Menu Principal
Portal do Governo Brasileiro
Logotipo do IPEN - Retornar à página principal

Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares

Ciência e Tecnologia a serviço da vida

 
Portal > Institucional > Notícias > Ipen na Mídia

O presidente Lula deve investir no ciclo do combustível, recomenda a física paulista que comanda o projeto Jovem Cientista

Fonte: Blog Tania Malheiros

A física paulista Cibele Bugno Zamboni é um raro exemplo feminino que, na infância, teve o estímulo dos avós para chegar onde desejava, desde que foi atraída pelos encantamentos do Universo. Membro de entidades nacionais e internacionais, Coordenadora do Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações (LEE) do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-SP), Cibele comanda o programa Jovem Cientista e defende a transparência das informações no setor nuclear. "Desde que iniciei na área nuclear senti a necessidade de passar esclarecimentos à sociedade. É a única situação em que a condição de gênero não pesou na minha carreira, pois sempre me perguntaram quando eu iria construir uma bomba e não se seria capaz de fazê-lo”. Quanto ao governo Lula, ela acha que deve investir no ciclo do combustível, lembrado que o principal fornecedor de urânio no mundo é o Cazaquistão. Mas bomba à parte, aqui Cibele fala sobre a falta de recursos no setor nuclear, conta sobre projetos que utilizam abelhas na saúde, entre outros. Neste mês de março, em homenagem às mulheres, Cibele lembra que, no curso preparatório para o vestibular, numa turma de 100 alunos, somente cinco eram do sexo feminino. Com um curriculum profissional extenso na área das ciências exatas, ela não parou por aí: foi aprender piano, violão, flauta, dança, pintura, desenho e muito mais. E manda um recado às mulheres: "Apesar das dificuldades que, em parte, vem do preconceito, se enxergar o potencial de seu trabalho, insista em realizá-lo”. Eis a entrevista:

Por que se interessou pela área da Física e da Tecnologia Nuclear? Teve influências? Quais? Como escolheu esta área até então com pouca participação feminina?

Diria que começou por ser muito curiosa e ter a oportunidade, na minha infância, de interagir com meus avôs: o paterno que me deu livros de ciências para ler, principalmente sobre astronomia (sempre fui encantada por entender sobre o universo) assim que fui alfabetizada; o materno, um homem que na década de 40 incentivou as filhas (o que inclui minha mãe) a terem carreira profissional. Com essa bagagem e apoio, visualizei que minha carreira profissional seria na área da Física Nuclear. Quanto a ser restrita à participação feminina nesta área, na verdade nem pensei nisso na época, mas ficou claro ao ingressar "no curso preparatório para vestibular” que seria minoria, pois na sala de aula éramos da ordem de 100 alunos, mas lembro de somente cinco alunas.

Com a sua grande experiência, acha que o setor da Física, Tecnologia Nuclear, tem ou terá mais espaço no Brasil?

Acredito que sim, pois temos potencial na formação de recursos humanos. Entretanto, falta visibilidade do setor tecnológico nuclear bem como a capacidade de absorver esses profissionais no mercado nacional. Essa falta de oportunidade leva esses cérebros a atuarem em âmbito Internacional. Com o quadro político atual, que tem demonstrado interesse na retomada do setor nuclear, abre-se um leque de oportunidades de crescimento, mas a continuidade dessas iniciativas requer, com urgência, um plano de reposição de profissionais (ampliação do mercado trabalho) para solidificar todos os benefícios que o setor nuclear pode fornecer a sociedade. 

Como vê o futuro no setor? 

Depois de um período de estagnação, projetos de relevância no setor nuclear, como o programa PROSUB, o Reator Multipropósito (RMB), Angra 3, o Projeto Nacional de Fusão Nuclear (PNFN), bem como a continuidade de formação de recursos com apoio de bolsas de pós-graduação, poderão ser dinamizados pois, neste governo temos representes que conhecem e valorizam o setor, como Ricardo Galvão na presidência do CNPq e a ministra de Ciência e Tecnologia, Luciana Santos. 

Os concursos são escassos na área. Quais seriam as alternativas para os novos físicos no Brasil? Na Engenharia Nuclear, como já publicamos, os alunos, uma vez formados, estão buscando oportunidades fora do Brasil. 

