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Cármen Lúcia: “O direito à saúde não é um gasto. É um investimento”


A presidente do STF quer facilitar o acesso dos juízes à informação técnica sobre saúde. Será o fim das decisões em total dissonância com as evidências científicas?

 

CRISTIANE SEGATTO

07/11/2016 - 19h09 - Atualizado 08/11/2016 20h01

Fonte:http://epoca.globo.com/saude/cristiane-segatto/noticia/2016/11/carmen-lucia-o-direito-saude-nao-e-um-gasto-e-um-investimento.html

"O direito à saúde tem custo. Mas isso não é um gasto, é um investimento”, disse hoje, segunda-feira (7) a ministraCármen Lúcia, presidente doSupremo Tribunal Federale doConselho Nacional de Justiça(CNJ). Ela está empenhada em facilitar o acesso dos juízes à informação confiável sobre medicamentos, dispositivos médicos e técnicas cirúrgicas.

Cármen Lúcia e o ministro da saúde,Ricardo Barros,estiveram hoje noHospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para iniciar uma parceria entre o CNJ, o governo federal e a instituição. O objetivo é criar umaplataforma on-line com pareceres técnicos sobre os produtos de saúde. De qualquer lugar do país, os magistrados poderão consultá-la antes de tomar decisões.

É um passo importante. Essa base de dados pode ajudar a reduzir o número de decisões judiciais em total dissonância com asevidências científicasda medicina. Todos perdem quando isso acontece.

1) O paciente deixa de receber a opção terapêutica mais adequada a seu caso.

2) O Estado é obrigado a comprar um medicamento mais caro e nem sempre mais eficaz pelo preço que o fabricante quiser vender.

3) A coletividade é prejudicada quando o gestor público é obrigado a destinar grande parte do orçamento ao cumprimento das demandas judiciais.

Só quem ganha quando uma decisão judicial não encontra amparo nas evidências científicas é a indústria farmacêutica. Para uma empresa mal-intencionada, é mais fácil estimular as ações judiciais (financiando associações, oferecendo advogados aos pacientes e assediando médicos) do que convencer as autoridades regulatórias e os gestores públicos da superioridade de seu produto – tanto em termos de eficácia quanto de custo.

Um exemplo recente é o caso dosfalsos doentes de R$ 9,5 milhões, contado por ÉPOCA em junho. Trata-se deuma das maiores fraudesjá descobertas no Brasil envolvendoações judiciais para fornecimento de remédios de alto custo. Ao confiar nos laudos assinados pelos médicos dos pacientes, os juízes concederam o medicamento lomitapida (aprovado nos Estados Unidos apenas para uso nos raros casos de uma doença genética que provoca colesterol altíssimo) a pessoas que, segundo investigações posteriores, nem sequer tinham a doença.

Cada comprimido da droga fabricada pela empresa americanaAegerion Pharmaceuticalscusta cerca de US$ 1.000 por dia. Essa história provocou um prejuízo de R$ 9,5 milhões à Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo. Poderia ter consumido R$ 40 milhões se as autoridades não tivessem percebido o esquema a tempo de interrompê-lo.

Para algumas empresas, ajudicialização da saúdese tornou um atalho esperto. Por outro lado, ela representa um instrumento legítimo quando o Estado deixa de cumprir aquilo que, inegavelmente, é sua obrigação. Sem o direito assegurado de procurar a Justiça, muitos doentes teriam a vida abreviada por pura omissão dos gestores públicos.

O ponto crucial desse debate é determinar o que o Estado ou os planos de saúde devem ser obrigados a fornecer aos cidadãos. Se não há orçamento no mundo capaz de bancar todas as inovações criadas pela indústria farmacêutica, as evidências científicas devem ser o início de qualquer conversa.

"É fundamental ter a certeza de que, para aquele pleito, existe evidência científica de que a droga é indicada para o paciente”, diz o bioquímico Luiz Fernando Lima Reis, diretor de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio-Libanês. "E, obviamente, essa indicação levou em conta eficiência, eficácia e segurança.”

Em vários estados, os Tribunais de Justiça contam comNúcleos de Apoio Técnico (NAT-Jus),capazes de avaliar a adequação dos produtos demandados pelos cidadãos. Os juízes não são obrigados a consultá-los, mas os pareceres técnicos contribuem para o embasamento das decisões. Eles evitam, por exemplo, que os juízes sejam ludibriados por laudos médicos de origem duvidosa.

Representantes de vários desses núcleos participam do treinamento no Hospital Sírio-Libanês. O objetivo é criar uma forma de padronização do conteúdo dos pareceres. Essa estrutura comum facilitará as pesquisas dentro da base de dados criada pelo CNJ. Com o tempo, os juízes poderão recuperar, facilmente, os pareceres que sustentaram decisões anteriores. Aos poucos, será possível criar jurisprudência em determinado assunto.

Os NAT vão usar as ferramentas de busca daBiblioteca Cochrane, considerada a base de dados mais completa para a busca de evidências científicas. O hospital não fará pareceres técnicos. O papel da instituição será apoiar o CNJ e as estruturas já existentes para aumentar a eficiência e a rapidez das buscas.

"O Sírio-Libanês não pretende promover uma redução nem um aumento das liminares positivas”, diz Reis. "Queremos fortalecer a evidência científica para ajudar os juízes no processo de decisão.”

Quando a ferramenta do CNJ estiver funcionando como prevista, dificilmente um juiz poderá alegar desconhecimento técnico ao ser questionado sobre suas decisões no campo da saúde.


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