de urânio até o teor de 20% em U-235 é realizado no Laboratório de Enriquecimento Isotópico (LEI) de ARAMAR, sendo uma das poucas instalações mundiais com essa característica, produzindo UF6enriquecido para reatores de potência de pequeno porte (navais), para reatores de pesquisa, e para a futura geração de reatores pesquisados mundialmente (SMR – Small Modular Reactors). Isso é de extrema relevância em qualquer programa nuclear em âmbito mundial, e o Brasil tem essa tecnologia desenvolvida e instalada no País, autonomamente.
Em 2007, o Ministério da Ciência e Tecnologia (atual MCTI), lançou o PACTI – 2007-2010 – Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação (PACTI) para o Desenvolvimento Nacional. Este Plano contemplava o Programa Nuclear Brasileiro (PNB), sendo a principal fonte de financiamento do PACTI os recursos oriundos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Os seguintes pontos do setor nuclear estavam realçados no PACTI: consolidação do arcabouço legal da área nuclear; ampliação do ciclo do combustível nuclear na INB; consolidação da planta piloto de produção de UF6(conversão) no CTMSP em ARAMAR; capacitação e adequação da NUCLEP para fabricação de componentes das novas usinas nucleares; implementação de uma política brasileira de gerenciamento de rejeitos radioativos; projeto e instalação de um reator nuclear de pesquisa multipropósito, e realização de ações de P&D&I voltadas para a capacitação nacional
Em 2008, a CNEN iniciou o projeto do empreendimento Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), estabelecido como meta do PACTI/MCT 2007-2010, e alinhado às políticas estratégicas referentes ao Programa Nuclear Brasileiro (PNB). O Empreendimento RMB foi concebido para disponibilizar ao país um reator nuclear de pesquisa multipropósito e toda uma infraestrutura de laboratórios e instalações para atender às necessidades relativas à produção crescente de radioisótopos para aplicação médica, além de propiciar o suporte ao desenvolvimento tecnológico nuclear autônomo nas áreas de energia elétrica e de propulsão naval. O RMB será um importante ator no desenvolvimento científico e tecnológico nacional contribuindo fortemente para a inovação e para a formação de recursos humanos especializados para o setor. Os laboratórios do RMB terão caráter de laboratórios nacionais, disponíveis para a comunidade científica do País, e particularmente, em relação à pesquisa básica e científica em materiais, deverá ser um laboratório complementar ao Laboratório Nacional de Luz Sincrotron de Campinas, uma vez que permitirá, com técnicas e equipamentos utilizando feixes de nêutrons, complementar estudos realizados com a luz sincrotron.
O RMB está sendo instalado em uma área de mais de 2 milhões de metros quadrados no município de Iperó (SP), área essa disponibilizada pela Marinha acrescida de 0,84 milhões de m2desapropriados pelo Governo do Estado de São Paulo), o que possibilitará também que o RMB se torne um grande centro de pesquisa tecnológica, a exemplo do ocorrido com os outros reatores e centros de pesquisas nucleares nacionais. Sua instalação em terreno vizinho ao Centro Experimental ARAMAR da Marinha do Brasil, transformará a região no maior polo de desenvolvimento de tecnologia nuclear do país. Pelas suas características, o RMB é um projeto estruturante e de arraste tecnológico para o setor nuclear e de importância fundamental para viabilizar políticas públicas para o setor. ( Website do RMB – clique na figura do RMB do site da CNEN - https://www.gov.br/cnen/pt-br)
No que se refere aos demais projetos e atividades executados no âmbito dos institutos de pesquisa da CNEN, podemos destacar o projeto do Centro de Tecnologia Nuclear e Ambiental (CENTENA), que abrigará o repositório nacional para rejeitos radioativos de baixo e médio níveis de atividade e que vem sendo desenvolvido pelos pesquisadores do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear, o CDTN, localizado em Belo Horizonte.
Também no que se refere às aplicações ambientais são muitas as realizações da CNEN junto ao setor industrial, podendo destacar-se a utilização de radiotraçadores para o monitoramento do deslocamento e deposição de efluentes, assim como para estudos da dinâmica de lençóis de águas subterrâneas, visando sua utilização de forma sustentável.
Outra atividade muito importante desenvolvida atualmente na área ambiental diz respeito ao monitoramento das águas costeiras da região da América Latina, visando o rastreamento da presença de microplásticos, que vem se agravando tanto na costa do Atlântico quanto na do Pacífico. Nesta aplicação são colhidas amostras ambientais na zona costeira de diversos países e feita a avaliação da contaminação por intermédio de técnicas isotópicas, o que possibilita dimensionar a quantidade, a composição, a fonte geradora e a deposição dessas substâncias para, a partir dessas informações, subsidiar as decisões governamentais quanto às ações mitigadoras necessárias.
Na área da agricultura, as mesmas técnicas envolvendo radiotraçadores são aplicadas para avaliar a dinâmica de distribuição e absorção de nutrientes em diversos tipos de cultivo, além da utilização da técnica de indução mutagênica para acelerar o processo de desenvolvimento de espécies resistentes às novas situações climáticas e o combate a pragas endêmicas.
Também na área industrial são inúmeras as aplicações da energia nuclear, destacando-se os processos de tratamento de materiais por irradiação, como é o caso da retificação da borracha sintética utilizada na fabricação de pneus, além da esterilização de produtos cirúrgicos e de condimentos utilizados na indústria alimentícia.
Todas essas aplicações são fruto das atividades de P,D&I conduzidas pela CNEN, por intermédio de seus institutos de pesquisa, com resultados diretamente entregues ao setor produtivo.
Enfim, são muitas as aplicações sociais da energia nuclear e o Brasil possui experiência, instalações, profissionais e instituições habilitadas a atuar em todas elas, com os institutos vinculados à CNEN detendo o conhecimento tecnológico necessário para que o País possa não só acompanhar, mas também participar do processo de desenvolvimento e ampliação desse conhecimento, garantindo as condições para que a população brasileira tenha acesso aos avanços tecnológicos e aos benefícios que são proporcionados com o uso da tecnologia nuclear.
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- 24/03/2023 - O presidente Lula deve investir no ciclo do combustível, recomenda a física paulista que comanda o projeto Jovem CientistaFonte: Blog Tania Malheiros
A física paulista Cibele Bugno Zamboni é um raro exemplo feminino que, na infância, teve o estímulo dos avós para chegar onde desejava, desde que foi atraída pelos encantamentos do Universo. Membro de entidades nacionais e internacionais, Coordenadora do Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações (LEE) do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-SP), Cibele comanda o programa Jovem Cientista e defende a transparência das informações no setor nuclear. "Desde que iniciei na área nuclear senti a necessidade de passar esclarecimentos à sociedade. É a única situação em que a condição de gênero não pesou na minha carreira, pois sempre me perguntaram quando eu iria construir uma bomba e não se seria capaz de fazê-lo”. Quanto ao governo Lula, ela acha que deve investir no ciclo do combustível, lembrado que o principal fornecedor de urânio no mundo é o Cazaquistão. Mas bomba à parte, aqui Cibele fala sobre a falta de recursos no setor nuclear, conta sobre projetos que utilizam abelhas na saúde, entre outros. Neste mês de março, em homenagem às mulheres, Cibele lembra que, no curso preparatório para o vestibular, numa turma de 100 alunos, somente cinco eram do sexo feminino. Com um curriculum profissional extenso na área das ciências exatas, ela não parou por aí: foi aprender piano, violão, flauta, dança, pintura, desenho e muito mais. E manda um recado às mulheres: "Apesar das dificuldades que, em parte, vem do preconceito, se enxergar o potencial de seu trabalho, insista em realizá-lo”. Eis a entrevista:Por que se interessou pela área da Física e da Tecnologia Nuclear? Teve influências? Quais? Como escolheu esta área até então com pouca participação feminina?
Diria que começou por ser muito curiosa e ter a oportunidade, na minha infância, de interagir com meus avôs: o paterno que me deu livros de ciências para ler, principalmente sobre astronomia (sempre fui encantada por entender sobre o universo) assim que fui alfabetizada; o materno, um homem que na década de 40 incentivou as filhas (o que inclui minha mãe) a terem carreira profissional. Com essa bagagem e apoio, visualizei que minha carreira profissional seria na área da Física Nuclear. Quanto a ser restrita à participação feminina nesta área, na verdade nem pensei nisso na época, mas ficou claro ao ingressar "no curso preparatório para vestibular” que seria minoria, pois na sala de aula éramos da ordem de 100 alunos, mas lembro de somente cinco alunas.
Com a sua grande experiência, acha que o setor da Física, Tecnologia Nuclear, tem ou terá mais espaço no Brasil?
Acredito que sim, pois temos potencial na formação de recursos humanos. Entretanto, falta visibilidade do setor tecnológico nuclear bem como a capacidade de absorver esses profissionais no mercado nacional. Essa falta de oportunidade leva esses cérebros a atuarem em âmbito Internacional. Com o quadro político atual, que tem demonstrado interesse na retomada do setor nuclear, abre-se um leque de oportunidades de crescimento, mas a continuidade dessas iniciativas requer, com urgência, um plano de reposição de profissionais (ampliação do mercado trabalho) para solidificar todos os benefícios que o setor nuclear pode fornecer a sociedade.
Como vê o futuro no setor?
Depois de um período de estagnação, projetos de relevância no setor nuclear, como o programa PROSUB, o Reator Multipropósito (RMB), Angra 3, o Projeto Nacional de Fusão Nuclear (PNFN), bem como a continuidade de formação de recursos com apoio de bolsas de pós-graduação, poderão ser dinamizados pois, neste governo temos representes que conhecem e valorizam o setor, como Ricardo Galvão na presidência do CNPq e a ministra de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos.
Os concursos são escassos na área. Quais seriam as alternativas para os novos físicos no Brasil? Na Engenharia Nuclear, como já publicamos, os alunos, uma vez formados, estão buscando oportunidades fora do Brasil.
Sem a oportunidade de atuar no mercado de trabalho continuaremos a oferecer profissionais bem qualificados (que levam anos de formação e tem custo elevado) a outros países. Isso é uma contradição, pois todas as instituições do setor nuclear sofrem com falta de pessoal, devido à ausência de concursos nos últimos anos. Portanto, só com a recomposição de pessoal qualificado nas instituições de pesquisa e das empresas da área nuclear (como CNEN, INB, Eletronuclear, Amazul, dentre outras) teremos a expansão no desenvolvimento de tecnologias nucleares nacional.
Desde 2019 o programa jovem cientista está sobre a sua coordenação. Conte um pouco sobre esta experiência, desafios, dificuldades e expectativas no novo governo.
Desde que iniciei na área nuclear senti a necessidade de passar esclarecimentos à sociedade. É a única situação em que a condição de gênero não pesou na minha carreira, pois sempre me perguntaram quando eu iria construir uma bomba e não se seria capaz de fazê-lo. A divulgação científica sempre foi estimulada no IPEN e faz parte das atividades desenvolvidas pelo Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações (LEER), que coordeno. É uma atividade voluntária que teve início em 2005 e conta com a participação dos alunos. Considerando a visibilidade que as redes sociais proporcionam, em 2019 foi criado o projeto Jovem Cientista (JC) e hoje estamos atuando em várias redes sociais com um bom retorno do público.
Conte um pouco sobre o projeto.
O projeto JC foi criado com o objetivo de elaborar propostas alternativas para conhecimento e divulgação da ciência, com ênfase em desmistificar as ciências nucleares, tanto no âmbito acadêmico (com foco nos estudantes de graduação e pós-graduação) bem como para o público em geral. Dentro deste contexto, foi criado o site jovem cientista (www.jovemcientista.com.br) que auxilia na divulgação do material didático disponibilizado pelo LEER, além de ser um facilitador na comunicação com a sociedade. O conteúdo do site envolve quatro menus: REPORTAGENS onde temas diversos são apresentados em maior profundidade, além abrir espaço para pesquisadores experientes falarem de sua carreira, desafios e perspectivas no campo de atuação; ENTREVISTAS realizadas por alunos com alunos, onde o estudante tem espaço para discutir seu trabalho; MINUTO NUCLEAR onde conceitos de física nuclear são abordados em vídeos de um minuto e CURIOSIDADES um espaço onde são apresentados temas variados, cujo objetivo é dialogar entre as várias áreas do conhecimento científico. Além do site, todo material produzido é disponibilizado em várias mídias sociais, como o canal do YouTube (Jovem Cientista), o perfil no Instagram (@jovemcientista.com.br) associado a uma página no Facebook (@jovemcientista.com.br), o perfil no TikTok (@jovemcientista.com.br) e ainda pelo LinkedIn e Twiter no perfil pessoal dos editores.
Alguma dificuldade?
Sim. Uma das dificuldades é conseguir que os colegas se expressem sem tanto rigor técnico-científico de modo que um público leigo consiga assimilar. Quando isso é alcançado é muito gratificante para equipe do JC, bem como para os colaboradores e convidados. Mas, a maior dificuldade, sem dúvida, é a obtenção de recursos financeiros. Hoje todos os gastos (registro e hospedagem do site) e investimentos (aquisição de programas de edição, recursos audiovisuais e cursos de comunicação) são oriundos dos participantes do LEER (meu e dos alunos) e de doações de parceiros e colaboradores que nos apoiam nessa iniciativa. Com o aceno da continuidade e retomada de projetos no setor nuclear, nossa expectativa é que possamos captar recursos e crescer, bem como atuar como agente propagador, isto é, incentivar outros grupos de pesquisas a divulgar seus projetos.
A História mostra que o setor nuclear, no passado, era praticamente desconhecido da população. Qual a sua opinião sobre a divulgação da área nuclear junto à população? Sugestões?
A informação é fundamental. Tanto os benefícios como os riscos precisam ser esclarecidos, como ocorre com outras áreas. A energia nuclear é estigmatizada pelo seu uso bélico, mas pouco se ensina no meio acadêmico sobre os benefícios e avanços, tanto no âmbito de segurança como de novas tecnologias que podem beneficiar diversas áreas, como saúde, meio ambiente, marinho e aeroespacial, além de disponibilizar metodologias que permitem até cuidar do patrimônio artístico e cultural. De modo geral essas atividades são desconhecidas pela sociedade. Por isso, considero que os esforços dos órgãos de fomento, como a FAPESP e o CNPq, em solicitar ao pesquisador que comunique à sociedade sua pesquisa em linguagem acessível é uma ação positiva, e deveria ser adotada por toda comunidade cientifica. A implantação do Projeto Jovem Cientista e a criação do MINUTO NUCLEAR visam contribuir com a eliminação dessa lacuna. São ações pequenas, mas se forem propagadas pela comunidade científica podem reverter este estigma de danoso e prejudicial. Tem uma citação que sempre faço nos seminários que realizo de divulgação cientifica, que expressa bem o meu objetivo no que diz respeito a área nuclear, que é a seguinte: Energia nuclear, não tenha receio, tenha conhecimento.
Conte um pouco sobre o projeto insumos oriundos da abelha nativa. Como começou, onde, quando, idealizador ou idealizadores, é nacional? Conquistas práticas e para a ciência?