Sem a oportunidade de atuar no mercado de trabalho continuaremos a oferecer profissionais bem qualificados (que levam anos de formação e tem custo elevado) a outros países. Isso é uma contradição, pois todas as instituições do setor nuclear sofrem com falta de pessoal, devido à ausência de concursos nos últimos anos. Portanto, só com a recomposição de pessoal qualificado nas instituições de pesquisa e das empresas da área nuclear (como CNEN, INB, Eletronuclear, Amazul, dentre outras) teremos a expansão no desenvolvimento de tecnologias nucleares nacional. 

Desde 2019 o programa jovem cientista está sobre a sua coordenação. Conte um pouco sobre esta experiência, desafios, dificuldades e expectativas no novo governo.

Desde que iniciei na área nuclear senti a necessidade de passar esclarecimentos à sociedade. É a única situação em que a condição de gênero não pesou na minha carreira, pois sempre me perguntaram quando eu iria construir uma bomba e não se seria capaz de fazê-lo. A divulgação científica sempre foi estimulada no IPEN e faz parte das atividades desenvolvidas pelo Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações (LEER), que coordeno.  É uma atividade voluntária que teve início em 2005 e conta com a participação dos alunos. Considerando a visibilidade que as redes sociais proporcionam, em 2019 foi criado o projeto Jovem Cientista (JC) e hoje estamos atuando em várias redes sociais com um bom retorno do público. 

Conte um pouco sobre o projeto. 

O projeto JC foi criado com o objetivo de elaborar propostas alternativas para conhecimento e divulgação da ciência, com ênfase em desmistificar as ciências nucleares, tanto no âmbito acadêmico (com foco nos estudantes de graduação e pós-graduação) bem como para o público em geral. Dentro deste contexto, foi criado o site jovem cientista (www.jovemcientista.com.br) que auxilia na divulgação do material didático disponibilizado pelo LEER, além de ser um facilitador na comunicação com a sociedade. O conteúdo do site envolve quatro menus: REPORTAGENS onde temas diversos são apresentados em maior profundidade, além abrir espaço para  pesquisadores experientes falarem de sua carreira, desafios e perspectivas no campo de atuação; ENTREVISTAS realizadas por alunos com alunos, onde o estudante tem espaço para discutir seu trabalho; MINUTO NUCLEAR onde conceitos de física nuclear são abordados em vídeos de um minuto e CURIOSIDADES um espaço onde são apresentados temas variados, cujo objetivo é dialogar entre as várias áreas do conhecimento científico. Além do site, todo material produzido é disponibilizado em várias mídias sociais, como o canal do YouTube (Jovem Cientista), o perfil no Instagram (@jovemcientista.com.br) associado a uma página no Facebook (@jovemcientista.com.br), o perfil no TikTok (@jovemcientista.com.br) e ainda pelo LinkedIn e Twiter no perfil pessoal dos editores. 

Alguma dificuldade? 

Sim. Uma das dificuldades é conseguir que os colegas se expressem sem tanto rigor técnico-científico de modo que um público leigo consiga assimilar. Quando isso é alcançado é muito gratificante para equipe do JC, bem como para os colaboradores e convidados. Mas, a maior dificuldade, sem dúvida, é a obtenção de recursos financeiros. Hoje todos os gastos (registro e hospedagem do site) e investimentos (aquisição de programas de edição, recursos audiovisuais e cursos de comunicação) são oriundos dos participantes do LEER (meu e dos alunos) e de doações de parceiros e colaboradores que nos apoiam nessa iniciativa. Com o aceno da continuidade e retomada de projetos no setor nuclear, nossa expectativa é que possamos captar recursos e crescer, bem como atuar como agente propagador, isto é, incentivar outros grupos de pesquisas a divulgar seus projetos. 

A História mostra que o setor nuclear, no passado, era praticamente desconhecido da população. Qual a sua opinião sobre a divulgação da área nuclear junto à população? Sugestões? 

