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Uso de radiação gama ajuda a preservar a história de São Paulo

Um total de 1.800 caixas contendo documentos do Arquivo Geral de Processos da Prefeitura de São Paulo passam por radiação gama para desinfecção

O IPEN tem desempenhado um importante papel na preservação da memória do Estado de São Paulo. Esta semana, o Centro de Tecnologia das Radiações (CTR) recebeu do Acervo Histórico de São Paulo (AHSP) 1.800 caixas contendo documentos para serem desinfetados no Irradiador Multipropósito de Cobalto-60. Um laudo da Coordenação de Vigilância em Saúde (COVISA) concluiu que o material apresenta alta carga microbiológica, principalmente ácaros e fungos, e recomendou radiação gama antes de qualquer manipulação. São 3.900 pacotes distribuídos nessas caixas, para facilitar o processo – atualmente a câmara de irradiação de 60-Co consegue tratar aproximadamente 100 caixas de dimensões padrão por dia.

Esses documentos são parte do Arquivo Geral de Processos da Prefeitura de São Paulo e já teriam chegado contaminados à instituição, de acordo com Sílvia Helena do Carmo Gonçalves, supervisora técnica de Conservação do Acervo. Todavia, o problema só foi detectado quando funcionários mais próximos ao material relataram mal-estar. "Alertamos a direção e foi solicitado um laudo técnico à COVISA, que recomendou radiação gama para minimizar os riscos aos trabalhadores”, relatou Sílvia, que fez contato com o pesquisador Pablo Vásquez, coordenador do Irradiador e responsável pela linha de pesquisa para preservação de patrimônio cultural com radiação ionizante.

A desinfecção e a esterilização por energia ionizante são métodos simples e eficazes, e podem ser aplicadas em materiais arquivados, obras de arte, alimentos, embalagens, fármacos, cosméticos, produtos veterinários, entre outros. Os produtos são expostos à radiação ionizante por um tempo determinado até atingirem um valor adequado de dose absorvida. A radiação ionizante para este tipo de aplicações pode ser gerada por aceleradores de elétrons ou por fontes de cobalto-60. Mas a radiação gama proveniente do 60-Co tem se mostrado mais apropriada para materiais sensíveis, como caso dos documentos do AHSP, sem provocar efeitos secundários nem de longo prazo.

Pablo explica que a escolha do processo, bem como a dose de radiação, depende do produto a ser tratado e do problema encontrado. "Especificamente para o material recebido da AHSP, serão necessárias doses de radiação entre 6 e 8 kGy (quilograys). Em pouco mais de três meses, todo o material estará seguro para o manuseio e para posteriores processos de limpeza”, garante o pesquisador.

Como funciona

O processamento por radiação ionizante é efetivo para o tratamento de todos os tipos de micro e macro-organismos (bactérias, fungos, insetos), em todos os estágios de vida. No caso de erradicação de insetos, as doses aplicadas variam entre 0,5 e 1 kGy para materiais de base celulósica (papel) e entre 2 e 3 kGy para produtos de madeira. Para desinfetar papel e produtos similares (eliminar fungos), são utilizadas doses entre 6 e 10 kGy. "Esta diferenciação existe porque alguns seres vivos são mais sensíveis à radiação do que outros”, explica Pablo.

Para efeitos de esterilização, as doses são definidas baseadas na informação da carga microbiana inicial do produto (bioburden), ou seja, sua contaminação inicial, e no objetivo final do processamento em termos de redução da carga microbiana ou nível de garantia de esterilidade (SAL). Alguns aspetos técnicos da esterilização por radiação de matérias médico-descartáveis encontrem-se na norma ISO 11137.

"Mas é importante lembrar que a irradiação de artefatos de patrimônio cultural não se encaixa totalmente dentro das normas de esterilização com radiação, pois não é a finalidade do processamento”, acrescenta o pesquisador. Segundo ele, muitos materiais sintéticos utilizados nos processos de restauração e em obras de arte moderna, sobre os quais não se tem referências ou estudos preliminares, ainda estão sendo pesquisados principalmente para definir limites aceitáveis para a aplicação deste processo.

"A aplicação da radiação ionizante provoca diretamente a quebra da cadeia de uma biomolécula importante dos micro-organismos como a do DNA, dos aminoácidos, das proteínas, etc. e indiretamente age nas moléculas de água dando origem a espécies químicas difusíveis e reativas – radicais livres, que podem atingir as moléculas biologicamente importantes e, desse modo, danificá-las. Como resultado os micro-organismos são eliminados ou tornam-se incapazes de se reproduzirem. O processo de irradiação não coloca em risco as pessoas que manipulam os materiais irradiados”, salienta Pablo.

Significa dizer que se trata de um processo seguro, que não deixa qualquer resíduo radioativo e os documentos nem precisam ficar em quarentena, podendo ser utilizados imediatamente após a irradiação. Outra vantagem é que o material é tratado dentro das embalagens de armazenamento ou de transporte, o que evita o contato dos operadores com a contaminação, além de permitir a operação otimizada da câmara de irradiação e diminuir os riscos de manipulação de objetos delicados. As 1.800 caixas do AHSP, por exemplo, têm 55cm de altura, 40cm de largura e 43cm de profundidade.

Palestra na ECA

Em razão desse serviço que o IPEN vem prestando – gratuitamente – a instituições públicas, Pablo tem sido convidado para proferir palestras no País e também em eventos internacionais. Na quarta-feira, 1, o pesquisador participou do II Simpósio Preservação e Conservação de Acervo, onde apresentou, no âmbito do 2º Congresso Internacional em Tecnologia e Organização da Informação – TOI, promovido pela Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP).

Na ocasião, aproveitou para divulgar o trabalho do CTR/IPEN disseminando as tecnologias de radiação para a descontaminação e preservação de bens culturais. O evento aconteceu no Auditório Safra da Biblioteca da FEA/USP. Em 2015, Pablo participou como palestrantes em eventos no México e na Romênia.

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Ana Paula Freire 

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