O Brasil é um dos maiores fornecedores de produtos apícolas no mundo. Dentre as abelhas sem ferrão, a espécie Scaptotrigona aff.postica, popularmente conhecida como "tubi”, oriunda do Estado do Maranhão, tem seus insumos (própolis e a pólen) utilizados localmente como antimicrobiano em infecções, na cicatrização de feridas e em ação antiviral (herpes e rubéola) bem como no âmbito nutricional. Entretanto, não existem dados da caracterização físico-química e biológica desses insumos que possibilitem comprovar essas propriedades medicinais e nutricionais. Para suprir essas lacunas, uma parceria entre o LEER e o Laboratório de Radiometria Ambiental (LRA/IPEN), com o Instituto Butantan (IBu) e a Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), foi criada com o objetivo de fornecer bases substanciais e práticas desses insumos. Isso abre a possibilidade de explorar novos medicamentos, que poderão levar a geração de patentes, além de conhecimentos sobre a flora e fauna, que contribuirão para expansão da Meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão) que é a principal fonte recursos da região. O projeto teve início em 2022 e tem o apoio financeiro do IPEN.
Conte sobre a sua participação na área de Aplicações de Radioisótopos?
Minha atuação é na área da saúde pública voltada a proposição de metodologias alternativas de análises clínicas. Nos últimos anos o LEER (IPEN) tem se dedicado a apresentar alternativas para realização de exames bioquímicos (dosagem de íons) em fluidos corpóreos, a custo reduzido e com potencial de uso em áreas carentes que não dispõem de infraestrutura de laboratórios de análises clínicas. De acordo com o último Programa Nacional de Controle de Qualidade (ProEx/2023), 5.924 laboratórios de Análises Clínicas e 116 bancos de sangue atenderam uma demanda de 74 milhões desses exames (dosagem de Ca, Cl, Fe, K, Mg, Na, etc). Entretanto, existe carência desses recursos laboratoriais em populações locadas em regiões de difícil acesso e, normalmente, carentes. Por exemplo, o caso da região Amazônica onde o transporte ocorre em parte por barco, o que pode chegar a dias, inviabilizando sua realização. Nossa proposta teve como objetivo testar o uso de equipamento compacto e portátil, baseado na tecnologia de Fluorescência de Raios X, para execução de análises bioquímicas em micro amostras de fluidos corpóreos (gotas) depositadas em papel. Os resultados obtidos mostraram-se promissores e atualmente a metodologia é empregada em diferentes áreas da saúde (medicina preventiva e de diagnóstico, medicina pediátrica, medicina esportiva, veterinária, genética, nutrição, dentre outras).
Que riqueza de possibilidades.
São várias as vantagens: procedimento não destrutivo, o que permite a repetição da análise sempre que necessário (o que não é possível pelos procedimentos convencionais), sendo de grande utilidade na medicina esportiva pois, pode auxiliar na identificação de doping; execução rápida (minutos); armazenamento da amostra sem a necessidade de refrigeração; viabilidade de realizar várias análises simultaneamente (inviável pelos procedimentos convencionais), bem como a possibilidade de seu emprego em análise de vários fluidos corpóreos (sangue, soro, plasma, urina, saliva). No caso de uso de sangue outras simplificações podem ser agregadas: uso de uma gota de sangue o que dispensa a necessidade de separação soro - sangue (procedimento convencional utiliza soro) e simplifica o trabalho do técnico na coleta e preparo da amostra; coleta de sangue por punção digital que pode ser realizada fora das instalações laboratoriais (procedimento análogo aos testes glicêmicos); diminuição do rejeito hospitalar e redução de custos pois, elimina uso de vidraria, tubos de coleta e seringas, o que também minimiza os interferentes, pré-analíticos (transporte, centrifugação, armazenamento), além da possibilidade de realizar essas análises em localidades desprovidas de energia elétrica, pois este equipamento pode operar com baterias.
Tema amplo e com muitas alternativas.
Esta alternativa, por exemplo, pode ser útil também quando a disponibilidade do material é escassa, caso da clínica pediátrica de recém-nascido (neonatos) e pré-maturos, no qual a coleta de uma gota de sangue, como realizada pelo teste do pézinho, é suficiente para a realização desses exames clínicos. Para dar ideia da dimensão deste problema, um bebê prematuro (~1 kg) tem da ordem de 200 ml de sangue circulando no corpo e, dependendo da disfunção ou tratamento o recém-nascido pode necessitar de duas a três coletas de sangue por dia. Consequentemente, a coleta de sangue para exames laboratoriais e funcionais constituem a principal causa de transfusão de sangue na clínica pediátrica.
Outros destaques?
Outro aspecto inovador a destacar está relacionado ao uso desta alternativa em Laboratórios de Pesquisa que necessitam de testes in vivo, em modelo animal de pequeno porte como, por exemplo, camundongos e roedores (o que requer o seu sacrifício no caso do emprego de métodos convencionais, pois utilizam soro) para investigações relacionadas à formulação de novos medicamentos, vacinas e demais insumos médicos correlatos.
Bom que seja divulgado.
Sim. No âmbito de ação social, a consolidação da técnica proposta para realização desses exames clínicos gera melhorias na condição de saúde para vários grupos populacionais, que se encontram em condições de vulnerabilidade como: populações ribeirinhas e de localidades desprovidas de atendimento básico a saúde. Além disso, no âmbito econômico, essa alternativa pode ser explorada por instituições governamentais de saúde (p. ex. SUS no Brasil), em Institutos de Pesquisa e por laboratórios privados de análises clínicas. Considerando-se ainda o custo-benefício, como elemento de viabilidade do método, as simplificações propostas (redução de material laboratorial e de rejeito hospitalar além da eliminação de refrigeração) são de grande relevância pois, tem-se redução de custo de no mínimo 70%.
E na área da Investigação do Patrimônio Artístico e Cultural? O que é e como funciona?
Essa é uma atividade mais recente no LEER. Desde que passei a trabalhar com a técnica fluorescência de raios X, as possibilidades de aplicações se ampliaram, e uma das áreas que pode ser investigada diz respeito ao Patrimônio Artístico e Cultural (tais como pintura, escultura, acervos fotográficos, desenhos, gravuras, mapas, artesanato e objetos de uso tradicional). Essa atividade envolve a parceria com outros grupos do IPEN. Hoje atuamos em investigações que envolvem peritagem, caraterização de materiais artísticos (como pigmentos, tintas, vernizes, ceras, giz, carvão) e datação de obras de artes fazendo uso de raios X e nêutrons, que são análises complementares. Temos como parceiros o Museu da Polícia Militar de São Paulo e a Pinacoteca de São Paulo, além de uma procura crescente de colecionadores particulares.
Como participa do programa ARCAL, da AIEA? O que é? Objetivos? Perspectivas?
Eu diria que minha participação no ARCAL (Acuerdo Regional de Cooperación para la Promoción de la Ciencia y la Tecnología Nucleares en América Latina) é minha contribuição científica para área de meio-ambiente. Fui convidada a participar do projeto RLA7025, Applying nuclear and stable isotope technique to increase the resilience of the Brazilian coast ecosystems to oil spill and plastic debris, coordenado pelo Prof. Roberto Meigikos dos Anjos (UFF), que tem por objetivo monitorar a distribuição e abundância de microplásticos em sistema marinho, utilizando técnicas nucleares e isotópicas, e avaliar a extensão que esses detritos plásticos podem ser transferidos em um ecossistema costal. Envolve 15 países da América Latina e Caribe e tem o apoio da AIEA. No Brasil participam a Universidade Federal Fluminense (UFF), o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN-SP) e o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM). O objetivo final é gerar conhecimento científico de processos e mecanismos que possibilitem dimensionar os efeitos interferentes/poluentes no ambiente marinho, bem como avaliar o impacto desses detritos plásticos em organismos marinhos de diversos níveis tróficos dentro da cadeia alimentar, auxiliando a promoção de programas de conservação no litoral do Rio de Janeiro e Niterói. Nossa perspectiva é que esses programas de conservação sejam aplicados e, se necessário, implementados em outras regiões.
De que forma a área nuclear pode contribuir com a preservação do meio ambiente no Brasil? Como analisa o futuro na energia nuclear?
O projeto que acabei de citar, a investigação de microplásticos no ambiente marinho, é um exemplo. Da mesma forma, outros setores como o agro pode ser beneficiado, no estudo da absorção de nutrientes pelas plantas, o que leva a melhorias no âmbito de produtividade, por exemplo em canaviais e cafezais, bem como na eliminação de pragas com o uso da técnica do inseto estéril, o que diminui o uso de agroquímicos. Outro exemplo direcionado a meio-ambiente é a avaliação de recursos hídricos utilizando radioisótopos para mapear os cursos de água. Na área da saúde a irradiação de alimentos, que já tem mais de 100 anos de uso no mundo, leva a redução do uso de produtos químicos e ao aumento da vida de prateleira de vários alimentos.
Sugestões para o Governo Lula?
De imediato, investir nas atividades do ciclo do combustível para a produção e comercialização de elementos combustíveis nucleares, pois o principal fornecedor de urânio no mundo é o Cazaquistão, que está fortemente prejudicado pelo atual quadro político entre a Rússia e Ucrânia. Cabe ressaltar que o Brasil possui reservas de urânio, domina a tecnologia do ciclo do combustível, ou seja, é o momento certo de pôr em prática e atender a demanda mundial. Além disso, é necessário criar condições de alavancar o progresso no âmbito nuclear, o que enfatiza a necessidade da recomposição de pessoal qualificado. Vale lembrar que o PROSUB, Angra 3 e o RMB foram iniciados em 2008 pelo Governo Lula.
Conte um pouco a sua história.
Natural de São Paulo e filha de pais que não são da área de ciência, mas que sempre incentivaram os estudos. Meu pai foi da área de engenharia além de se dedicar a artes (pintura e escultura) e minha mãe da área de administração e pianista. Portanto cresci em ambiente que valoriza a Educação e a Cultura, e acredito que isso me direcionou à atividade de aprender e repassar conhecimento. Inicialmente minha vontade era de atuar na área de Astrofísica, por isso, no final do ensino médio fui montar um telescópio em curso que era disponibilizado no planetário de São Paulo. Mas, durante a graduação em Física, ficou explícito ser uma atividade teórica, o que me direcionou para Física Nuclear já prevendo atuar na área experimental. Concluí minha graduação em Física pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o mestrado em Estrutura Nuclear e o doutorado em Tecnologia Nuclear pela Universidade de São Paulo.
E hoje?
Atualmente coordeno o Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações no IPEN e sempre realizei atividades paralelas para complementar minha formação e me familiarizar com temas que passo a investigar. Foram vários cursos em Análises Clínicas, Genética, Matemática, Veterinária, Meliponicultora, Apicultura e mais recentemente Cinema e Audiovisual para aprimorar os documentários elaborados para projeto Jovem Cientista. E como lazer fui aprender piano, violão, flauta, dança, pintura, desenho e muito mais.
Desafios?
Fazem parte do meu cotidiano, em parte pelo preconceito e, em parte por querer inovar. O novo é o que motiva a continuar na pesquisa. Quanto às atividades futuras, avalio que o IPEN tem potencial para ampliar sua atuação na área da investigação do Patrimônio Artístico e Cultural. Embora a utilização de raios X seja usual, o uso de nêutrons não, pois é restrita aos países que possuem reatores. Os trabalhos que já realizamos com nêutrons mostraram o potencial desta atividade e o interesse da sociedade, principalmente de colecionadores e ateliês, em ter acesso a essas tecnologias que cuidam e auxiliam a preservação do Patrimônio Artístico e Cultura.
Mensagem para as mulheres?
De mulher para mulher, a minha mensagem é que apesar das dificuldades, que em parte vem do preconceito, se enxergar o potencial de seu trabalho, insista em realizá-lo. Venha conhecer o LEER e apresentar seu projeto. Estou sempre disposta a aprender e atuar com novidades e, se eu não puder colaborar, acredito que um dos muitos colaboradores que tive a oportunidade de interagir, poderá cooperar com sua pesquisa. Me considero ativa e dedicada e me sinto motivada profissionalmente apesar das dificuldades no âmbito financeiro, que muitas vezes atrasam as pesquisas. Hoje coordeno sete projetos, oriento onze alunos e colaboro em três projetos de âmbito internacional. Nesses anos de atuação foram várias oportunidades para colaborar com Instituições Nacionais e Internacionais, que me proporcionaram ter dezenas de colaboradores que me ensinaram muito e, além disso, tenho orgulho dos alunos que formei e que hoje atuam em intuições renomadas de âmbito nacional e internacional.
Em relação ao ocorrido na Usina nuclear de Angra (vazamento de água radioativa em setembro de 2022), como avalia?
Só tenho conhecimento do que foi publicado na mídia. Não tenho mais informações a respeito para poder embasar algum juízo. Como mencionei anteriormente, considero a transparência fundamental de forma a proporcionar os esclarecimentos necessários sem excessos ou omissões, de ambos os lados.
PERFIL
Cibele Bugno Zamboni - Graduada em Física pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com mestrado em Estrutura Nuclear e doutorado em Tecnologia Nuclear, ambos pela Universidade de São Paulo. É professora do Programa de Tecnologia Nuclear IPEN/CNEN-SP, orientadora da pós-graduação da Universidade de São Paulo e editora-chefe do site Jovem Cientista. Supervisora do Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações do Centro do Reator de Pesquisas (LEER/CERPQ) e coordena os dois projetos de âmbito institucional: Caracterização físico-química e biológica de insumos oriundos da abelha nativa Scaptotrigona aff. Postica (na área de meio ambiente, processo: 2020.06IPEN13) e Dosagem de íons em amostras de saliva utilizando técnicas analíticas nucleares de AAN e FRX: procedimentos alternativos para prática clínica (na área da saúde, processo: 2018.05IPEN03).
Membro do programa IAEA/ARCAL (International Atomic Energy Agency/ Acuerdo Regional de Cooperación para la Promoción de la Ciencia y Tecnología Nucleares en América Latina y El Caribe), atuando nos projetos: Strengthening Regional Monitoring and Response for Sustainable Marine and Coastal Environments (RLA7022) e Applying Nuclear Techniques Including Stable Isotopes to Identify Triggers of Hamful Alga Blooms (RL7011).
Experiência na área de Estrutura Nuclear (Supervisora do Laboratório de Estrutura Nuclear (LEN/IPEN 1989-2002) na área de Aplicações de Radioisótopos com ênfase em Física Aplicada à Área da Saúde e Meio Ambiente (Supervisora do LEER/IPEN 2003-atual) e, mais recentemente, na Investigação do Patrimônio Artístico e Cultural.
Participação ativa na divulgação da ciência, com publicação de textos científicos para leigos. Desde 2019 coordena o projeto jovem cientista (Site jovemcientista.com.br), que disponibiliza conteúdo cientifico em várias redes sociais: Instagram (@jovemcientista.com.br), Facebook (@jovemcientista.com.br), Youtube (Canal "Jovem Cientista”), TikTok (@jovemcientista.com.br) e LinkedIn.