A informação é fundamental. Tanto os benefícios como os riscos precisam ser esclarecidos, como ocorre com outras áreas. A energia nuclear é estigmatizada pelo seu uso bélico, mas pouco se ensina no meio acadêmico sobre os benefícios e avanços, tanto no âmbito de segurança como de novas tecnologias que podem beneficiar diversas áreas, como saúde, meio ambiente, marinho e aeroespacial, além de disponibilizar metodologias que permitem até cuidar do patrimônio artístico e cultural. De modo geral essas atividades são desconhecidas pela sociedade. Por isso, considero que os esforços dos órgãos de fomento, como a FAPESP e o CNPq, em solicitar ao pesquisador que comunique à sociedade sua pesquisa em linguagem acessível é uma ação positiva, e deveria ser adotada por toda comunidade cientifica.  A implantação do Projeto Jovem Cientista e a criação do MINUTO NUCLEAR visam contribuir com a eliminação dessa lacuna. São ações pequenas,  mas se forem propagadas  pela comunidade científica podem reverter este estigma de danoso e prejudicial. Tem uma citação que sempre faço nos seminários que realizo de divulgação cientifica, que  expressa bem o meu objetivo no que diz respeito a área nuclear, que é a seguinte: Energia nuclear, não tenha receio, tenha conhecimento. 

Conte um pouco sobre o projeto insumos oriundos da abelha nativa. Como começou, onde, quando, idealizador ou idealizadores, é nacional? Conquistas práticas e para a ciência?

O Brasil é um dos maiores fornecedores de produtos apícolas no mundo. Dentre as abelhas sem ferrão, a espécie Scaptotrigona aff.postica, popularmente conhecida como "tubi”, oriunda do Estado do Maranhão, tem seus insumos (própolis e a pólen) utilizados localmente como antimicrobiano em infecções, na cicatrização de feridas e em ação antiviral (herpes e rubéola) bem como no âmbito nutricional. Entretanto, não existem dados da caracterização físico-química e biológica desses insumos que possibilitem comprovar essas propriedades  medicinais  e nutricionais. Para suprir essas lacunas, uma parceria entre o  LEER e o Laboratório de Radiometria Ambiental (LRA/IPEN), com o Instituto Butantan (IBu) e a Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), foi criada com o objetivo de fornecer bases substanciais e práticas desses insumos. Isso abre a possibilidade de explorar novos medicamentos, que poderão levar a geração de patentes, além de conhecimentos sobre a flora e fauna, que contribuirão para expansão da Meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão) que é a principal fonte recursos da região. O projeto teve início em 2022 e tem o apoio financeiro do IPEN. 

Conte sobre a sua participação na área de Aplicações de Radioisótopos? 

Minha atuação é na área da saúde pública voltada a proposição de metodologias alternativas de análises clínicas. Nos últimos anos o LEER (IPEN) tem se dedicado a apresentar alternativas para realização de exames bioquímicos (dosagem de íons) em fluidos corpóreos, a custo reduzido e com potencial de uso em áreas carentes que não dispõem de infraestrutura de laboratórios de análises clínicas. De acordo com o último Programa Nacional de Controle de Qualidade (ProEx/2023), 5.924 laboratórios de Análises Clínicas e 116 bancos de sangue atenderam uma demanda de 74 milhões desses exames (dosagem de Ca, Cl, Fe, K, Mg, Na, etc). Entretanto, existe carência desses recursos laboratoriais em populações locadas em regiões de difícil acesso e, normalmente, carentes. Por exemplo, o caso da região Amazônica onde o transporte ocorre em parte por barco, o que pode chegar a dias, inviabilizando sua realização. Nossa proposta teve como objetivo testar o uso de equipamento compacto e portátil, baseado na tecnologia de Fluorescência de Raios X, para execução de análises bioquímicas em micro amostras de fluidos corpóreos (gotas) depositadas em papel. Os resultados  obtidos mostraram-se promissores e atualmente a metodologia é empregada em diferentes áreas da saúde (medicina preventiva e de diagnóstico, medicina pediátrica, medicina esportiva, veterinária, genética, nutrição, dentre outras). 

Que riqueza de possibilidades. 

São várias as vantagens: procedimento não destrutivo, o que permite a repetição da análise sempre que necessário (o que não é possível pelos procedimentos convencionais), sendo de grande utilidade na medicina esportiva pois, pode auxiliar na identificação de doping; execução rápida (minutos); armazenamento da amostra sem a necessidade de refrigeração; viabilidade de realizar várias análises simultaneamente (inviável pelos procedimentos convencionais), bem como a possibilidade de seu emprego em análise de vários fluidos corpóreos (sangue, soro, plasma, urina, saliva). No caso de uso de sangue outras simplificações podem ser agregadas:  uso de uma gota de sangue o que dispensa a necessidade de separação soro - sangue (procedimento convencional utiliza soro) e simplifica o trabalho do técnico na coleta e preparo da amostra; coleta de sangue por punção digital que pode ser realizada fora das instalações laboratoriais (procedimento análogo aos testes glicêmicos); diminuição do rejeito hospitalar e redução de custos pois, elimina uso de vidraria, tubos de coleta e seringas, o que também minimiza os interferentes, pré-analíticos (transporte, centrifugação, armazenamento),  além da possibilidade de realizar essas análises em localidades desprovidas de energia elétrica, pois este equipamento pode operar com baterias. 

