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Falta de chuva faz floresta realimentar efeito estufa - Folha de S. Paulo

Pesquisa inédita analisa emissões de gases em toda a bacia amazônica

Fonte: Folha de S. Paulo

Estudo destacado na capa da revista 'Nature' usou dados colhidos em quatro pontos da Amazônia brasileira

MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO

Se a floresta amazônica fosse uma pessoa, seria um fenômeno: quando bebe, seu hálito melhora; quando se abstém, ele piora.

E o mau hálito da Amazônia, com seus 6,8 milhões de km², pode empestear o ar do planeta inteiro, agravando o efeito estufa.

Num ano normal, com muita chuva, a floresta quase não emite gases do efeito estufa, como o CO2 (dióxido de carbono, que na verdade não tem cheiro). Num ano seco, lança na atmosfera tanto CO2 quanto o Brasil inteiro.

A revelação está num estudo pioneiro sobre o bafo da floresta, o primeiro a medir sua composição na escala de toda a bacia amazônica.

A pesquisa --que tem entre os autores principais uma química brasileira, Luciana Vanni Gatti - está na capa do periódico "Nature" de hoje.

Gatti organizou 160 voos, em 2010 e 2011, em quatro áreas da floresta. Eles serviram para coletar amostras de ar em altitudes de 300 m a 4.400 m acima do nível do mar.

Em 2010, um ano com chuvas muito abaixo da média, os dados indicam que a Amazônia emitiu 480 milhões de toneladas de carbono na atmosfera. Em 2011, que teve chuvas acima da média, a emissão foi quase neutra, com 60 milhões de toneladas.

"Demos muita sorte de pegar dois extremos logo no começo do projeto", diz Gatti.

PULMÃO VERDE, UM MITO

A pergunta estampada na capa da revista --"sumidouro ou fonte?"-- trata do grande mistério da Amazônia: se a maior floresta tropical do mundo mais retira do que lança carbono na atmosfera.

Estima-se que a Amazônia guarde 120 bilhões de toneladas de biomassa acima do solo. Ou seja, sem contar raízes e o que mais houver de matéria orgânica abaixo dele.

É um bocado de carbono estocado. Ao fazer fotossíntese, as árvores retiram CO2 do ar e, com isso, contribuem para contrabalançar as emissões produzidas pela humanidade, com a queima de combustíveis fósseis. Com a respiração da floresta, de noite, mas em especial com o desmatamento e as queimadas, o sinal se inverte.

Daí se originou o mito da Amazônia como "pulmão verde" do mundo. Na realidade, a questão não é se a mata produz oxigênio, como entendeu mal um repórter da agência UPI ao entrevistar o cientista alemão Harald Sioli, em 1971, mas, sim, que ela vai agravar o efeito estufa, se destruída.

O estudo de Gatti não oferece resposta conclusiva sobre o balanço de carbono, pois, com a grande variação do comportamento da floresta, dois anos de medições são insuficientes para indicar uma tendência. Mas surgiram pistas importantes.

Primeiro, a pesquisa deixa claro que é possível medir concentrações de gases do efeito estufa nos quatro quadrantes da floresta e extrapolar os resultados para todo o bioma. Até agora, as medidas tomadas em uma dúzia de torres de pesquisa espalhadas pela Amazônia não haviam permitido traçar essa radiografia, porque captam só os fenômenos num raio de poucos quilômetros.

A outra pista, bem menos animadora, está no estresse da floresta causado pelas secas, que devem tornar-se mais frequentes com o aquecimento global.

"Se essas tendências continuarem, a região pode se tornar uma fonte líquida de carbono para a atmosfera, movendo carbono estocado em ecossistemas na forma de gases do efeito estufa, acelerando assim o aquecimento global", alerta John Miller, da Universidade do Colorado (EUA), coautor do artigo.

Uso da terra no país está mais eficiente, porém excludente

GIULIANA MIRANDA
DE SÃO PAULO

Um dos mais abrangentes estudos já feitos sobre o uso da terra no Brasil indicou uma separação, sobretudo na Amazônia, entre a alta do desmatamento e o crescimento da produção agropecuária.

"Analisamos as duas últimas décadas. Em 1995, a expansão na agricultura coincidiu com uma alta significativa no desmatamento. Em 2004 e 2005, com o pico da pecuária bovina, ocorreu a mesma coisa. A partir daí, no entanto, observamos que tem havido uma separação maior entre esses eventos", diz David Lapola, professor da Unesp em Rio Claro e autor principal do estudo.

Embora essa mudança já seja bastante positiva, a relação dos produtores com o meio ambiente ainda está longe de ser a ideal, aponta o estudo, que analisou mais de uma centena de trabalhos e foi capa da revista "Nature Climate Change".

"Não foi só boa vontade do setor produtivo. Houve uma intensificação da fiscalização, que foi acompanhada de outras ações na Amazônia", explica Lapola.

Nos outros biomas, que não recebem a mesma atenção dispensada à fiscalização da Amazônia, o próprio setor produtivo foi, em boa medida, responsável pela mudança. "Mercados do exterior, especialmente a Europa, também estão mais exigentes quanto à origem do produto", afirma o cientista.

Mais produtiva, a agropecuária no Brasil também está cada vez mais excludente.

Questão antiga no país, a concentração de terras para a monocultura de exportação está cada vez mais intensa, empurrando mais e mais pessoas para áreas urbanas já saturadas, intensificando problemas sociais.

As grandes propriedades, com mais de mil hectares, são apenas 1% das fazendas brasileiras, mas representam cerca de 50% das terras agrícolas do país.

Além de apontar problemas, o trabalho sugere soluções, como a intensificação das práticas de manejo, a criação de políticas públicas e também o pagamento por serviços florestais.

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