Publicação de 91 trabalhos científicos em revistas indexadas, 4 livros, 10 capítulos de livros, desenvolvimento de 14 processos de inovação tecnológica e 59 orientações. Atualmente orienta 10 alunos (4 iniciações científicas, 4 mestrados, 1 doutorado, 1 pós-doc). Ganhou vários prêmios de âmbito nacional e internacional. Membro da OWSD - Organization for Women in Science for the Developing World, Membro da WiN Global - Women in Nuclear Global, Membro da SBF - Sociedade Brasileira de Física, Professora colaboradora da Universidade de Santo Amaro - UNISA (SP), Universidade de São Paulo (IFUSP), Núcleo Estratégico de Venenos e Soros e do Laboratório de Parasitologia Instituto Butantan (IBu-SP), Instituto de Odontologia USP, Hospital Universitário (HU-USP), Universidade Federal Fluminense (UFF), Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFERP-USP), Museu da Polícia Militar do Estado de São Paulo e da Pinacoteca de São Paulo.
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- 22/03/2023 - Doutora em Tecnologia Nuclear assume comando do projeto RMB e comenta a atuação feminina no setorFonte: Blog Tania Malheiros - Jornalista
Doutora em Tecnologia Nuclear, a paulistana Patrícia Pagetti, funcionária do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), é a nova coordenadora técnica do projeto do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), no lugar de José Augusto Perrotta, que se aposentou. Ela comenta a tentativa de desconstrução do projeto - ato de "extrema falta de respeito aos profissionais da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) - que agora, com a apoio da ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, tem as esperanças renovadas. O RMB será capaz de produzir radiofarmacos (insumos para a produção de radioisótopos, usados no diagnóstico e tratamento contra o câncer) poderá gerar ao país recursos anuais brutos na ordem de US$ 50 milhões. Descendente de italianos, com mestrado em matemática e estatística, ela acredita que o governo deva escutar os alertas e recomendações dos especialistas na área nuclear, para que as prioridades sejam bem definidas. Neste mês de março, quando o BLOG presta homenagem às mulheres, Patrícia afirma que não sofreu preconceito e machismo de forma direta, durante a sua trajetória profissional. Se provocou ciumeira ao assumir o comendo do RMB, ela comenta: "Neste caso, posso dizer que não foi o fato de ser mulher que criou algum tipo de ciúmes, mas sim por meu nome não ser conhecido como o de muitas pessoas em evidência na área nuclear. Imagino que isto possa ter gerado algum tipo de desconfiança, não ciúmes. É que Patrícia, reservada, e "sem inclinação para fazer política”, não sabe fazer propaganda de seu trabalho. Eis a entrevista.Como ocorreu o convite para coordenar o projeto de construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB)?
Fui convidada a assumir a coordenação técnica do Projeto RMB poucas semanas após a notícia do pedido de aposentadoria do Dr. José Augusto Perrotta. Como todos sabem, o Dr. Perrotta é um profissional muito reconhecido na área nuclear, não só no Brasil, mas também na comunidade internacional. Ele é o grande idealizador do RMB e vinha conduzindo o projeto de forma brilhante e incansável até meados de 2022. Sua aposentadoria foi uma notícia que pegou a todos de surpresa. Nesta época, não havia nenhuma sinalização favorável por parte do MCTI em garantir recursos financeiros para a continuidade do projeto, nem tampouco havia ações efetivas da alta direção da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) para obter estes recursos. Ao mesmo tempo, chegavam até nós sinais de ações de dentro do ministério que tinham por objetivo "desconstruir” o RMB. O Dr. Perrotta encontrou sua forma de protestar contra esta situação, considerada de extrema falta de respeito aos profissionais de carreira da CNEN e que são os que detêm o conhecimento dos projetos que são desenvolvidos nesta instituição.
Esperava o convite?
Eu não esperava ser convidada para assumir a função e confesso que senti um certo receio. Eu já estava participando do projeto desde seu lançamento, em 2008, e presenciei alguns momentos críticos de indefinições sobre a continuidade do projeto e sempre tive noção da grande responsabilidade que esta função de coordenação exige. Para se ter uma ideia, o projeto é desenvolvido no âmbito da Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento (DPD) da CNEN, porém, não há uma estrutura formal, hoje, dentro desta autarquia, específica para o desenvolvimento do RMB. Eu fui nomeada para o cargo que era ocupado pelo Dr. Perrotta, ou seja, Assessor Técnico da DPD/CNEN para assuntos do RMB.
Onde estava trabalhando naquela época?
Comecei a trabalhar no IPEN como estagiária em 1985, quando eu ainda estava cursando o mestrado no Instituto de Matemática e Estatística da USP. Em 1987, fui contratada para trabalhar na área de análise de segurança e análise de confiabilidade de sistemas nucleares. Devido à minha formação em Matemática e Estatística, com concentração em Teoria da Confiabilidade, passei a me especializar na aplicação da Análise Probabilística de Segurança para instalações nucleares. No início da minha carreira, participei das análises de vários projetos nucleares da Marinha do Brasil, desenvolvidos junto ao Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP). Depois fiz meu doutorado em Tecnologia Nuclear no IPEN-CNEN, que está vinculado ao programa de pós-graduação da USP. Até meados de 2022, eu estava alocada no Centro de Engenharia Nuclear do IPEN-CNEN e dividia meu tempo entre atividades relacionadas à gestão deste centro, análises de segurança dos reatores de pesquisa localizados no IPEN-CNEN, tarefas de apoio ao grupo de análise probabilística de segurança da Diretoria de Radioproteção e Segurança (DRS) da CNEN e tarefas relacionadas ao RMB.
Já conhecia bem o projeto...
Conforme citei anteriormente, eu já vinha participando do projeto RMB desde seu lançamento, em 2008, mas nos últimos cinco, seis anos, passei a atuar de forma mais próxima à coordenação do RMB devido às atividades de revisão da análise de segurança nuclear do projeto do reator. Existe um processo de licenciamento nuclear do RMB em andamento junto à autoridade em segurança nuclear no Brasil, que é a Diretoria de Radioproteção e Segurança (DRS) da CNEN. Este processo foi iniciado há mais de 10 anos e, de acordo com regulamentação da CNEN, possui várias etapas a serem cumpridas.
Como está no momento?
A primeira etapa cumprida ocorreu em janeiro de 2015, quando a DRS/CNEN concedeu a licença denominada "Aprovação do Local” para implantação do Empreendimento RMB no sítio localizado no Município de Iperó/SP. A próxima etapa a ser cumprida diz respeito a obtenção da licença de construção dos prédios nucleares do empreendimento. Eu creio que o entendimento do Dr. Perrotta, assim como de outras pessoas que foram consultadas sobre a indicação de meu nome para substituí-lo no cargo, era de que o licenciamento nuclear do RMB não podia parar, e eu era a servidora da CNEN que estava mais envolvida com esta tarefa naquele momento.
O projeto do reator começou junto com o projeto argentino, que, segundo informações, o argentino, estaria praticamente concluído. E o brasileiro, quase parado por falta de verbas e decisões políticas. Com analisa esta situação?
O fato é que o desenvolvimento da área nuclear na Argentina avançou de modo diverso do que no Brasil nas últimas décadas. O caso do projeto do reator argentino RA-10, o qual possui muita similaridade com o projeto do RMB, pode ser inserido neste contexto. Porém, é importante citar que a cooperação nuclear com a Argentina tem sido altamente estratégica para o desenvolvimento do programa nuclear brasileiro, tanto na vertente de não proliferação nuclear, com a criação da Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC, 1991) quanto na vertente das aplicações da tecnologia para fins pacíficos (Acordo de Cooperação para o Desenvolvimento e a Aplicação de Usos Pacíficos da energia Nuclear, 1980). Em ambas as vertentes que se encontram no fulcro da cooperação nuclear bilateral, a CNEN tem papel central.
A ministra Luciana Santos anunciou que haverá parceria entre Argentina e Brasil para que o RMB saia do papel. Como esta parceria será viabilizada?
Há duas instâncias principais de diálogo, fomento e acompanhamento da cooperação bilateral entre Brasil e Argentina na área nuclear: o Comitê Permanente de Política Nuclear (CPPN) e a Comissão Binacional de Energia Nuclear (COBEN). O CPPN, cuja última reunião foi realizada em Buenos Aires em 26 de julho de 2022, é coordenado pelas chancelarias de ambos os países e propulsiona iniciativas conjuntas nas áreas política, técnica e empresarial do setor nuclear. A COBEN, por sua vez, é liderada pelas Comissões Nacionais de Energia Nuclear, CNEN/Brasil e CNEA/Argentina. A COBEN se inscreve como paradigma no histórico da cooperação bilateral, tendo servido como foro para a gênese da iniciativa de desenvolvimento conjunto de reatores nucleares que resultou, ao longo do processo, no lançamento dos projetos dos reatores RMB e RA-10. Ambos os reatores contam com a mesma base de engenharia e seus projetos são semelhantes. Devido à falta de alocação de recursos financeiros adequados, a COBEN foi perdendo paulatinamente o ímpeto inicial, embora siga existindo formalmente.
Conte mais sobre esses acordos.
O último acordo de cooperação entre CNEN/Brasil e CNEA/Argentina no âmbito da COBEN foi assinado em 31 de janeiro de 2011, com um termo aditivo firmado em 12 de agosto de 2014. Nesta época, houve muita sinergia entre profissionais da área técnica de ambas as comissões e isto facilitou a contratação da empresa de engenharia argentina INVAP para participação do projeto de engenharia do RMB. A INVAP possui um quadro de profissionais de excelência, engenheiros em sua grande maioria, e vasta experiência em projeto e construção de reatores nucleares de pesquisa, além de atuar em outras áreas estratégicas da engenharia nuclear e espacial. O RMB, por meio de dois convênios anteriores com a FINEP, firmou contratos com a INVAP para desenvolvimento de parte dos projetos de engenharia básico e detalhado do reator, que é a principal instalação do empreendimento. Foram experiências de sucesso até o momento e, portanto, devemos saudar o excelente histórico de diálogo e cooperação com a CNEA/Argentina e com a INVAP. Esperamos, em breve, submeter à apreciação da Ministra Luciana Santos a recomendação de que sejam retomados os trabalhos da COBEN, idealmente ainda neste 1º Semestre de 2023.
O que ocorre neste momento para que o RMB seja um sonho brasileiro saindo do papel?
Vou repetir um mantra que o Dr. Perrotta faz questão de nos passar. Para que o RMB possa sair do papel, precisamos de R$ (recursos financeiros), RH (recursos humanos) e gestão (uma estrutura organizacional). Será necessário criar uma estrutura organizacional, dentro da CNEN, para que se possa fazer a gestão das próximas etapas da fase de implantação do RMB, em especial das etapas de aquisição de itens e suprimentos, construção de prédios e demais edificações e montagem eletromecânica de equipamentos.
O que há além disso?
Já existe uma proposta para esta estrutura organizacional, mas também estamos trabalhando na contratação de uma empresa especializada que possa elaborar um plano estratégico para as próximas etapas da fase de implantação do RMB, que inclui a fase pré-operacional e de comissionamento da instalação. Além disso, e não menos importante, está o compromisso por parte da alta direção da CNEN em atuar junto às autoridades governamentais, para obtenção dos recursos financeiros (R$) e recursos humanos (RH) para implementar todas as etapas futuras. O RMB é um sonho que requer previsibilidade desses recursos para que possa ser concretizado.
O que já foi feito? O que está pronto?
O Empreendimento RMB está estruturado em três fases: implantação, operação e descomissionamento. Na primeira fase, de implantação, o produto final será o reator e as instalações complementares licenciadas de acordo com as leis e regulamentações nas áreas ambiental e nuclear, e comissionadas para entrar em operação. A segunda fase inicia-se com a operação do reator e das instalações, cujo produto final consiste na disponibilização de produtos e serviços para o país. Após comissionado, o RMB deverá operar durante 50 anos, podendo ter sua vida útil estendida por mais 20 anos, devendo então ser descomissionado, o que consiste na terceira fase. A fase de implantação do Empreendimento RMB consiste das seguintes etapas: prospecção do local; elaboração dos projetos de concepção e básico do reator, laboratórios e infraestrutura; elaboração do projeto detalhado do reator, laboratórios e infraestrutura; Aquisição de equipamentos e componentes; fabricação e montagem; construção de todas as instalações associadas ao Empreendimento RMB; desenvolvimento e fornecimento do combustível nuclear; licenciamento Ambiental junto ao IBAMA; licenciamento Nuclear junto à Diretoria de Radioproteção e Segurança (DRS) da CNEN. No caso do comissionamento, os resultados obtidos em cada uma das 10 etapas da fase de implantação são indicados, da prospecção do local [finalizado], até passando pelo empreendimento que será instalado em uma área de dois milhões de metros quadrados, contígua ao Centro Industrial Nuclear de Aramar (CINA), no Município de Iperó-SP. Parte do terreno do empreendimento (1,2 milhão de m2) foi cedido pela Marinha do Brasil à CNEN. A área complementar (840 mil m2) foi desapropriada pelo Governo do Estado de São Paulo e cedida à CNEN através do IPEN-CNEN.
São muitas etapas.
Sim, como o projeto Conceitual [finalizado], realizado por engenheiros e tecnologistas das unidades técnico-científicas da CNEN, liderados pelo Coordenador Técnico do RMB, determinando o conceito do empreendimento, reator, laboratórios, prédios, infraestrutura, licenciamento e conceito operacional. O Projeto Básico de Engenharia [finalizado]; etapa de projeto vinculada ao Convênio Finep/REDETEC/CNEN 01.10.0704.00, projeto de encomenda FNDCT, coordenado e verificado pela CNEN e executado pela empresa brasileira de engenharia INTERTECHNE, contratada para a execução da engenharia convencional de prédios, infraestrutura e sistemas; empresa argentina de engenharia nuclear INVAP, contratada para a execução da engenharia do reator e sistemas nucleares associados. A INVAP atuou devido a um acordo de cooperação envolvendo a CNEN do Brasil e a CNEA da Argentina (Reator RMB no Brasil e Reator RA-10 na Argentina), no âmbito da Comissão Binacional de Energia Nuclear (COBEN). A empresa engenharia nuclear INVAP participa como contratada para a execução da engenharia do reator e sistemas nucleares associados. Novamente, a INVAP atuou no âmbito do acordo da COBEN, envolvendo a CNEN do Brasil e a CNEA da Argentina; também a brasileira de engenharia AMAZUL, que executou os trabalhos de engenharia de prédios e sistemas convencionais, contratando profissionais especializados através dos recursos financeiros do convênio Finep.
O que temos para 2023?
O projeto detalhado dos demais laboratórios e infraestrutura do Empreendimento RMB, incluído como meta do Convênio Finep/PATRIA/CNEN firmado em dezembro de 2022. Também temos o projeto detalhado de terraplenagem do Plano Diretor do sítio do RMB, previsão de início em 2024, incluído como meta do Convênio Finep/PATRIA/CNEN firmado em dezembro de 2022. Além da aquisição de equipamentos e componentes aguardando recursos, entre outras ações.