Tema amplo e com muitas alternativas. 

Esta alternativa, por exemplo, pode ser útil também quando a disponibilidade do material é escassa, caso da clínica pediátrica de recém-nascido (neonatos) e pré-maturos, no qual a coleta de uma gota de sangue, como realizada pelo teste do pézinho, é suficiente para a realização desses exames clínicos. Para dar ideia da dimensão deste problema, um bebê prematuro (~1 kg) tem da ordem de 200 ml de sangue circulando no corpo e, dependendo da disfunção ou tratamento o recém-nascido pode necessitar de duas a três coletas de sangue por dia. Consequentemente, a coleta de sangue para exames laboratoriais e funcionais constituem a principal causa de transfusão de sangue na clínica pediátrica. 

Outros destaques? 

Outro aspecto inovador a destacar está relacionado ao uso desta alternativa em Laboratórios de Pesquisa que necessitam de testes in vivo, em modelo animal de pequeno porte como, por exemplo, camundongos e roedores (o que requer o seu sacrifício no caso do emprego de métodos convencionais, pois utilizam soro) para investigações relacionadas à formulação de novos medicamentos, vacinas e demais insumos médicos correlatos. 

Bom que seja divulgado. 

Sim. No âmbito de ação social, a consolidação da técnica proposta para realização desses exames clínicos gera melhorias na condição de saúde para vários grupos populacionais, que se encontram em condições de vulnerabilidade como: populações ribeirinhas e de localidades desprovidas de atendimento básico a saúde. Além disso, no âmbito econômico, essa alternativa pode ser explorada por instituições governamentais de saúde (p. ex. SUS no Brasil), em Institutos de Pesquisa e por laboratórios privados de análises clínicas. Considerando-se ainda o custo-benefício, como elemento de viabilidade do método, as simplificações propostas (redução de material laboratorial e de rejeito hospitalar além da eliminação de refrigeração) são de grande relevância pois, tem-se redução de custo de no mínimo 70%. 

E na área da Investigação do Patrimônio Artístico e Cultural? O que é e como funciona? 

Essa é uma atividade mais recente no LEER. Desde que passei a trabalhar com a técnica fluorescência de raios X, as possibilidades de aplicações se ampliaram, e uma das áreas que pode ser investigada diz respeito ao Patrimônio Artístico e Cultural (tais como pintura, escultura, acervos fotográficos, desenhos, gravuras, mapas, artesanato e objetos de uso tradicional). Essa atividade envolve a parceria com outros grupos do IPEN. Hoje atuamos em investigações que envolvem peritagem, caraterização de materiais artísticos (como pigmentos, tintas, vernizes, ceras, giz, carvão)  e datação de obras de artes fazendo uso de raios X e nêutrons, que são análises complementares. Temos como parceiros o Museu da Polícia Militar de São Paulo e a Pinacoteca de São Paulo, além de uma procura crescente de colecionadores particulares. 

Como participa do programa ARCAL, da AIEA? O que é? Objetivos? Perspectivas? 

Eu diria que minha participação no ARCAL (Acuerdo Regional de Cooperación para la Promoción de la Ciencia y la Tecnología Nucleares en América Latina) é minha contribuição científica para área de meio-ambiente. Fui convidada a participar do projeto RLA7025, Applying nuclear and stable isotope technique to increase the resilience of the Brazilian coast ecosystems to oil spill and plastic debris, coordenado pelo Prof. Roberto Meigikos dos Anjos (UFF), que tem por objetivo monitorar a distribuição e abundância de microplásticos em sistema marinho, utilizando técnicas nucleares e isotópicas, e avaliar a extensão que esses detritos plásticos podem ser transferidos em um ecossistema costal. Envolve 15 países da América Latina e Caribe e tem o apoio da AIEA. No Brasil participam a Universidade Federal Fluminense (UFF), o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN/CNEN-SP) e o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM). O objetivo final é gerar conhecimento científico de processos e mecanismos que possibilitem dimensionar os efeitos interferentes/poluentes no ambiente marinho,  bem como avaliar o impacto desses detritos plásticos em organismos marinhos de diversos níveis tróficos dentro da cadeia alimentar,  auxiliando a promoção de programas de conservação no litoral do Rio de Janeiro e Niterói. Nossa perspectiva é que esses programas de conservação sejam aplicados e, se necessário, implementados em outras regiões. 