E as etapas importantes como o desenvolvimento do combustível?
Essa etapa foi realizada sob coordenação da CNEN e responsabilidade da equipe do IPEN que atua no RMB e equipe do CTMSP, consistindo na execução do Convênio Finep/CNEN/CTMSP/PATRIA 01.13.0389.00, projeto de encomenda FNDCT, para adequação das instalações do Laboratório de Enriquecimento Isotópico (LEI) do CTMSP para produção de UF6 (urânio) enriquecido a 20%. BLOG: Etapa essencial. PATRICIA: Sim. A adequação das instalações do Centro do Combustível Nuclear (CECON) do IPEN para produção de elementos combustíveis e alvos de urânio para a operação do RMB; e a instalação de um novo núcleo com combustível tipo placa, idêntico ao núcleo do reator RMB, no reator IPEN/MB-01 localizado no IPEN-CNEN. Dentro deste convênio foi inaugurada, em dezembro de 2016, uma nova cascata de enriquecimento isotópico de urânio no LEI do CTMSP no Centro Industrial Nuclear de Aramar (CINA) e iniciada a produção de UF6 enriquecido a 20%. Foram modernizadas as instalações do CECON do IPEN e fabricados 19 elementos combustíveis, com a mesma especificação do combustível do RMB, com urânio e tecnologia totalmente nacionais.
E a questão ambiental?
Está em a andamento o Licenciamento Ambiental junto ao IBAMA. É realizado pela Coordenação Técnica do RMB, com apoio das unidades técnico-científicas da CNEN. Empresas brasileiras especializadas foram contratadas: MRS-Estudos Ambientais Ltda, para a emissão do EIA-RIMA e realização das Audiências Públicas, até a obtenção da Licença Prévia (LP) ambiental do IBAMA; e WALM Engenharia e Tecnologia Ambiental para realização dos Programas Ambientais e obtenção da Licença de Instalação (LI) junto ao IBAMA. Estes serviços foram realizados com recursos da ação orçamentária do RMB (Ação 12P1). A Licença Prévia do RMB (LP Nº 500/2015) foi emitida pelo IBAMA em maio de 2015 e a Licença de Instalação (LI Nº 1323/2019) em novembro de 2019, permitindo que o Empreendimento RMB possa ser construído.
Quais os próximos passos? Há planejamento para este ano? E para 2024 e os próximos anos?
PATRICIA: Em dezembro de 2022, um novo convênio com a Finep foi assinado entre CNEN e Fundação PATRIA, com prazo de conclusão até dezembro de 2025. Este convênio se deve a uma ação positiva do ex-Ministro Paulo Alvim, que esteve no comando da pasta do MCTI de abril a dezembro de 2022. Os recursos deste convênio são provenientes do Fundo Nacional para Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia (FNDCT), gerido pelo MCTI, e serão disponibilizados em três parcelas no período de 2022 a 2024, totalizando R$ 172 milhões.
O que receberam?
A primeira parcela, no montante de R$ 20 milhões, como mencionei acima, foi empenhada ainda em 2022 e repassada em janeiro de 2023 para a Fundação PATRIA, convenente que fará a gestão destes recursos de acordo com as metas definidas pela CNEN. Desta forma, desde o início de 2023, estamos trabalhando em várias atividades de modo a cumprir o cronograma físico-financeiro estabelecido neste convênio. O prazo para execução deste convênio, codificado como RMB172, é dezembro de 2025. Após a execução deste contrato com a Finep, não há garantia de que novos convênios serão firmados. Assim, não temos previsibilidade de recursos para entrar nas etapas de aquisição de itens e suprimentos e de construção de prédios e demais edificações de infraestrutura do empreendimento.
Recapitulando, quanto já foi investido e em quais períodos?
Desde seu lançamento até os dias de hoje, o Projeto RMB recebeu aportes financeiros com recursos provenientes do FNDCT por meio de quatro convênios com a Finep, anteriores ao convênio que estamos trabalhando no momento. Foram quatro convênios iniciados em diferentes datas no período entre 2010 e 2014, e que foram executados de acordo com os prazos estabelecidos, considerando que o último convênio foi concluído em novembro de 2021. Por meio destes convênios com a Finep, foram investidos em torno de R$ 260 milhões. A desapropriação da área em Iperó/SP para implantação do sítio do RMB custou, aproximadamente, R$ 13 milhões, valor este pago diretamente pelo Governo do Estado de São Paulo. Além disso, existe uma ação orçamentária específica para implantação do RMB, a qual está prevista na LOA do Governo Federal, reservando recursos orçamentários anuais para este fim. A partir desta fonte foram pagas despesas da ordem de R$ 10 milhões, considerando o período de 2012 até o final de 2022.
Qual o planejamento daqui em diante: Quanto será necessário? O governo Lula vai liberar quanto este ano?
Conforme mencionado, estamos executando as atividades necessárias para cumprir o cronograma de metas que foi estabelecido no atual convênio com a Finep, o RMB172. Este convênio tem um prazo de execução de 36 meses, contado a partir de dezembro de 2022.
Alguma liberação?
A primeira parcela do convênio de R$ 20 milhões, como disse, foi repassada em janeiro de 2023 à fundação de apoio que fará a gestão dos recursos. Ainda em 2023, espera-se o repasse da segunda parcela do convênio, no valor de R$ 70 milhões. Este recurso deverá sair do FNDCT, que é gerido pelo MCTI. Em 2024, tem-se a previsão de repasse de R$ 82 milhões da terceira parcela do convênio. Além disso, existe a previsão de recursos orçamentários da ordem de R$ 4,8 milhões para a ação específica do RMB (Ação 12P1), considerando as dotações apresentadas na LOA 2023 proposta pelo Governo Federal e aprovada pelo Congresso Nacional. Estes recursos orçamentários devem ser usados para cobrir os custos de manutenção do sítio do RMB em Iperó, para execução dos planos ambientais exigidos pelo IBAMA, para aplicação em programas de comunicação social e em projetos experimentais que possam beneficiar o desenvolvimento do empreendimento.
O RMB precisa de quanto para ser inaugurado? E quando será?
O RMB é um empreendimento cujo custo estimado é de US$ 500 milhões, que na cotação atual (US$ 1 = R$ 5,20) corresponde a R$ 2,6 bilhões. O RMB precisaria de aportes anuais de US$ 100 milhões para ser construído ao longo de cinco anos. Este é o cenário mais otimista que temos para apresentar.
O objetivo principal é produzir radioisótopos para a produção de radiofarmacos para diagnóstico e combate ao câncer?
Sim. Pode-se dizer que este é um dos objetivos principais do empreendimento RMB. O projeto proposto pela CNEN consiste, principalmente, de um reator de pesquisa multipropósito com característica de alto fluxo de nêutrons, visando: produzir todos os radioisótopos necessários ao país, principalmente para as aplicações médicas (diagnóstico e terapia); fornecer feixe de nêutrons com intensidade e qualidade que o posicione como um dos principais feixes disponíveis em pesquisa do mundo, atuando de forma complementar ao Projeto Sirius; permitir a realização de testes de combustíveis nucleares para as centrais nucleares e para a indústria do ciclo do combustível nuclear brasileiro; permitir a realização de testes de desempenho do combustível a ser utilizado no submarino nuclear brasileiro, garantindo segurança e soberania na utilização dessas embarcações; e ser o iniciador de um novo centro avançado de tecnologia nuclear que garantirá a continuidade do conhecimento dessa área estratégica para o país.
Qual a perspectiva de produção nacional? Há planos de exportação?
Quando o RMB estiver em operação, o Brasil será capaz de produzir radioisótopos em quantidade e qualidade suficientes para estabelecer uma política pública para a medicina nuclear do país, fornecendo insumos para entes privados e, também, diretamente para o atendimento da população através do SUS. Isso gerará expansão e equilíbrio social na medicina nuclear do país. Um ponto extremamente positivo para operação do RMB é que a receita associada à venda de radioisótopos pode cobrir o custo da operação do empreendimento, sobrando recursos para investimento em pesquisa e modernização. Você deve saber que isto não é comum em empreendimentos de ciência e tecnologia no país. Ou seja, o empreendimento RMB poderá prescindir de orçamento operacional do governo desde que tenha um modelo de gestão diferente do atual. Além disso, existe possibilidade de se gerar recursos adicionais pela exportação de excedentes de radioisótopos e pela venda de outros produtos/serviços como dopagem de tarugos de silício para indústria eletrônica; alvos de urânio e combustíveis para reatores de pesquisa (exportação); fontes seladas para aplicações industriais; etc. Não menos importantes são os serviços e pesquisas que podem ser feitas com o reator e os laboratórios associados. Estamos falando da possibilidade de geração de recursos financeiros (bruto) acima de US$ 50 milhões anuais.
O Brasil não terá mais que importar os radiofarmacos. Como será a economia para o país?
Sim. Com a finalização do Empreendimento RMB, o Brasil estará apto a ser autossuficiente em radioisótopos produzidos em reatores nucleares de pesquisa. Dentre estes radioisótopos, estão incluídos aqueles empregados atualmente na produção de radiofármacos que, por sua vez, são utilizados na Medicina Nuclear. As aplicações de técnicas nucleares são de grande extensão e importância no país. Dentre essas aplicações, cabe destaque a aplicação social com a utilização de radiofármacos tanto para o diagnóstico como para uso terapêutico na medicina nuclear, propiciando cerca de dois milhões de procedimentos por ano no Brasil. Os radioisótopos que viabilizam a produção dos radiofármacos, e a realização desses procedimentos, são produzidos, em sua maioria, em reatores nucleares de pesquisa. Os reatores de pesquisa existentes no Brasil não têm capacidade para produzir esses radioisótopos em larga escala, o que impõe a importação dos radioisótopos, acarretando uma forte dependência do país em relação aos fornecedores estrangeiros. Atualmente, os gastos com importação giram em torno de US$ 17 milhões anuais.
O Brasil está atrasado em relação ao RMB porque costuma desprezar a ciência? A que credita o fato de nosso atraso?
Sim, pelo menos no que diz respeito à CNEN, o Brasil está atrasado na implantação de projetos considerados estruturantes para a área nuclear, que são os projetos do RMB e do CENTENA (centro tecnológico que consistirá de um repositório de rejeitos radioativos com atividade baixa e média). Eu acredito que seria necessário que as pessoas que têm poder de decisão no Brasil, tanto no poder executivo como no legislativo, tivessem uma visão estratégica sobre a importância do desenvolvimento da ciência e tecnologia no país. No caso específico da área nuclear, seria necessário adotar uma política de estado, que não fosse totalmente dependente dos governos. Existem leis e decretos que dão as diretrizes para a Política Nuclear Brasileira, porém não são cumpridos do modo com que deveriam. A CNEN tem competências legais e atribuições bem definidas para a aplicação desta política, mas está sendo esvaziada e suas unidades técnico científicas estão com setores inteiros desativados e laboratórios abandonados.
Grave...
Vou aproveitar sua pergunta para chamar atenção ao fato de que o quadro de servidores que atuam nas funções de controle e fiscalização da CNEN está sendo, cada vez mais, reduzido. São especialistas com responsabilidades em segurança nuclear das instalações, proteção radiológica de trabalhadores e indivíduos do público e proteção física e salvaguarda de materiais nucleares e radioativos. Em minha opinião, isto deveria ser colocado como um sinal de alerta aos futuros dirigentes da CNEN e ao MCTI. Eu acho fundamental a elaboração de um plano completo para recuperação, tanto em recursos humanos como orçamentários, da CNEN e de cada uma de suas unidades técnico-científicas, balizado na consecução de metas estratégicas do Programa Nuclear Brasileiro.
Como cientista, como analisa o setor tecnológico brasileiro em geral?
Eu não me sinto capacitada a fazer uma análise consistente e conclusiva sobre o que ocorre no setor tecnológico Brasileiro em geral. Acredito que em alguns setores da indústria, tais como aeroespacial e petroquímica, assim como na agricultura, os avanços tecnológicos no Brasil estejam acompanhando o desenvolvimento mundial. Na área nuclear, precisamos de mais investimentos.
O fato de ser mulher criou algum tipo de ciúmes no meio, já que é a primeira a assumir o cargo desde o início?
Neste caso, eu posso dizer que não foi o fato de ser mulher que criou algum tipo de ciúmes, mas sim o fato de meu nome não ser conhecido como o de muitas pessoas em evidência na área nuclear. Eu imagino que isto pode ter gerado algum tipo de desconfiança, não ciúmes. Eu sou uma pessoa reservada e talvez eu não tenha muita inclinação para fazer política e não saiba fazer muita propaganda do meu trabalho. No entanto, a cada convite recebido ou responsabilidade assumida, eu procuro trabalhar com muita dedicação, fazendo o possível para trazer bons resultados e atender às expectativas. Isto tem ocorrido em todos os projetos em que participo, quer seja na posição de executora, líder ou coordenadora. Eu procuro ser transparente e conheço minhas limitações.
Conte um pouco de sua história: é paulista? Qual a sua formação? Por que seguiu a área da ciência? Quais os mais relevantes atrativos? Já sofreu preconceito ou machismo? O que acha de as mulheres ainda estarem longe de ocuparem cargos em áreas da ciência e tecnologia até hoje?
Respondendo à sua primeira pergunta, eu costumo brincar dizendo que sou paulista, paulistana e palmeirense. Eu estudei em um colégio tradicional de São Paulo, que foi fundado para atender estudantes pertencentes às famílias de origem italiana. Desde os meus primeiros anos de escola, eu já podia sentir minha inclinação para as disciplinas na área de ciências exatas. Quando eu estava no colegial, que hoje equivale ao ensino médio, no final da década de 1970, eu tive a oportunidade de fazer cursos extracurriculares em eletrônica. Tudo o que envolvia ciências exatas me atraía muito. Quando eu ingressei no Instituto de Matemática e Estatística da USP, minha intenção era cursar Ciência da Computação. Ao final do primeiro ano do curso, me encantei com as disciplinas de probabilidade e estatística e mudei minha opção para o Bacharelado em Estatística. Eu via na estatística uma base para atuar em várias áreas, nas engenharias, na economia, nas ciências sociais, ciências médicas e biológicas, dentre outras. Antes de ser convidada a estagiar no IPEN, eu trabalhei quase dois anos no mercado financeiro. Porém, não me empolguei e descobri que queria ser cientista e tecnologista.
Vivenciou preconceito?
Não lembro de ter sofrido preconceito ou machismo de forma direta, mas sempre de forma velada. Sempre foi muito comum eu participar de eventos, congressos, cursos, no Brasil e no exterior, em que as mulheres são uma minoria. Penso que as mulheres precisam ser mais confiantes e ter coragem para seguir carreiras que parecem dominadas por homens. Quanto mais mulheres seguirem a carreira em C&T, mais mulheres poderão ocupar cargos de direção nas organizações. Eu acho importante incentivar!
O que espera do governo Lula e da ministra Luciana Santos?
Espero que eles tenham muito sucesso nos cargos que assumiram e que escutem os alertas e recomendações dos especialistas na área de C&T nuclear, para que as prioridades sejam bem definidas e a nossa estrutura nessa área seja aos poucos recuperada e renovada. Nós precisamos de alguma previsibilidade de recursos para poder conduzir e finalizar a implantação do RMB.
Quais seus planos?
Espero continuar trabalhando para que o sonho do RMB seja concretizado. Para isso, eu pretendo continuar agindo com ética e transparência, transmitindo confiança e procurando demonstrar que o desenvolvimento da área nuclear no Brasil vai trazer muitos benefícios para a nossa sociedade. Eu quero continuar trabalhando na CNEN até o dia em que minha saúde, minha família, meus colegas e gestores da instituição permitirem.
O achou da nomeação esta semana (20/03) do novo presidente da CNEN, Francisco Rondinelli Filho?
Todos que conhecem e têm a oportunidade de trabalhar com o Dr Francisco Rondinelli Junior certamente ficaram contentes com sua nomeação para a presidência da CNEN. O Dr. Rondinelli é um servidor de carreira da CNEN, muito íntegro e muito consciente dos desafios que irá enfrentar. Eu declaro meu voto de confiança e meu apoio ao trabalho que ele pretende realizar na instituição.
Qual a sua mensagem para jovens estudantes?
Eu gostaria de incentivar a todos os jovens e, em especial, jovens estudantes mulheres que percebam alguma inclinação para se dedicar às carreiras de ciência e tecnologia que sigam firme nesse caminho. A área de energia nuclear, assim como a de aplicações da tecnologia nuclear tem muito futuro e pode trazer muitos benefícios para a nossa sociedade. O Brasil precisa de vocês!
Como se define?
Sou organizada, talvez até metódica, sensata e um tanto pragmática. As pessoas costumam dizer que eu pareço ser uma pessoa muito calma no ambiente profissional. Eu acho que, com o tempo, fui aprendendo a controlar e ponderar minhas reações.
PERFIL
Patrícia da Silva Pagetti de Oliveira - Graduada no Bacharelado em Estatística, em 1983, pelo Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP). Em 1989 obteve o título de Mestre em Estatística pelo IME-USP, com concentração na área de Teoria da Confiabilidade. Em 2014 obteve o título de Doutora em Tecnologia Nuclear pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), vinculado à Pós-Graduação da USP.
Desde 1987 trabalha como Tecnologista Sênior no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), órgão situado em São Paulo – SP e vinculado à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), que, por sua vez, é uma Autarquia Federal do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) do Governo Federal do Brasil.
Com mais de 35 anos de experiência, tem atuado, principalmente, nas áreas de: Engenharia de Confiabilidade (sistemas de engenharia da indústria nuclear/convencional), Análise Probabilística de Segurança de instalações nucleares (reatores de pesquisa e unidades nucleoelétricas), desenvolvimento de base de dados de confiabilidade de equipamentos, análise de riscos de instalações industriais e programas de melhoria da cultura de segurança em organizações. No período de 2015 a 2022 atuou na gestão do Centro de Engenharia Nuclear do IPEN/CNEN.
Participou dos projetos de modernização e licenciamento dos Reatores de Pesquisa IEA-R1 e IPEN/MB-01, ambos instalados no IPEN/CNEN. Participou de diversos projetos e empreendimentos do Programa Nuclear Brasileiro, destacando-se as análises realizadas para o protótipo do reator para propulsão naval e instalações químicas do ciclo do combustível nuclear, além da elaboração e implementação de exercícios de emergência no Centro Industrial Nuclear de ARAMAR (Iperó, SP), que foram atividades desenvolvidas junto ao Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP).
De 2001 a 2004, foi líder do grupo que representou o Brasil no desenvolvimento do projeto de Atualização e Expansão da Base de Dados de Confiabilidade para Reatores Nucleares de Pesquisa, coordenado pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA, na sigla em inglês), instituição vinculada à Organização das Nações Unidas.
No período de 2012 a 2013 participou como consultora técnica da IAEA na elaboração de relatório de segurança contendo diretrizes para aplicação da metodologia de avaliação probabilística para a operação segura e confiável de reatores nucleares de pesquisa.
De 2000 a 2007, participou, junto à Diretoria de Radioproteção e Segurança (DRS) da CNEN, dos trabalhos de revisão técnica, para fins de licenciamento, do estudo de Análise Probabilística de Segurança da usina Angra-1 da Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA).
No período de 2015 a 2018, participou como líder da tarefa referente à Análise Probabilística de Segurança do Projeto BR3.01/12 (Apoio Técnico ao Órgão Regulador Nuclear do Brasil), desenvolvido por DRS/CNEN e Comissão Europeia.
De 2006 a 2015 participou em projetos conduzidos no IPEN/CNEN na área de fontes renováveis de energia, desenvolvendo trabalhos relativos à análise de confiabilidade de células a combustível. Desde 2008, participa do projeto do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), com destaque para as atividades voltadas ao licenciamento nuclear e à análise de segurança desta instalação, que requerem a elaboração dos Relatórios de Análise de Segurança exigidos no processo de licenciamento e o desenvolvimento de um estudo de Análise Probabilística de Segurança para esta instalação.
Em agosto de 2022, foi nomeada para a função de Assessora Técnica deste empreendimento. Durante todos estes anos tem participado de cursos de aperfeiçoamento, congressos e eventos, tendo publicado inúmeros trabalhos. Já ministrou cursos internos para grupos de pesquisadores e engenheiros do IPEN e tem atuado continuamente na supervisão de trabalhos acadêmicos desenvolvidos no âmbito do programa de Pós-Graduação (Strictu Sensu) em Tecnologia Nuclear do IPEN/CNEN, vinculado à Pós-Graduação da USP.
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- 08/03/2023 - Por simulação computacional, cientistas testam nova estratégia para a captura de carbonoFonte: Agência FAPESP
As estratégias propostas para mitigar a mudança climática se baseiam principalmente em dois pilares: a geração de energia de baixo carbono e o desenvolvimento de tecnologias capazes de capturar parte do CO2que já está na atmosfera – seja para armazená-lo ou reciclá-lo posteriormente formando compostos químicos de valor industrial.
Com esse segundo objetivo em mente, pesquisadores do Centro de Inovação em Novas Energias (CINE) fizeram simulações computacionais para entender como ocorre a absorção de moléculas de CO2em um líquido iônico (composto por sais que se mantêm líquidos em temperatura ambiente) confinado em placas de carbono com poros de diferentes tamanhos.
Os autores usaram simulações de dinâmica molecular, método computacional que permite simular os movimentos de átomos e moléculas, para investigar a influência dos tamanhos dos poros (entre 0,75 e 1,5 nanômetro) e da aplicação de uma tensão elétrica na absorção de CO2.
Entre outros resultados, os cientistas descobriram que a tensão incrementa a quantidade de dióxido de carbono dentro dos poros e aumenta a velocidade de absorção do gás no líquido iônico confinado entre as placas. Além disso, eles confirmaram que os poros maiores absorvem dióxido de carbono mais rapidamente.
Os resultados da pesquisa foram publicados no Journal of Molecular Liquids. Segundo os autores, esse conhecimento abre possibilidades para novos estudos com potencial aplicação.
"Em tese podemos imaginar dispositivos desse tipo acoplados na exaustão de sistemas em que há combustão, como indústrias e veículos, ou aplicados na separação/purificação de gases de interesse. Neste último caso, mais estudos devem ser feitos com relação à seletividade perante a mistura gasosa em questão”, diz Rafael Guimarães Pereira, que desenvolveu a pesquisa durante seu doutorado na Unifesp, com orientação do professor Leonardo J. A. Siqueira, membro do CINE – um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído por FAPESP e Shell e sediado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Além de Unifesp e Unicamp, o CINE conta com a participação de cientistas do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), da Universidade Federal do ABC (UFABC), do Centro de Tecnologia da Informação (CTI) Renato Archer e da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
O artigo Understanding CO2 absorption by an ammonium-based ionic liquid confined in porous carbon material under applied voltagepode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0167732222017664?via%3Dihub.
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- 07/03/2023 - Processo desenvolvido em CPE da FAPESP produz amônia com alta eficiência energéticaProdução anual de NH3, principal molécula sintetizada no mundo, atinge 1,2 milhão de toneladas; viabilização de uso em células a combustível vai incrementar a demanda
Produção anual de NH3, principal molécula sintetizada no mundo, atinge 1,2 milhão de toneladas; viabilização de uso em células a combustível vai incrementar a demanda
Ricardo Munhoz
Um novo processo descrito na revista Electrochemistry Communications transforma nitrogênio e hidrogênio em amônia (NH3) à temperatura e pressão ambientes com alta eficiência energética. A amônia é a principal molécula sintetizada no mundo, empregada nos mais diversos ramos da cadeia produtiva. Além disso, também cumpre um papel importante na economia do hidrogênio, por ser facilmente revertida em nitrogênio e hidrogênio. Por ano é produzido aproximadamente 1,2 milhão de toneladas do composto químico.
Em função do interesse crescente em rotas para descarbonização, pesquisadores recentemente voltaram sua atenção para o uso de amônia em células a combustível, que são células eletroquímicas ou galvânicas capazes de gerar energia elétrica através de reações químicas específicas, como a reação de redução do nitrogênio (NRR).Os grupos que estudam a eletroquímica da NRR perseguem dois objetivos principais: a produção de um insumo importante para a indústria e potencial combustível do futuro e o armazenamento do hidrogênio em uma molécula – a amônia – que pode ser facilmente diluída em água e transportada de forma mais segura e barata que o próprio hidrogênio. Assim, se as iniciativas de pesquisa em células a combustível de amônia forem bem-sucedidas, a demanda global pelo composto vai aumentar ainda mais.Com a utilização de um reator eletroquímico, o grupo de pesquisa, apoiado pela FAPESP, supera a forma tradicional de produção industrial, conhecida como "processo de Haber-Bosch” – um processo térmico que acaba liberando para o ambiente grandes quantidades de calor."Em nosso reator, o processo ocorre pela interação de elétrons e núcleos, o que dissipa muito menos energia”, explica Rodrigo Fernando Brambilla de Souza, coautor do artigo e bolsista do Centro de Inovação em Novas Energias (CINE), um dos Centros de Pesquisa em Engenharia (CPEs) da FAPESP, lançado em maio de 2018 pela agência de fomento paulista em parceria com a Shell Brasil, a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).Já há esforços de grupos de pesquisa para produzir a amônia em condições amenas, mas os processos eletroquímicos convencionais utilizam eletrólitos líquidos, que, apesar de eficientes para a síntese de amônia, exigem uma etapa de purificação do gás do eletrólito. "O nosso processo, por se basear no uso de um eletrólito polimérico, sólido, transporta o hidrogênio oxidado, ou seja, prótons, para que se liguem quimicamente a moléculas de nitrogênio adsorvido no catalisador de cobre, produzindo a amônia que sai na forma de gás e eliminando a necessidade de uma etapa de purificação para remover o eletrólito”, diz Souza. Adsorção é a fixação (adesão) a uma superfície sólida (adsorvente) de moléculas de um fluido (adsorvido)."Outra vantagem é que o reator opera em fluxo contínuo. O nitrogênio e hidrogênio são entregues aos eletrodos e a amônia produzida sai continuamente”, complementa Souza, doutor em química pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e pós-doutorando no Ipen. "O artigo mostra resultados em condições reais de operação em um reator diferente de estudos eletroquímicos fundamentais que nem sempre representam resultados reais”, complementa Almir Oliveira Neto, doutor em físico-química pela USP com pós-doutorado no Ipen. "É importante salientar também que a amônia obtida em nosso estudo é pura, enquanto em outras experiências há impurezas.”Além de Souza e Oliveira Neto, o estudo é assinado por Victoria Maia, Camila Santos, Nathália Azeredo e Priscilla Zambiazi, do Ipen, e por Ermete Antolini, da Scuola Scienza Materiali (Gênova, Itália).O artigo Conversion of nitrogen to ammonia using a Cu/C electrocatalyst in a polymeric electrolyte reactor pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1388248122002235.
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- 06/03/2023 - Professor da UFRJ defende a conclusão do Reator Multipropósito e recursos para formação de pessoas no setor nuclearFonte: Petronotícias
O Petronotícias inicia o noticiário desta semana falando sobre o futuro do setor nuclear brasileiro. Além da tão aguardada conclusão das obras de Angra 3, o Brasil precisa endereçar o início da construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB). Esses são alguns dos projetos prioritários do segmento, segundo avalia o professor do Departamento de Engenharia Nuclear da Escola Politécnica da UFRJ, Aquilino Senra. "O RMB foi tratado com muito descaso pelos governos anteriores. É algo incompreensível, já que se trata de um projeto socialmente aceito. Todos concordam sobre a importância do uso da energia nuclear na medicina”, disse. "A finalização de Angra 3 é fundamental por conta do investimento já realizado e da demanda brasileira por energia a partir do momento em que a economia começar a deslanchar”, acrescentou. Senra ressalta ainda a importância de robustecer a formação de profissionais para o setor nuclear, por meio do fortalecimento dos cursos de graduação e pós-graduação de engenharia nuclear nas universidades brasileiras. "Hoje, quem está trabalhando no setor nuclear, passou por um banco das universidades federais. Por isso, o que devemos fazer no futuro é garantir um incentivo para esses cursos. Se não houver formação de recursos humanos em engenharia nuclear, não haverá Programa Nuclear Brasileiro”. Por fim, o professor alerta também para a necessidade de destinar recursos para os institutos de pesquisa da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN): "Na última década, a maioria dos institutos teve uma redução de mais de 40% em seus quadros. Isso é insustentável”.
Ao seu ver, quais são as principais prioridades do setor nuclear brasileiro atualmente?O Brasil tem como prioridade máxima, pelo menos, cinco atividades que já estão mais do que amadurecidas e que já deveriam ter sido concluídas. A primeira delas é a conclusão da usina Angra 3. A finalização desse projeto é fundamental por conta do investimento já realizado e da demanda brasileira por energia a partir do momento em que a economia começar a deslanchar.
A segunda atividade principal é o início da construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB). Esse empreendimento é essencial para a medicina nuclear do país, cuja demanda cresce ano a ano. O terceiro ponto é a conclusão do protótipo em terra do reator nuclear para propulsão naval (LABGENE), porque é um projeto importante para a defesa do nosso vasto e rico litoral.
O quarto item é a recuperação dos quadros de docentes e técnicos-administrativos nas universidades que formam o pessoal para o setor nuclear brasileiro. É como costumo dizer: se não houver milho, não haverá pipoca. Ou seja, se o Brasil não formar engenheiros nucleares, não haverá Programa Nuclear Brasileiro. São as universidades – federais, na maioria – as responsáveis por formar esses profissionais.
O último ponto, que também é fundamental, é a formação de profissionais da infraestrutura dos institutos de pesquisa que hoje estão vinculados à CNEN.O Brasil precisa pensar em avançar no setor nuclear. Mas antes de endereçar novas iniciativas dentro do segmento, o país deve concluir essas cinco atividades.
O RMB, citado pelo senhor, é um projeto muito importante para o país, mas que está parado há muitos anos. Como avalia esse cenário?