De que forma a área nuclear pode contribuir com a preservação do meio ambiente no Brasil? Como analisa o futuro na energia nuclear? 

O projeto que acabei de citar, a investigação de microplásticos no ambiente marinho, é um exemplo. Da mesma forma, outros setores como o agro pode ser beneficiado, no estudo da absorção de nutrientes pelas plantas, o que leva a melhorias no âmbito de produtividade, por exemplo em canaviais e cafezais,  bem como na eliminação de pragas com o uso da técnica do inseto estéril, o que diminui o uso de agroquímicos. Outro exemplo direcionado a meio-ambiente é a avaliação de recursos hídricos utilizando radioisótopos para mapear os cursos de água. Na área da saúde a irradiação de alimentos, que já tem mais de 100 anos de uso no mundo, leva a redução do uso de produtos químicos e ao aumento da vida de prateleira de vários alimentos. 

Sugestões para o Governo Lula? 

De imediato, investir nas atividades do ciclo do combustível para a produção e comercialização de elementos combustíveis nucleares, pois o principal fornecedor de urânio no mundo é o Cazaquistão, que está fortemente prejudicado pelo atual quadro político entre a Rússia e Ucrânia. Cabe ressaltar que o Brasil possui reservas de urânio, domina a tecnologia do ciclo do combustível, ou seja, é o momento certo de pôr em prática e atender a demanda mundial. Além disso, é necessário criar condições de alavancar o progresso no âmbito nuclear, o que  enfatiza a necessidade da recomposição de pessoal qualificado. Vale lembrar que o PROSUB, Angra 3 e o RMB foram iniciados em 2008 pelo Governo Lula.

Conte um pouco a sua história.

Natural de São Paulo e filha de pais que não são da área de ciência, mas que sempre incentivaram os estudos. Meu pai foi da área de engenharia além de se dedicar a artes (pintura e escultura) e minha mãe da área de administração e pianista. Portanto cresci em ambiente que valoriza a Educação e a Cultura, e acredito que isso me direcionou à atividade de aprender e repassar conhecimento. Inicialmente minha vontade era de atuar na área de Astrofísica, por isso, no final do ensino médio fui montar um telescópio em curso que era disponibilizado no planetário de São Paulo. Mas, durante a graduação em Física, ficou explícito ser uma atividade teórica, o que me direcionou para Física Nuclear já prevendo atuar na área experimental. Concluí minha graduação em Física pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, o mestrado em Estrutura Nuclear e o doutorado em Tecnologia Nuclear pela Universidade de São Paulo. 

E hoje? 

Atualmente coordeno o Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações no IPEN e sempre realizei atividades paralelas para complementar minha formação e me familiarizar com temas que passo a investigar. Foram vários cursos em Análises Clínicas, Genética, Matemática, Veterinária, Meliponicultora, Apicultura e mais recentemente Cinema e Audiovisual para aprimorar os documentários elaborados para projeto Jovem Cientista. E como lazer fui aprender piano, violão, flauta, dança, pintura, desenho e muito mais. 

Desafios? 

Fazem parte do meu cotidiano, em parte pelo preconceito e, em parte por querer inovar. O novo é o que motiva a continuar na pesquisa. Quanto às atividades futuras, avalio que o IPEN tem potencial para ampliar sua atuação na área da investigação do Patrimônio Artístico e Cultural. Embora a utilização de raios X seja usual, o uso de nêutrons não, pois é restrita aos países que possuem reatores. Os trabalhos que já realizamos com nêutrons mostraram o potencial desta atividade e o interesse da sociedade, principalmente de colecionadores e ateliês, em ter acesso a essas tecnologias que cuidam e auxiliam a preservação do Patrimônio Artístico e Cultura. 

Mensagem para as mulheres? 

De mulher para mulher, a minha mensagem é que apesar das dificuldades, que em parte vem do preconceito, se enxergar o potencial de seu trabalho, insista em realizá-lo. Venha conhecer o LEER e apresentar seu projeto. Estou sempre disposta a aprender e atuar com novidades e, se eu não puder colaborar, acredito que um dos muitos colaboradores que tive a oportunidade de interagir, poderá cooperar com sua pesquisa. Me considero ativa e dedicada e me sinto motivada profissionalmente apesar das dificuldades no âmbito financeiro, que muitas vezes atrasam as pesquisas. Hoje coordeno sete projetos, oriento onze alunos e colaboro em três projetos de âmbito internacional. Nesses anos de atuação foram várias oportunidades para colaborar com Instituições Nacionais e Internacionais, que me proporcionaram ter dezenas de colaboradores que me ensinaram muito e, além disso, tenho orgulho dos alunos que formei e que hoje atuam em intuições renomadas de âmbito nacional e internacional. 

Em relação ao ocorrido na Usina nuclear de Angra (vazamento de água radioativa em setembro de 2022), como avalia? 

Só tenho conhecimento do que foi publicado na mídia. Não tenho mais informações a respeito para poder embasar algum juízo. Como mencionei anteriormente, considero a transparência fundamental de forma a proporcionar os esclarecimentos necessários sem excessos ou omissões, de ambos os lados.

PERFIL 

Cibele Bugno Zamboni - Graduada em Física pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com mestrado em Estrutura Nuclear e doutorado em Tecnologia Nuclear, ambos pela Universidade de São Paulo. É professora do Programa de Tecnologia Nuclear IPEN/CNEN-SP, orientadora da pós-graduação da Universidade de São Paulo e editora-chefe do site Jovem Cientista. Supervisora do Laboratório de Espectroscopia e Espectrometria das Radiações do Centro do Reator de Pesquisas (LEER/CERPQ) e coordena os dois projetos de âmbito institucional: Caracterização físico-química e biológica de insumos oriundos da abelha nativa Scaptotrigona aff. Postica (na área de meio ambiente, processo: 2020.06IPEN13) e Dosagem de íons em amostras de saliva utilizando técnicas analíticas nucleares de AAN e FRX: procedimentos alternativos para prática clínica (na área da saúde, processo: 2018.05IPEN03). 

Membro do programa IAEA/ARCAL (International Atomic Energy Agency/ Acuerdo Regional de Cooperación para la Promoción de la Ciencia y Tecnología Nucleares en América Latina y El Caribe), atuando nos projetos: Strengthening Regional Monitoring and Response for Sustainable Marine and Coastal Environments (RLA7022) e Applying Nuclear Techniques Including Stable Isotopes to Identify Triggers of Hamful Alga Blooms (RL7011). 

Experiência na área de Estrutura Nuclear (Supervisora do Laboratório de Estrutura Nuclear (LEN/IPEN 1989-2002) na área de Aplicações de Radioisótopos com ênfase em Física Aplicada à Área da Saúde e Meio Ambiente (Supervisora do LEER/IPEN 2003-atual) e, mais recentemente, na Investigação do Patrimônio Artístico e Cultural. 

Participação ativa na divulgação da ciência, com publicação de textos científicos para leigos. Desde 2019 coordena o projeto jovem cientista (Site jovemcientista.com.br), que disponibiliza conteúdo cientifico em várias redes sociais: Instagram (@jovemcientista.com.br), Facebook (@jovemcientista.com.br), Youtube (Canal "Jovem Cientista”), TikTok (@jovemcientista.com.br) e LinkedIn. 

Publicação de 91 trabalhos científicos em revistas indexadas, 4 livros, 10 capítulos de livros, desenvolvimento de 14 processos de inovação tecnológica e 59 orientações. Atualmente orienta 10 alunos (4 iniciações científicas, 4 mestrados, 1 doutorado, 1 pós-doc). Ganhou vários prêmios de âmbito nacional e internacional. Membro da OWSD - Organization for Women in Science for the Developing World, Membro da WiN Global - Women in Nuclear Global,  Membro da SBF - Sociedade Brasileira de Física, Professora colaboradora da Universidade de Santo Amaro - UNISA (SP), Universidade de São Paulo (IFUSP), Núcleo Estratégico de Venenos e Soros e do Laboratório de Parasitologia Instituto Butantan (IBu-SP), Instituto de Odontologia USP, Hospital Universitário (HU-USP), Universidade Federal Fluminense (UFF), Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFERP-USP), Museu da Polícia Militar do Estado de São Paulo e da Pinacoteca de São Paulo.

Eventos