O Reator Multipropósito Brasileiro foi tratado com muito descaso pelos governos anteriores. É algo incompreensível, já que se trata de um projeto socialmente aceito. Todos concordam sobre a importância do uso da energia nuclear na medicina. Há uma aceitação pública da energia nuclear para fins de aplicação na medicina.
O RMB foi concebido com a finalidade específica de produzir os radioisótopos e, além do mais, fazer ensaios de materiais necessários para o avanço da tecnologia nuclear. O projeto começou em 2009 e até hoje não conseguiu avançar. O antigo coordenador do projeto, José Augusto Perrotta, que é um dos técnicos mais bem preparados e um dos profissionais que eu mais admiro, decidiu aposentar-se, porque não recebeu apoio nos últimos anos. Isso não está certo. Então, eu acredito que o RMB deveria ser prioridade zero a partir de agora.
Poderia nos dizer quais são, ao seu ver, as medidas necessárias para destravar os projetos do RMB e de Angra 3?
Para o RMB, é preciso ter recursos específicos destinados do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Além disso, o Ministério da Saúde, que tem o maior orçamento da União, pode destinar uma pequena parcela na sua previsão de recursos para investir no RMB. Isso já daria uma garantia anual de recursos para a conclusão do reator. É preciso ter vontade de fazer. A medicina nuclear não pode ficar exclusiva para aqueles que têm planos de saúde. Ela tem que ser colocada nos SUS para toda a população. O Ministério da Saúde terá um benefício quando o RMB entrar em operação.
Para Angra 3, é necessário discutir a questão do financiamento que está sendo tratada no BNDES. Há uma declaração do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, de fortalecer o desenvolvimento nacional em diversos setores. Então, acredito que com boa relação com o BNDES, é possível acelerar os recursos para acelerar essa obra.
O senhor também poderia falar um pouco mais sobre a importância de recuperar os institutos de pesquisa da CNEN?
Essa medida é necessária para recuperar a capacidade tecnológica do país. A maior parte daquilo que foi desenvolvido em tecnologia nuclear no Brasil foi realizado nos institutos da CNEN (IPEN, CDTN, IEN). Para o país ter a capacidade de desenvolver novas tecnologias, é preciso fortalecer os institutos. Uma informação preocupante: na última década, a maioria dos institutos teve uma redução de mais de 40% em seus quadros. Isso é insustentável.
Como está a gestão do conhecimento do setor nuclear no país?
Os recursos humanos são necessários para a manutenção da tecnologia nuclear no país. O novo Programa Nuclear Brasileiro, que foi editado por meio do decreto 9.600de 2018, explicita que deve ser dado incentivo e fomento à formação continuada de recursos humanos necessários para o desenvolvimento do setor. Mas, a realidade é que o incentivo atual é zero. As universidades federais, com esforço próprio, abriram sete cursos em nível de pós-graduação e um em nível de graduação. Sem nenhum apoio específico para isso.
As universidades formam profissionais de boa qualidade. Não sou apenas eu quem diz isso, porque senão pareceria defender em causa própria, mas é o mercado que confirma a qualidade dos alunos formados. Nós formamos pessoas de qualidade, que vão para universidades estrangeiras e também para universidades estrangeiras.
Hoje, quem está trabalhando no setor nuclear, passou por um banco das universidades federais. Por isso, oque devemos fazer no futuro, é garantir um incentivo para esses cursos. Senão houver formação de recursos humanos em engenharia nuclear, não haverá Programa Nuclear Brasileiro.
De que forma o país poderia incentivar a formação de novos profissionais para o setor nuclear?
O primeiro passo é fortalecer os cursos existentes, que hoje não recebem um tratamento específico, contam com um corpo docente reduzido e possuem baixíssimos recursos de custeio e infraestrutura. Desafio alguém a dizer-me onde está sendo cumprido o que está previsto no Decreto 9600/2018 em relação à formação de recursos humanos. Então, o primeiro passo é o fortalecimento dos cursos de pós-graduação e graduação em Engenharia Nuclear como uma política.
Em segundo lugar, é preciso também criarbolsas específicas diferenciadas, devido ao caráter estratégico do setor nuclear. E, por fim, o desenvolvimento de um programa de contratação de médio prazo.
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- 04/03/2023 - Diretora do IPEN fala com exclusividade sobre os desafios no governo Lula. Ela também enfrentou preconceito e machismoNatural de Campina Grande, na Paraíba, a engenheira química Isolda Costa está na direção do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), em São Paulo, administrando os mais diversos campos da ciência e tecnologia. da produção de radioisótopos (medicamentos para diagnósticos e tratamento contra o câncer), a quantidade e procedência de rejeitos radioativos (fato inédito revelado ao blog) e enriquecimento de urânio, parceria com a Marinha; até novos projetos para 2024, com apoio da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), como a Despoluição dos Oceanos por Microplásticos, como tema principal no Meio Ambiente. Aqui, Isolda conta como divide o comando com Wilson Calvo, que tentaram afastar no governo Bolsonaro; revela a impressionante queda no número de funcionários do sexagenário IPEN, um dos mais importantes da América Latina; enfatiza a sua esperança no governo do presidente Lula, com a ministra Luciana Santos no comando do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação; e fala também sobre preconceitos e machismo, sobretudo porque estamos no mês Internacional das mulheres. Eis a entrevista:
Natural de Campina Grande, na Paraíba, a engenheira química Isolda Costa está na direção do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), em São Paulo, administrando os mais diversos campos da ciência e tecnologia. da produção de radioisótopos (medicamentos para diagnósticos e tratamento contra o câncer), a quantidade e procedência de rejeitos radioativos (fato inédito revelado ao blog) e enriquecimento de urânio, parceria com a Marinha; até novos projetos para 2024, com apoio da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), como a Despoluição dos Oceanos por Microplásticos, como tema principal no Meio Ambiente. Aqui, Isolda conta como divide o comando com Wilson Calvo, que tentaram afastar no governo Bolsonaro; revela a impressionante queda no número de funcionários do sexagenário IPEN, um dos mais importantes da América Latina; enfatiza a sua esperança no governo do presidente Lula, com a ministra Luciana Santos no comando do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação; e fala também sobre preconceitos e machismo, sobretudo porque estamos no mês Internacional das mulheres. Eis a entrevista:
Fonte: Blog Tânia Malheiros
BLOG: Qual a importância do acordo que acaba de ser assinado entre o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) e a Indústria Nucleares do Brasil (INB)?
ISOLDA COSTA: O Brasil desenvolveu vários projetos na área nuclear e continua avançando no domínio de várias tecnologias que fazem o seu uso pacífico. O Brasil já dominou a tecnologia de enriquecimento isotópico de urânio, o que se tornou um patrimônio do país, o que, juntamente ao fato de deter umas das 10 maiores reservas de urânio do mundo, o coloca em um seleto grupo de países que possuem estas características. O INB e o IPEN possuem longa história de cooperação em diversos projetos de desenvolvimento das tecnologias nucleares. Estas duas instituições detêm conhecimentos tecnológicos que são complementares para a produção de urânio metálico enriquecido, o que é fundamental para a produção de combustíveis nucleares para reatores de pesquisa. O acordo de parceria entre IPEN e INB viabilizará desenvolvimentos científicos e tecnológicos na área Nuclear do país. Permitirá assegurar a produção de materiais nucleares especiais, melhorar os processos de fabricação de combustíveis, além de capacitar profissionais quanto à integridade dos elementos combustíveis, e o aprimoramento no controle de rejeitos radioativos no setor de fabricação de elementos combustíveis nucleares. Além disso, apoiará o projeto de construção do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB).
BLOG: E os resultados?
ISOLDA:O desenvolvimento destes projetos resultará em domínio de novas tecnologias extremamente importantes para o desenvolvimento e autonomia do setor nuclear do país, principalmente na fabricação de componentes altamente qualificados para a indústria nuclear. Inicialmente, as áreas de cooperação mútua que serão destacadas são: (1) aprimoramento e ampliação do processo de produção do urânio metálico, (2) desenvolvimento de tecnologias para melhoria do processo de fabricação de pó e pastilhas de dióxido de urânio, (3) pesquisa aplicada e capacitação profissional na área de corrosão em revestimentos e nas áreas de solda de varetas combustíveis e/ou estruturas de elementos combustíveis, e (4) aplicação de tecnologia e inovação na análise e controle de rejeitos radioativos no âmbito da fabricação do elemento combustível nuclear. Os recursos envolvidos neste acordo serão provenientes de ambas as instituições envolvidas, IPEN, pelo uso da sua infraestrutura e de recursos humanos altamente qualificados, e a INB, com recursos financeiros de seus orçamentos destinados à inovação e desenvolvimento tecnológico.
BLOG: Em 2022, a senhora passou a atuar como diretora substituta do IPEN, função que ocupa até hoje. Como analisa o afastamento do seu antecessor, Dr. Wilson Calvo, naquele momento? Foi injustiçado?
ISOLDA: A exoneração do meu antecessor do cargo de Diretor do IPEN, Dr. Wilson Calvo, não ocorreu segundo o rito do processo de afastamento de um Diretor/Superintendente descrito no Convênio estabelecido entre o IPEN e a USP e com validade até 2037. Segundo o rito, o Diretor/Superintendente só pode ser afastado após análise pelo Conselho Superior do IPEN composto por dois representantes da CNEN, dois representantes da USP, um representante da FIESP, e u da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo (hoje estamos subordinados à Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo, cujo secretário é o Dr. Vahan Agopyan). Apenas após a análise (período em que o Diretor/Superintendente ficaria afastado temporariamente) e aprovação pelo Conselho, o afastamento definitivo poderia acontecer. Isso não ocorreu, bem como não foi explicitada a motivação da exoneração do Dr. Calvo, apesar de consultas terem sido feitas. O processo ficou em sigilo. O Dr. Calvo continuou no cargo de Superintendente, desde então, pois a exoneração deste cargo se dá apenas pelo Estado de São Paulo, o que não ocorreu. Pela primeira vez na história do IPEN temos duas pessoas ocupando os cargos de Superintendente e a Diretoria. Antes sempre a mesma pessoa ocupava os dois cargos. Esperamos que neste novo governo, o equilíbrio entre as instituições partícipes do Convênio seja restabelecido e este seja respeitado.
BLOG: Como tem dirigido o IPEN desde aquele momento? São muitos os desafios? Quais os mais difíceis?
ISOLDA: Temos dirigido o IPEN desde aquele momento com a colaboração e apoio do Superintendente. No momento de sua exoneração ele estava iniciando o sexto ano de sua gestão, pois havia sido reconduzido ao cargo após quatro anos na Direção do IPEN, após ter passado pelo rito de escolha pelo Conselho Superior. Este rito é regulado pelo convênio vigente que estabelece para o processo de escolha a formação de uma lista tríplice a qual é avalizada pelo presidente da CNEN, pelo reitor da USP, e, finalmente, a escolha é feita pelo governador do Estado de São Paulo. Este geralmente opta pelo primeiro colocado na lista tríplice. A formação da lista tríplice se dá pela apresentação da proposta do plano de gestão para o período de quatro anos ao Conselho Superior que em seguida sabatina o candidato e finalmente os classifica em uma lista tríplice. Eu passei por todo este processo tendo sido a segunda colocada na lista, enquanto o Dr. Calvo ficou como primeiro colocado. Uma vez que na ocasião da exoneração eu era a substituta do Diretor, quando esta ocorreu assumi o cargo de Diretora Substituta, no qual me encontro até hoje.
BLOG: Tem apoio? Recursos?
ISOLDA: Sim. Além do apoio do Superintendente, tive e tenho tido grande apoio do Conselho Técnico Administrativo (CTA) do IPEN, dos servidores em geral, os quais, apesar de não concordarem com a exoneração do diretor, ofereceram o suporte necessário para que a instituição continuasse operando normalmente e sem grandes sobressaltos. Os desafios na gestão do IPEN são muitos em tempos de escassos recursos para a Ciência e Tecnologia no país. Estes têm sido enfrentados com a dedicação dos servidores que "vestem a camisa” da instituição, mas cada vez mais em menor número. O IPEN conta com um número insuficiente de servidores para o tamanho das responsabilidades e funções que deve e poderia realizar. Sem dúvida, o principal e mais difícil desafio do IPEN são os recursos humanos escassos na instituição e que diminuem rapidamente devido ao grande número de aposentadorias nos últimos anos sem reposição. Este é um desafio que esperamos ver sendo enfrentado pelo novo Governo.
BLOG - Como o IPEN está atuando desde a aprovação da PEC que abriu caminho para a produção de radiofármacos pela iniciativa privada? E como analisa a questão tão combatida por autoridades, como o atual ministro Alexandre Padilha?
ISOLDA- O IPEN vem atuando de forma regular e rotineira desde a aprovação da PEC mas muito preocupado com o futuro da instituição a partir da instalação de radiofarmácias no país com Boas Práticas de Fabricação. Vale ressaltar que a continuidade da produção da Radiofarmácia do IPEN, apesar de todas as dificuldades existentes e crescentes, é um verdadeiro milagre que só se dá pelo amor e dedicação dos seus funcionários que assumem as suas funções como uma verdadeira missão. A quebra do monopólio não seria um problema para o IPEN e, digo que também para o país, se as condições necessárias para a modernização da Radiofarmácia do IPEN estivessem dadas e a modernização concluída. O IPEN não teme a concorrência, mas sim a falta de condições para concorrer na área de produção de radiofármacos. Tendo os recursos financeiros e humanos que possibilitem a modernização rápida e imediata da Radiofarmácia, estaríamos prontos para concorrer em condições de igualdade.
BLOG: É complicada a questão dos recursos...
ISOLDA: Precisamos de investimentos na forma de recursos financeiros e humanos para que a quebra do monopólio, que ocorreu de forma muito rápida e sem discussão com a sociedade, em suas diversas representações, não resulte em impacto aos pacientes, principalmente os do SUS. O atual ministro, e então deputado, Alexandre Padilha batalhou bravamente na Comissão, juntamente com a deputada Jandira Feghali e o deputado Jorge Solla, todos médicos e conhecedores das implicações da quebra do monopólio para a população carente e o SUS. O deputado Ivan Valente foi também um combativo defensor da manutenção pelo Estado do monopólio da produção dos radiofármacos de meia vida longa. Diferentemente do que se propaga que a entrada da iniciativa privada na produção de radiofármacos deve causar redução nos preços dos radiofármacos, o custo do principal radiofármaco produzido pelo IPEN a partir da importação de insumos, ou seja, o gerador de tecnécio, é um terço do oferecido pela iniciativa privada. Este produto é fornecido aos hospitais públicos e privados. São cerca de 450 clínicas e hospitais atendidos no país e cerca de dois milhões de procedimentos (diagnóstico e terapia) por ano. A quebra do monopólio deve resultar em custos muito elevados dos tratamentos de radioterapia os quais inviabilizariam o atendimento de parte da população carente. O ministro Alexandre Padilha conhece bem esta situação havendo já sido ministro da Saúde no governo Dilma Roussef e secretário municipal da Saúde de Fernando Haddad. Vale lembrar implicações de quebra do monopólio estatal como a ocorrida na produção de insulinas no país que resultou no desabastecimento do mercado pelo setor privado.
BLOG : O IPEN continua produzindo, importando os insumos? Qual o investimento nesta área? Qual a sua opinião sobre a demora na construção do RMB?
ISOLDA: O IPEN continua produzindo e importando os insumos para produção de radiofármacos e assim deve continuar enquanto não for solicitada a interrupção da produção pela ANVISA. Isto pode ocorrer caso uma empresa privada, instalada e com a BPF para a produção dos radiofármacos solicite à ANVISA esta interrupção. Os investimentos para a modernização da Radiofarmácia no IPEN ao longo dos últimos anos foram insuficientes para que este processo ocorresse a tempo de estarmos com a BPF já por ocasião da quebra do monopólio na produção de radiofármacos de meia vida longa. Há necessidade de se aumentar os investimentos nesta direção e de acelerar este processo de modernização para que possamos estar aptos a continuar produzindo e atendendo a população brasileira. A demora na construção do RMB se deu por falta de priorização deste projeto nos últimos seis anos. Já devíamos estar com o reator construído e em operação se tivéssemos seguido os planos iniciais. Temos o terreno, em parte (40%) doado pelo Estado de São Paulo na gestão do então governador Geraldo Alckmin, e parte (60%) doado pela Marinha do Brasil. Temos todos os projetos prontos, autorizações ambientais e da Comissão Nacional de Energia Nuclear para o início das obras do RMB. Caso o investimento necessário seja feito, o RMB poderá ser concluído em quatro anos. Temos observado pelas manifestações da nova ministra do MCTI, Luciana Santos, em seus pronunciamentos e manifestações nas mídias, que o RMB é uma prioridade e um dos projetos estratégicos de sua gestão, o que tem encontrado eco nas declarações do novo Presidente do CNPq, Prof. Ricardo Galvão. Portanto, temos muita esperança que ele saia do papel nestes próximos anos e seja uma realização do novo governo.
BLOG - Como sobrevive o IPEN?
ISOLDA: O IPEN sobrevive hoje com recursos orçamentários do Governo Federal que são destinados à CNEN e suas Unidades Técnico Científicas (UTCs). O valor do orçamento provisionado para o IPEN-CNEN variou nos últimos anos entre R$ 174 milhões (2020) e R$ 203 milhões (2022). Em 2022 contamos muito com a ajuda do Ministro da Ciência e Tecnologia à época, Paulo Alvim, para o aumento ocorrido nos recursos. É importante ressaltar que o IPEN gera recursos (receita arrecadada) da ordem de R$ 100 milhões com a venda dos radiofármacos, recursos estes que são devolvidos à União e desde 2017 não houve aumento nos preços dos radiofármacos fornecidos pelo IPEN. O IPEN sobrevive também com recursos de grandes projetos institucionais de agências de fomento, principalmente nos últimos seis anos.
BLOG: Exemplo?
ISOLDA: Como exemplo, temos um projeto com recursos de cerca de R$ 17 milhões em Nanotecnologia apoiado pela FAPESP cujo principal beneficiário é a Radiofarmácia, e um outro projeto financiado pela FINEP com recursos de R$ 16 milhões para equipamentos multiusuários. É fundamental que um novo modelo de gestão seja pensado e implementado para o IPEN pelo novo governo para que a instituição possa ter vida longa e continuar dando sua contribuição tão essencial para o bem estar da sociedade brasileira. Vale ressaltar que aproximadamente 85% de todos os radiofármacos utilizados para exames e tratamentos no Brasil são produzidos no IPEN.
BLOG: – Quais os principais projetos futuros? O que acha que o novo governo, do presidente Lula, através da ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, pode promover de melhor para a pesquisa, a ciência, no IPEN?
ISOLDA: Muitos dos principais projetos em andamento hoje, e a serem iniciados em futuro próximo no IPEN, são na área da Saúde. Estamos trabalhando para a melhoria da infraestrutura laboratorial para pesquisas nesta área. Em breve iniciaremos um projeto coordenado pelo IPEN já aprovado pela FAPESP e em parceria com a iniciativa privada (CMR do Brasil) que foi submetido ao Edital do Programa Ciência para o Desenvolvimento. Este projeto é intitulado "Programa multicêntrico utilizando radioligantes de PSMA para o diagnóstico e terapia de pacientes com câncer de próstata” e conta com a participação do Hospital de Câncer de Barretos, da Faculdade de Medicina da USP, do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), do Hospital das Clínicas da Unicamp e da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP.
BLOG: E com o setor privado?
ISOLDA: Sim. Além desse, temos vários projetos de inovação em desenvolvimento em parceria com o setor privado que têm como temas principais de pesquisa: Meio Ambiente, Nuclear, Energia e Indústria. Temos vários projetos em andamento que têm como objetivo o desenvolvimento de tecnologia de células a combustível e hidrogênio verde. Estes são sistemas energéticos eficientes e de baixo impacto ambiental. Um dos projetos com início programado para 2024 será apoiado pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e tem como tema principal o Meio Ambiente e visa a despoluição dos Oceanos por microplásticos por meio do uso de tecnologias nucleares. O IPEN tem também uma longa história de pesquisa em Materiais e na área de Lasers e suas Aplicações. Temos muitas expectativas positivas com relação ao novo governo.
BLOG: Acredita em novos investimentos?
ISOLDA: Acreditamos que haverá aumento nos investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação na gestão da ministra Luciana Santos com a recomposição dos recursos do FNDCT e o reajuste das bolsas de graduação e pós graduação. Retomaremos o caminho do qual nunca deveríamos ter nos afastado. Estamos muito esperançosos que as pesquisas na área Nuclear serão uma prioridade neste governo. É fundamental que haja recomposição dos recursos humanos perdidos ao longo dos últimos anos. Grande parte dos servidores que adquiriram suas expertises ao longo de anos de trabalho estão prontos para fazerem a transmissão destes conhecimentos, mas à espera da chegada dos novos para que o processo ocorra.
BLOG: Boas expectativas agora?
ISOLDA: Essa é a esperança que nos une como servidores do IPEN e sonho que esperamos ver concretizado neste governo. Acreditamos que a ministra Luciana Santos tem a mesma expectativa que temos e valorizará o nosso potencial de recursos humanos altamente qualificados para que fiquem no país e tenhamos o reconhecimento internacional em várias áreas do conhecimento.
BLOG: A quantas anda a pesquisa do IPEN para o enriquecimento de urânio?
ISOLDA: O IPEN continua colaborando em pesquisas em parceria com a Marinha do Brasil no desenvolvimento de ultracentrífugas para enriquecimento de urânio. Além disso, o IPEN também realiza pesquisas no desenvolvimento de novas ligas e elementos combustíveis para reatores de pesquisa.
BLOG: O IPEN ainda armazena material radioativo? Qual a quantidade, procedência?
ISOLDA: O IPEN recebe e armazena rejeitos radioativos que são materiais que não têm previsão de uso. São obrigações da Instituição: receber, tratar, acondicionar e armazenar. O material descartado como rejeito no Estado de São Paulo em resultado de aplicações médicas, industriais, pesquisa, etc. deve ser recebido pelo IPEN. O IPEN recebe também rejeitos de outros estados (Rio Grande do Sul, Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul), principalmente dos mais vizinhos, por questão de logística. A situação atual dos depósitos intermediários de rejeitos no IPEN em volume armazenado é de 545 metros cúbicos.
BLOG: O IPEN tem quantos funcionários? É suficiente?
ISOLDA: O IPEN tem hoje 540 funcionários. Não é suficiente. No início dos anos 90 o IPEN contava com cerca de 1400 servidores. Entre 1990 e 2020 perdemos 784 servidores, ou seja, mais da metade de seu quadro, sem reposição. Em 2022 tivemos mais 40 aposentadorias, além dos óbitos que foram seis. Temos hoje 60% dos servidores na ativa em condições de aposentadoria imediata, o que, caso ocorra, inviabiliza o funcionamento da instituição. É urgente que este desafio seja enfrentado pelo novo Governo.
BLOG: Estudantes de engenharia nuclear da UFRJ, por exemplo, estão deixando o Brasil para estudar nos EUA, porque a oferta é irrecusável. Estamos perdendo mão de obra para o exterior. O que acha disso?
ISOLDA: Os concursos praticamente não existem. Qual a sua avaliação? A saída de recursos humanos para o exterior é uma lástima. O custo para a formação de um profissional bem qualificado no país é muito alto e estamos perdendo estas pessoas para o exterior por não serem valorizadas aqui. As bolsas para os estudantes de pós-graduação e iniciação científica estão sem reajuste há muitos anos. Os recursos para as pesquisas são muito escassos, a infraestrutura laboratorial em várias universidades e institutos de pesquisa necessita maiores investimentos para ser equiparada aos centros de referência mundial, e tudo isto faz com que os novos pesquisadores se sintam desestimulados a desenvolverem suas carreiras no país. E assim perdemos profissionais de alta qualidade para países que não investiram nenhum recurso na formação deles. É uma perda muito grande. Temos que trazer de volta para esta nova geração o sonho e a confiança de que é possível a realização de pesquisas de alto nível no Brasil. É importante que os pesquisadores do país se sintam valorizados para que desejem permanecer no país. Estimulados e valorizados, acreditamos que nossos recursos humanos bem formados queiram ficar e dar sua contribuição para o desenvolvimento do país. Esta valorização passa pela recuperação do valor das bolsas de pesquisa, já anunciada, pelo aumento nos recursos para atualização de infraestrutura laboratorial, e aumento no valor dos recursos destinados à pesquisa, em geral.
BLOG: A senhora possui 229 publicações em periódicos com política de avaliação por pares. Orientou 24 mestrados e 22 doutorados. Os principais temas de pesquisa são Corrosão, Biomateriais, Tratamentos de Superfície. Com este potente curriculum, se sente valorizada?
ISOLDA: Nos últimos anos tenho assumido cargos de direção na instituição e acredito que estes vieram em função do meu curriculum. O meu antecessor, Dr. Marcelo Linardi, que é o pesquisador responsável por me trazer para atuar na Administração, valoriza o desempenho do pesquisador nas suas diversas áreas, como ensino, desempenho acadêmico (publicações e participações em eventos) e coordenação de projetos de grandes Agências de Fomento (aprovação, gestão e resultados), o que se reflete no curriculum.
BLOG: Quais as suas sugestões para o Governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesta área?
ISOLDA: Minhas sugestões são para que o investimento na contratação de pessoal na área Nuclear ocorra com a maior brevidade possível de forma que a transferência do conhecimento possa ocorrer antes da aposentadoria dos nossos reduzidos recursos humanos que representam a expertise atingida ao longo de décadas. Que o governo estabeleça como prioridade projetos de desenvolvimento científico que resultem em autonomia nacional em tecnologia e que nos permita atravessar períodos de crise, como ocorreu com a pandemia da Covid 19, sem grandes sobressaltos.
BLOG: Conte um pouco a sua história: origem, por que o interesse na área química e nuclear; por ser mulher, ingressando no IPEN em 1982, sofreu algum tipo de preconceito ou machismo entre tantos (a maioria) profissionais do gênero masculino?
ISOLDA: Sou natural de Campina Grande, Paraíba, de onde saí aos dois anos de idade indo morar em Recife até os oito anos. Morei em seguida em Belém, depois Manaus e aos 13 anos mudei para São Paulo, onde concluí o Curso Fundamental, cursei o Ensino Médio e a Universidade (Engenharia Química) na Unicamp. Logo após concluída a graduação ao final de 1981, iniciei o mestrado no IPEN em 1982, tendo escolhido o tema Corrosão de ligas de zircônio, e, em 1984 fui contratada para trabalhar na Metalurgia, hoje Centro de Ciência e Tecnologia de Materiais (CECTM). Em 2018 fui convidada a gerenciar a Internacionalização do IPEN e em 2019 passei a ser a Coordenadora de Pesquisas, Desenvolvimento e Ensino (COPDE) do IPEN, cargo que mantive juntamente com o Diretora Substituta do IPEN, a partir de 2022. Venho de uma família que tem a educação como um valor e que sempre estimulou a leitura, desde cedo. As escolhas pelas áreas química e depois nuclear foram oportunidades que surgiram no momento e que foram aproveitadas, mas não foram planejadas nem sonhadas.
BLOG: Estamos no mês de muitas homenagens às mulheres. Daí, reiteramos, e o machismo?
ISOLDA: Sendo mulher e ingressando no IPEN em 1982, naturalmente experimentei situações de preconceito e machismo, por vezes, expressos de forma sutil, e outras de forma mais explícita. Porém, estes comportamentos são desestimulados na instituição. Espero que as mulheres se sintam encorajadas a não normalizarem estes comportamentos, principalmente pelo fato de haver uma mulher na Direção. Sou casada com um pesquisador do IPEN que conheci durante o período de desenvolvimento do mestrado, em 1982. Temos dois filhos, uma advogada e um engenheiro elétrico, ambos formados na Universidade de São Paulo que atualmente trabalham e cursam mestrado na USP.
BLOG: Planos para o futuro?
ISOLDA: Meus planos para o futuro mais imediato são o de criar uma Central de Análises no IPEN com os equipamentos de caracterização mais atuais com a finalidade de apoiar os trabalhos de pesquisas de nossos pesquisadores e da comunidade. Pensando em um futuro menos imediato, meus planos são o de deixar sucessores bem formados para assumirem a responsabilidade de coordenar os laboratórios e trabalhos de pesquisas que são estruturantes para a instituição. De forma geral, contribuir para que o IPEN continue sendo uma referência, nacional e internacional, na área Nuclear e que possa atravessar sem sobressaltos os tempos difíceis.
BLOG: Como se define?
ISOLDA:Sou uma pessoa determinada e muito pragmática.
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- 03/03/2023 - Brasil tem oportunidade de se tornar um grande exportador de combustível nuclear do futuroFonte: Petronotícias
Esquenta o segmento de produtos gerados pela energia nuclear. O mercado internacional deixou de ser apenas o de geração de energia. O foco mudou e vai ampliando-se. Cresceu muito a procura pela medicina nuclear. Não só os radiofármacos, mas a alta tecnologia dos equipamentos para tratamento e diagnósticos. A busca pela conservação de alimentos e também pelos combustíveis de fonte nuclear. E neste particular, o Brasil está diante de uma grande oportunidade no setor internacional, se tiver agilidade para criar condições de ser um produtor e exportador do combustível nuclear do futuro, o HALEU. Tradicionalmente, o combustível para os reatores de pesquisa e os alvos para uso na produção de radioisótopos são fabricados com urânio altamente enriquecido (High Enriched Uranium – HEU), isto é, acima de 20% no teor (assay) do isótopo 235. Esse material vem sendo fornecido principalmente pelos Estados Unidos e Rússia a partir do excedente militar, sob o Tratado de Não Proliferação (salvaguardas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), e também poderá ser feito por uma empresa privada canadense.
Com o tempo, o fornecimento e o uso de HEU se tornaram sujeitos a restrições políticas e legais adicionais e nenhum novo HEU vem sendo produzido. Esses fatores haleu tornam incertos os futuros suprimentos. Em apoio à não proliferação, a maioria dos Estados Membros da AIEA está comprometida com o objetivo de converter o combustível dos reatores de pesquisa e os alvos para produção de radioisótopos para o HALEU, abaixo de 19,75%. O combustível dos reatores de pesquisa brasileiros, em especial o IEA-R1 do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), maior produtor de radioisótopos do País, já fez com sucesso essa transição para a HALEU. O Petronotícias conversou com um dos maiores especialistas brasileiros no assunto, Leonam Guimarães, ex-presidente da Eletronuclear:
– Como o senhor vê este mercado?
A disponibilidade e acessibilidade a longo prazo do HALEU em forma metálica é uma questão fundamental para garantir a operação contínua de reatores de pesquisa e a produção de radioisótopos de fissão usando o HALEU. Atualmente, o único fornecedor comercial disponível é a Rússia. Essas circunstâncias criam um risco potencial à segurança do abastecimento tanto de combustível como de alvos. Considerações políticas semelhantes às do fornecimento de HEU também podem afetar o fornecimento futuro de HALEU a 19,75%. Se nenhuma ação for tomada, existe o risco de que o fornecimento deste material de importância crítica não possa ser garantido algum tempo após 2030.
– O senhor considera que o país está diante de uma oportunidade de ser protagonista neste mercado?
Tem-se aí uma grande oportunidade para o Brasil, que já produziu bateladas de HALEU para o reator de pesquisa nacional nas instalações de enriquecimento de Aramar, do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) nos primeiros anos da década passada. Mais recentemente, o CTMSP produziu bateladas de HALEU destinados à fabricação do combustível e de alvos para produção de Molibdênio 99, radioisótopo de amplo uso na medicina para o futuro Reator Multipropósito Brasileiro bem como o combustível para o Reator de Pesquisa 19haleu 2 elementos combustível tipo placa fabricados pelo IPEN com urânio nacional também localizado no IPEN. Essa capacitação torna possível que a produção nacional seja uma alternativa para garantir a disponibilidade futura da HALEU para suas próprias necessidades e, eventualmente, também para exportação.
Ainda mais importante, note-se que também estão surgindo vários novos conceitos de combustíveis para pequenos reatores modulares (Small Modular Reactor – SMR quase todos considerando o uso da HALEU. Esse é um tema que foi pesquisado pelo CTMSP e IPEN ao final do século passado Muitos dos novos projetos reatores avançados de potência, além dos reatores de pesquisa, exigirão que o HALEU seja enriquecido de 5 a 20% de U-235, e somente a disponibilidade desse material permitirá sua efetiva implantação.
A ausência de capacidade de produção de HALEU para essas aplicações pode atrasar ou até mesmo impedir totalmente esses novos desenvolvimentos. Como a indústria nuclear irá alimentar a próxima geração de reatores e tecnologias nucleares comerciais avançados é um tópico importante de discussão entre especialistas do setor. Nesse contexto, uma capacidade de produção nacional expandida poderá permitir que o Brasil desempenhe um papel de liderança nesses importantes desenvolvimentos da indústria nuclear mundial.
– A nossa infraestrutura é adequada para este empreendimento?
A fim de garantir um suprimento seguro de HALEU, a atual infraestrutura do ciclo de combustível nuclear destinada aos reatores nucleares comerciais que usam urânio de baixo enriquecimento (Low Enriched Uranium – LEU) a até 6%, que consiste em mineração, beneficiamento, conversão, enriquecimento e fabricação de combustível, precisará ser mais desenvolvida e mais robusta. Dependendo da localização das instalações dessa infraestrutura, meios de transporte associados também precisarão ser desenvolvidos.
No entanto, ao contrário do material necessário para os reatores de pesquisa e alvos para produção de radioisótopos, o investimento industrial necessário em infraestrutura para produção de HALEU para reatores comerciais é substancial, sendo realisticamente possível apenas se houver perspectivas de demanda suficiente e se os preços forem adequados e aceitável para os futuros clientes.
– Qual será a real necessidade do mercado para este combustível?
É muito difícil fazer previsões confiáveis da demanda da HALEU para futuros reatores comerciais com base nas informações atualmente disponíveis. Estão em discussão vários projetos avançados de reatores que envolvem o uso de um nível de enriquecimento de 19,75%. Um fator que afeta se esses projetos serão ou não concretizados será uma nova infraestrutura para garantir o fornecimento da HALEU. Atualmente, não há uma avaliação consolidada das necessidades de HALEU, mas muitos projetos apontam para um futuro que envolve uma demanda crescente de reatores comerciais usando esse tipo de combustível.
– Neste campo, qual será a importância dos Pequenos Reatores no futuro?
O desenvolvimento de pequenas centrais nucleares tem sido de particular interesse nos últimos anos. Esses tipos de reatores SMR tipicamente têm uma saída elétrica de 3 a 100 MWe, mas alguns projetos têm potências mais altas de, até 300 MWe. Os SMRs oferecem benefícios em termos de flexibilidade devido à menor produção de energia elétrica e são atraentes porque os custos de capital por usina são menores. Muitos dos projetos envolvem ciclos de reabastecimento ou núcleos de vida útil muito longos, exigindo maior enriquecimento do material físsil no núcleo.
De acordo com uma avaliação de 2016 da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico / Agência de Energia Nuclear, até 21 GWe de SMRs poderiam ser adicionados até 2035 em um cenário de otimista. Isso representa 3% da total capacidade nuclear instalada global. Esta avaliação não leva em consideração o potencial de desenvolvimento adicional de tecnologias SMR, como atualmente conhecidas e com potencial de realização realista.
- Qual é a base da tecnologia que será usada nesses pequenos reatores?
Os projetos de SMR podem basear?se na tecnologia tradicional de água leve (LWR) ou na tecnologia avançada de reatores (Geração IV), como os reatores de alta temperatura (HTR) ou reatores de sal fundido (MSR) ou reatores rápidos resfriados a chumbo também. Além das SMRs, estão sendo desenvolvidos reatores avançados com alta potência elétrica (> 500 MW) que em alguns casos também usam o HALEU.
Analisando a demanda de combustível, podemos distinguir, grosso modo, o seguinte:
– Pequenos reatores modulares baseados em LWR: usam principalmente UO2 com enriquecimento <5%;
– Pequenos reatores modulares baseados em HTR: usam principalmente HALEU;
– Pequenos reatores modulares baseados em MSR: usam principalmente HALEU;
– Pequenos reatores modulares, refrigerados a sódio ou chumbo: usam principalmente HALEU ou óxidos mistos (MOX);
– Reatores avançados > 300 MWe: estes são principalmente reatores rápidos, refrigerados a sódio ou chumbo e usam combustível MOX ou, emswswswswsd-300x169 alguns casos, HALEU;
– E como está o desenvolvimento desse combustível no mundo?
A demanda por HALEU para uso em tecnologias avançadas está nitidamente se tornando um aspecto interessante do ciclo do combustível nuclear global. Também pode ser interessante para os reatores de água leve atuais, especialmente para desenvolver combustíveis mais seguros, os chamados "combustíveis tolerantes a acidentes.” Provavelmente ainda levará algum tempo até que esses desenvolvimentos resultem em uma demanda significativa por HALEU. Protótipos, no entanto, exigirão volumes menores em um futuro próximo. Se esses programas de LTA forem bem sucedidos, o volume de HALEU necessário para suportar quantidades de recarga para um LWR grande a longo prazo será significativa, de cerca de 40tU/recarrega com 16% de enriquecimento de U-235.
– Há estudos sobre a demanda desse combustível?
O Instituto de Energia Nuclear (NEI) da indústria nuclear dos EUA avaliou a demanda nacional da HALEU em 2018. A NEI pesquisou desenvolvedores de reatores avançados e projetistas de combustível que usam HALEU a fim de identificar suas necessidades anuais até 2030. A demanda anual de menos de 1 tonelada de HALEU em 2018 deverá aumentar para cerca de 185 toneladas de HALEU até 2030 em várias faixas de enriquecimento, que variam de 13 a 19,75%. É claro que esses números devem ser tratados com cautela, mas mostram que a indústria nuclear pode precisar da HALEU no curto prazo para novos desenvolvimentos. Os volumes esperados podem exceder rapidamente as atuais necessidades estabelecidas para reatores de pesquisa e outros fins. -
- 01/03/2023 - Comitiva do IPEN é recepcionada na Prefeitura de Toledo e apresenta tecnologiasFonte: Governo Municipal de Toledo
Uma comitiva do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) participou, nesta terça-feira (28), de um encontro com o prefeito Beto Lunitti, o vice-prefeito Ademar Dorfschmidt e demais integrantes da administração municipal. A recepção aconteceu na Sala de Reuniões do Gabinete do Prefeito e serviu para estreitar relações entre a Prefeitura de Toledo e a instituição de ensino que é vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE) do Governo do Estado de São Paulo, bem como sinalizar possibilidades de parcerias.
Apesar de vinculado ao governo paulista, o IPEN é gerido técnica e administrativamente pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), do Governo Federal. "Estamos impressionados com os índices e os dados de desenvolvimento do município. Participamos de uma reunião e vimos quanta dedicação da comunidade. Nós queremos firmar parcerias para desenvolvimento e aplicação de inovações, em diversas situações, como pesquisas em nanotecnologia. Queremos contribuir com o que for possível”, disse o superintendente do IPEN, Wilson Aparecido Parejo Calvo durante apresentação.
No Paraná, Toledo e Pato Branco foram escolhidas para possíveis convênios voltados ao desenvolvimento de tecnologias que podem ser aplicadas em saúde, no agronegócio, indústrias e demais áreas. "O município de Toledo se sente honrado em recebê-los e temos um olhar importante sobre o nosso agronegócio, em especial na produção animal, mas temos também uma indústria forte e estamos avançando em tecnologias e inovações para as crianças da rede municipal, por meio de programas como o Aluno Conectado, preparando esses estudantes para se apropriarem dos mais de 100 cursos universitários disponibilizados por universidades e faculdades estaduais e federais, com cursos das áreas de exatas, humanas e ciências médicas, públicas e privadas. Possuímos também um grande parque de biociências, o Biopark, um investimento privado, mas que transformará nossa região”, expôs o prefeito Beto Lunitti.
O gestor toledano ainda comentou que a maioria das propostas apresentadas vem ao encontro de necessidades da região e sugeriu novas possibilidades, como apresentação de projetos para mais entidades, entre elas o Programa Oeste em Desenvolvimento, com o intuito de conectar tecnologias disponíveis com as necessidades de Toledo e região. O grupo também teve agendas com empresários, Associação Comercial e Empresarial de Toledo (ACIT) e Biopark.
No encontro estiveram presentes o diretor executivo da Fundação de Desenvolvimento Sustentável, Científico e Tecnológico de Toledo (Funtec) Renato Tratch, o secretário do Agronegócio, Inovação, Turismo e Desenvolvimento Econômico Diego Bonaldo e diretores e servidores municipais ligados ao Gabinete do Prefeito.
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- 28/02/2023 - ACIT recebe membros do Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares – IPEN através de iniciativa do CODETFonte: ACIT
A Associação Comercial e Empresarial de Toledo – ACIT, através do Conselho de Desenvolvimento Econômico de Toledo (Codet) recebeu representantes do IPEN – Instituto de Pesquisas Energéticas Nucleares na terça-feira (28).
A conversa foi conduzida pelo presidente do Codet, Mario Lopes Neto ao lado da presidente da ACIT, Anaide Holzbach e do membro do conselho, Tiago Rockembach, com o objetivo de realizar um intercâmbio de soluções, acelerandoo processo de desenvolvimento tecnológico local e regional.
Com 66 anos, o Ipen possui cinco áreas de atuação: saúde, meio ambiente, indústria, nuclear e energia. Segundo o superintendente do Ipen, Wilson Calvo, a reunião de integração foi uma oportunidade para ambas as partes envolvidas. "Apresentamos possibilidades de pesquisas e desenvolvimento e aplicações práticas utilizando a tecnologia nuclear a qual estão à disposição da sociedade, na intenção de formar políticas públicas na região. Esse contato foi gratificante e agora vai se desdobrar com visitas técnicas em várias dessas instituições, para que possamos ofertar à região tecnologias disponíveis com o conhecimento que existe hoje no Ipen, através de seus pesquisadores”, conta.
A diretora do Ipen, Isolda Costa fala da satisfação em compartilhar o trabalho do Ipen. "É muito importante esse compartilhamento de ideias e principalmente em poder mostrar o que estamos fazendo, dando a possibilidade da integração entre setor privado e público em uma região que mostra grande eficiência em seu trabalho. Temos certeza que novas parcerias irão surgir deste encontro.”
Além da apresentação do Ipen, o presidente do Codet, Mário Lopes Neto, expôs alguns dados da cidade de Toledo, que segundo informações atualizadas do IBGE, possui mais de 156 mil habitantes, sendo reconhecida oficialmente como a Capital Paranaense do Agronegócio, líder na geração de empregos per capita no Paraná em 2022, melhor cidade de porte médio do Brasil em indicadores econômicos, terceira melhor cidade do Brasil em mercado de trabalho, terceira maior cidade do oeste paranaense, quinta melhor cidade de porte médio do Brasil na categoria geral, décima melhor cidade de porte médio do Brasil em padrão de vida, entre outras informações.
O momento também serviu para apresentar a entidade ao grupo. Ao todo, a ACIT possui 4.365 empresas associadas, totalizando mais de 50% da força produtiva de Toledo. Para a presidente da ACIT, Anaide Holzbach, a visita demonstra a importância da entidade em fazer a ponte entre pesquisadores e desenvolvedores das empresas locais. "Com o apoio do Codet, mais uma vez demos foco a relevância de se trabalhar em conjunto em prol do desenvolvimento local e região, com foco na tecnologia de diversos segmentos.”
Segundo Tiago Rockembach, que é membro do Codet e viabilizou a visita do Ipen na ACIT através do Nexo Espaço de Negócios e Coworking, apoiar o desenvolvimento cientifico é fundamental para o crescimento dos negócios locais. "Preencher essa lacuna foi o objetivo da vinda do Ipen, ou seja, canalizar suas aplicações para a prática que o empresário tem na ponta da linha. Essa parceria tem tudo para dar certo e os próximos passos devem trazer soluções ao município e ao desenvolvimento regional.”
A iniciativa Iguassu Valley, que é um movimento que reúne instituições de apoio, grandes empresas, startups, instituições de ensino e pesquisa e que atua para fomentar o ecossistema de inovação do Oeste do Paraná também foi apresentada pelo representante do Sebrae PR, Alan Debus.
Além da integração durante reunião extraordinária do Codet, membros do Ipen retornaram à ACIT no período da noite no espaço InovAcit para um novo encontro de aproximação com membros da diretoria executiva da entidade, conselheiros do Codet, empresários, industriais, representantes de universidades, de instituições públicas e privadas, pesquisadores, entre outros.